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A estratégia de Trump: como presidente dos EUA aplica tática da 'oferta extrema' nas tarifas

Recentes mudanças nas tarifas de Trump seguem sua filosofia de negociações agressivas, com raízes em 'A Arte da Negociação' de 1987

Trump: em 1987, presidente já dava indícios de seus métodos de negociação  (Joe McNally / Colaborador/Getty Images)

Trump: em 1987, presidente já dava indícios de seus métodos de negociação  (Joe McNally / Colaborador/Getty Images)

Publicado em 6 de agosto de 2025 às 01h01.

Última atualização em 6 de agosto de 2025 às 07h44.

"A estratégia é simples: force no começo, estruture o acordo e só altere se necessário": é assim que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, definia a arte de negociação em 1987 cerca de 30 anos antes de entrar para a política e quase 40 antes do "tarifaço", que entra em vigor nesta quarta-feira, 6.

As decisões de Trump em relação às tarifas, incluindo as de 50% sobre o Brasil, seguem um padrão familiar de mudanças inesperadas nas condições acordadas — técnica de negociação explicitada em A Arte da Negociação, livro publicado em 1987, no qual Trump descreve como adota uma postura agressiva, começando com exigências extremas e, em seguida, ajusta suas demandas de forma estratégica para alcançar resultados favoráveis.

Um exemplo clássico da estratégia, apontado no livro, aconteceu quando ele comprou um Boeing 727. A aeronave tinha um custo de cerca de US$ 30 milhões, mas o empresário, percebendo a pressão dos donos em vender, fez uma oferta inicial de apenas US$ 5 milhões. Após negociar, ele fechou a aeronave por US$ 8 milhões, valor quase 74% mais barato do que o inicial.

A flexibilidade nas negociações

Trump não se limita a fazer ofertas baixas e depois aumentar. Ele também utiliza técnicas de pressão psicológica ao longo do processo de negociação, criada para fazer com que seus oponentes sintam a necessidade de reagir.

Ao estabelecer uma posição agressiva e radical desde o início, ele transforma a negociação em um jogo de desafios, onde os outros são obrigados a se ajustar, não apenas à proposta inicial, mas ao clima de pressão que ele cria. A tática é descrita com detalhes em seu livro. E, para Trump, a chave para qualquer boa negociação é colocar o adversário na defensiva. "Você tem que fazer o outro lado se preocupar com o que você está fazendo, para que, no momento certo, eles aceitem a oferta que você fez", afirmou.

Quando Trump anunciou tarifas sobre a China, por exemplo, o objetivo não era apenas impor um novo custo, mas também criar uma reação nas partes envolvidas, forçando governos e empresas a reavaliar suas posições. O impacto imediato foi o aumento da incerteza econômica, o que pressionou outros países a considerar alternativas ou concessões mais rápidas.

A movimentação inicial com uma postura extrema, no entanto, não significa que Trump não está disposto a mudá-la. Pelo contrário: o presidente ajusta sua abordagem de acordo com os desenvolvimentos do mercado e as reações que recebe, como foi o caso quando, após a pressão da China e dos aliados, ele moderou ou recalibrou suas tarifas, visando evitar danos maiores à economia global.

Esse comportamento de iniciar com uma posição radical e, depois, ajustar conforme necessário cria um ciclo de incerteza e volatilidade. Os mercados financeiros, acostumados com essa dinâmica, nunca sabem se uma tarifa alta será seguida de uma modificação ou se a estratégia de Trump irá continuar na forma de um aumento adicional.

Esse processo de ameaças seguidas de concessões é uma estratégia que Trump utiliza para manter controle sobre o ritmo das negociações. Ele não precisa necessariamente cumprir as ameaças iniciais; o simples fato de fazer essas exigências extremas gera o efeito desejado: os outros lados começam a negociar de acordo com suas condições.

Quando ele eventualmente faz um ajuste ou "recuo", o resultado é apresentado como se fosse uma vitória de negociação, em que a outra parte "cedeu" à sua pressão. Isso, segundo Trump, fortalece sua posição e reforça sua autoridade nas negociações subsequentes, permitindo-lhe manter a narrativa de que ele é sempre o vencedor, seja no mundo dos negócios ou nas relações comerciais internacionais.

“Eu apenas continuo pressionando e pressionando até conseguir o que estou buscando", escreveu o presidente americano em seu livro.

Estratégia de soma zero

No cerne da filosofia de Trump está a negociação como um jogo de soma zero, onde o sucesso de uma parte vem diretamente à custa da outra, segundo seu livro.

Para Trump, é necessário adotar uma postura de domínio total, onde as suas condições iniciais representam uma vitória para ele, e qualquer concessão feita ao longo da negociação é vista como uma vitória para a outra parte. Essa abordagem de pressão constante e de ajustes de condições tem sido central tanto no mundo dos negócios quanto nas suas estratégias comerciais internacionais.

Trump acredita que o processo de negociar é uma competição constante. No contexto das tarifas, isso pode significar que ele começa com propostas altas, força os outros países a reagirem, e então apresenta qualquer modificação como um ajuste favorável à sua posição, criando uma percepção de que ele cedeu algo, quando, na realidade, ele mantém o controle sobre a situação.

A arte de negociar, segundo Trump

Em A Arte da Negociação, Trump define como aborda as negociações em alguns tópicos:

  1. Pense Grande: Trump enfatiza que é fundamental não se limitar a metas pequenas. Ao visar grandes objetivos, para ele, "é possível alcançar resultados muito mais significativos do que se tivesse se contentado com algo mais modesto".

  2. Proteja os riscos e o resto se resolve: uma das lições centrais de Trump é sempre estar preparado para o pior cenário. Se você puder lidar com os riscos negativos, segundo o presidente americano, o sucesso será mais fácil de alcançar.

  3. Maximize suas opções: manter várias opções abertas é essencial, já que muitas negociações falham. Trump acredita que nunca se deve ficar atado a uma única proposta ou acordo.

  4. Conheça seu mercado: Trump recomenda desenvolver uma intuição de mercado em vez de confiar apenas em pesquisas e dados. Ele valoriza o conhecimento direto e a experiência do campo.

  5. Use sua vantagem: aproveitar-se das vulnerabilidades e pontos fortes de seus oponentes, para ele, é crucial. Trump destaca a importância de nunca demonstrar desespero nas negociações, pois isso enfraquece sua posição.

  6. Valor da localização: embora a localização seja importante, Trump ensina que o negócio ideal pode ser mais relevante do que o local perfeito.

  7. Divulgação e publicidade: usar a mídia e a publicidade de forma estratégica pode gerar um impacto significativo em suas negociações. Trump sugere ser diferente e ousado para atrair atenção.

  8. Combata quando necessário: se você sentir que foi tratado injustamente, Trump acredita que lutar de volta é crucial para manter o respeito e garantir que suas condições sejam aceitas.

  9. Entrega de resultados: apesar de todo o marketing, Trump destaca que entregar o que foi prometido é essencial para manter sua credibilidade e sucesso a longo prazo.

  10. Contenha os custos: ele defende a ideia de gastar apenas o necessário, sempre buscando um equilíbrio entre o investimento e o retorno.

  11. Divirta-se no processo: Trump lembra que o dinheiro é apenas uma forma de medir o sucesso, mas o verdadeiro prazer vem do processo de negociação em si, de "jogar o jogo" e vencer.

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