Javier Milei, presidente da Argentina, durante evento para anunciar projeto de endurecimento de penas (Luis Robayo/AFP)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 4 de outubro de 2025 às 08h00.
As maiores preocupações dos cidadãos na América Latina são a economia e a segurança pública, mostram diversas pesquisas de opinião. O presidente Javier Milei venceu na Argentina prometendo agir nas duas frentes, mas com a economia como prioridade. Nesta semana, ele resolveu acelerar na área da segurança, para tentar sair de um de seus piores momentos em quase dois anos no cargo.
Na quinta, 2, Milei apresentou um projeto para endurecer as leis, com medidas como reduzir a maioridade penal de 16 para 13 anos, entre outras medidas. A mudança depende de aprovação no Congresso.
"A ordem é uma pré-condição para ter tolerância zero. Aqui se faz, aqui se paga", declarou Milei em um breve discurso com tom de campanha, ao lado da ministra da Segurança, Patricia Bullrich, e do ministro da Justiça, Mariano Libarona. O local do evento foi o complexo penitenciário de Ezeiza, na Grande Buenos Aires.
Segundo o projeto, o roubo passará a ser punido com um ano de prisão no mínimo, em vez de um mês, e a pena máxima aumentaria de dois para três anos, e de seis para oito anos em casos de roubo com uso de força.
O homicídio simples levaria a uma pena de 10 a 30 anos de prisão, em voz dos oito a 25 atuais. A prisão perpétua já é possível para os casos de homicídio qualificado. A pena máxima por posse de pornografia infantil com fins de distribuição aumentaria de dois para 12 anos de prisão.
O discurso linha-dura tem feito sucesso na política de outros países, especialmente El Salvador, onde o presidente Nayib Bukele criou megaprisões e endureceu as leis. Mais de 75 mil pessoas foram presas, com base em medidas emergenciais que foram sendo constantemente renovadas.
Bukele conquistou popularidade acima de 85%, segundo pesquisas locais, e conquistou um segundo mandato em 2024. Em julho, o Congresso do país mudou as regras e passou a permitir reeleição ilimitada.
No Equador, o presidente Daniel Noboa se reelegeu em abril deste ano apostando no discurso de combate duro ao crime. Ele promete construir megaprisões inspiradas nas construções de El Salvador.
Para o analista político Juan Carranza, Aurora Macro Strategies, no entanto, há diferenças importantes entre os países.
"A Argentina não é El Salvador e a questão da segurança na Argentina, neste momento, não é como em muitos países da América Latina. A agenda principal é a questão econômica", diz.
A taxa de homicídios na Argentina, por exemplo, foi de 3,8 para cada 100 mil habitantes em 2024. No Brasil, o indicador foi de 18,2.
Nas últimas semanas, a Argentina enfrentou uma forte crise cambial, que ameaçou a estabilidade do país. O dólar teve forte alta e atingiu o teto da banda de flutuação colocado pelo governo.
Houve melhora no cenário após Milei conseguir apoio público dos Estados Unidos, que prometeram liberar dólares para a Argentina, mas ainda não o fizeram, e após um corte temporário de taxas sobre o agro estimular os produtores a trazerem bilhões de dólares para o país. Apesar disso, o cenário segue complicado, também pela pressão política.
Em 26 de outubro, a Argentina terá eleições legislativas, que ameaçam trazer uma derrota para Milei. No começo de setembro, ele viu seu partido, A Liberdade Avança, perder a disputa em uma eleição local em Buenos Aires, o que foi visto como um sinal de fraqueza eleitoral. Ao mesmo tempo, seus aliados foram citados em casos de corrupção e a previsão de crescimento do PIB para este ano foi reduzida, em meio ao esfriamento da economia gerado pelo caos cambial.
O partido do governo tem hoje 36 dos 257 assentos e precisa de apoio de outros partidos para conseguir aprovar propostas. Se perder assentos, haverá ainda mais resistência de outras legendas a seguirem apoiando o governo. Neste cenário de possível derrota eleitoral, aprovar medidas como a redução da maioridade penal, que Milei já propôs antes, será algo ainda mais desafiador.