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Apesar de avanços, acordo Mercosul-UE deve demorar a entrar em vigor, diz professor

Tratado ainda precisa ser aprovado pelos países europeus, e França lidera oposição ao acordo

Europa: continente busca força própria em meio a tensões globais e avanços tecnológicos.

 (AFP/AFP)

Europa: continente busca força própria em meio a tensões globais e avanços tecnológicos. (AFP/AFP)

Publicado em 9 de setembro de 2025 às 06h01.

Após um planejamento de mais de 20 anos, o muito aguardado acordo entre a União Europeia e os países do Mercosul entra em fase de ratificação. No entanto, ainda deve levar alguns meses para que ele seja finalmente concluído e entre em vigor. Na semana passada, o acordo teve um novo avanço neste processo.

Na quarta-feira, 3, a Comissão Europeia validou o texto, o que abre espaço para que o documento seja enviado para aprovação do Conselho Europeu, que reúne os líderes dos países-membros da União Europeia.

No entanto, ainda não há data marcada para a conclusão dessa fase.

O acordo entre os dois blocos foi finalizado em dezembro de 2024, mas ainda precisa do aval dos países europeus, que agora analisarão o texto de forma individual.

É preciso de aprovação da maioria dos países do bloco para que ele possa ser assinado e entrar em vigor.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse na semana passada esperar que o acordo seja firmado até o fim do ano. Outros membros do governo brasileiro disseram nos últimos meses trabalhar com essa mesma perspectiva.

Apesar disso, o acerto ainda pode demorar para entrar em vigor, segundo especialistas.

“O acordo deve entrar em fase de tramitação no segundo semestre de 2025, ou no primeiro semestre de 2026, e sua aplicação deverá partir do segundo semestre de 2026 ou no início de 2027” disse Roberto Uebel, professor de Relações Internacionais da ESPM.

Efeitos globais

Em termos geopolíticos, o acordo criaria uma grande zona de livre comércio ocidental, contrabalanceando a ascendente influência chinesa em ambos os mercados, e, ao mesmo tempo, garantindo maior autonomia em relação às políticas tarifárias de Donald Trump.

Além do mais, o acordo viria em um momento oportuno para ambos os blocos. “É um contexto de transformação, de mudança de peças” afirma Uebel.

“Com a China, a Rússia e a Índia formando blocos, elas deixam o Brasil na margem. Além disso, ao aproveitar os minérios brasileiros, a União Europeia também reduziria sua dependência no mercado chinês”, diz o professor.

Vantagens do acordo

Visto pela maioria dos integrantes dos blocos como uma situação mutuamente beneficente, o acordo prevê para o Brasil um aumento anual de 0,5% no PIB, e afeta um total de cerca de 718 milhões de pessoas.

Para o Brasil, o acordo deve trazer não só um aumento do PIB, mas acesso a mais bens e serviços que podem ser, neste momento, difícil acesso em território nacional.

No primeiro ano após o acordo, haveria alta de cerca de 0.9% nas exportações, segundo estudo do segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O crescimento atingiria um pico de até 3.4% em 2034, e se estabilizaria em torno dos 3% ao ano em seguida.

O pacto abrange tanto a retirada de diversas restrições econômicas e adoção do livre comércio quanto a promoção de cooperação política e parcerias entre os dois blocos e seus membros.

Oposição da França

A França, como maior opositora do acordo, busca a proteção de seus produtos agrícolas, que teriam grandes dificuldades em competir com os produtos brasileiros, principalmente no setor de carnes.

O presidente francês Emmanuel Macron, enfrentando fortes pressões internas dos fazendeiros no país, planejou rever, adicionar e editar diversas cláusulas que garantam uma certa proteção ao seu mercado agrícola.

No ano passado, agricultores franceses e membros do sindicato agrícola Confédération Paysanne participaram de manifestação contra o acordo UE-Mercosul em Reims, no nordeste da França (François Nascimbeni/AFP/AFP)

Além de temer a competição do bloco sul-americano, os agricultores franceses podem vir a sofrer ainda mais como resultado das altas tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no Brasil, uma vez que o livre comércio, na visão deles, poderia resultar em bens brasileiros invadindo o mercado europeu a preços baixos.

Apoiada em seus interesses por outros grandes nomes agrícolas como Irlanda e Polônia, essa oposição traz um risco real para o veto do acordo.

Com isso, a Comissão Europeia, na quarta-feira, 3, propôs novos mecanismos que limitariam a prioridade das carnes sul-americanas nos mercados europeus, a fim de acatar os interesses da oposição para que a ratificação do acordo possa ocorrer o mais cedo possível.

Esses mecanismos visam a proteção dos mercados em caso de grande choque, e entrariam em vigor caso o volume das importações no mercado de carnes atingisse 10%, ou se os preços médios de produtos nacionais caíssem pela mesma porcentagem.

Além disso, a Comissão preparou fundos de crise de 6,3 bilhões de euros para fazendeiros europeus. O ministro do comércio francês Laurent Saint-Martin afirmou, em redes sociais, que os novos mecanismos foram “um passo na direção certa”.

Por outro lado, pressões internas na própria União Europeia a favor da ratificação continuam fortes, com países como Alemanha e Espanha, dois dos maiores apoiadores do acordo, ansiosos para expandir seus mercados automobilísticos em parceria com o mercado de produção de autopeças brasileiro.

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