De norte a sul, cidades reforçam tradições que unem gerações e transformam a lembrança dos mortos em celebração da vida. (Getty Images)
Colaboradora
Publicado em 2 de novembro de 2025 às 14h28.
Neste domingo, 2, acontece a celebração do Dia dos Mortos no México, conhecida como Día de los Muertos, e cujos preparativos começam em 31 de outubro.
O ritual tradicional da cultura mexicana é reconhecido pela UNESCO como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. Semelhante ao Dia de Finados brasileiro em significado, a principal diferença está em como a cultura mexicana enxerga a morte e celebra entes queridos.
Diversas cidades combinam tradição, turismo e inovação para celebrar a data que atrai olhares locais e internacionais.
As raízes do Dia dos Mortos remontam às civilizações mesoamericanas, especialmente aos nahuas e purépechas, que acreditavam no retorno temporário dos espíritos dos falecidos ao mundo dos vivos.
Com a colonização espanhola e o advento do cristianismo, essas práticas foram sincretizadas com o Dia de Todos os Santos e o Dia dos Fiéis Defuntos.
Hoje, os dias 1 e 2 de novembro são dedicados, respectivamente, a crianças e adultos falecidos, embora variações regionais incluam datas adicionais para animais de estimação ou vítimas de tragédias.
As ofrendas — altares domésticos ou comunitários que reúnem fotografias de falecidos, velas, água, flores de cempasúchil (tagetes alaranjados), alimentos preferidos e objetos pessoais — simbolizam a comunhão entre vivos e mortos.
Enquanto isso, durante a festa mexicana, as ruas se enchem de cores, música e rituais que misturam reverência e festividade.
Uma família indígena zapoteca posa em frente a um altar tradicional durante as celebrações do Dia dos Mortos, em San Pablo Villa de Mitla, no México (Getty Images). (Getty Images)
As principais cidades, especialmente no México, celebram o Dia dos Mortos com desfiles coloridos, altares com oferendas, visitas animadas a cemitérios com música e comida, e a criação de caveiras de açúcar e a figura da Catrina, um esqueleto de uma dama da alta sociedade, originada na obra de José Guadalupe Posada no início do século XX.
Na capital mexicana, o Dia dos Mortos assume contornos tanto religiosos quanto turísticos. No Zócalo, são montados altares monumentais, com shows, exposições e intensa mobilização cultural.
No bairro de San Andrés Mixquic, ao sul do centro, famílias passam a noite em cemitérios decorados, com ruas inteiras tomadas por procissões de velas e músicos. A cidade tem investido também em eventos de grande escala voltados ao turismo internacional — uma das faces modernas da celebração.
Pessoas fantasiadas se apresentam durante o desfile do “Dia dos Mortos” na Cidade do México, México (Getty Images). (Getty Images)
Em Oaxaca e arredores, o Dia dos Mortos se estende por vários dias com mercados tradicionais, concursos de melhor altar, desfiles de Catrinas e festividades nas cemitérios indígenas. A combinação de costumes pré-hispânicos, música regional e gastronomia native torna o evento um dos mais autênticos do México.
Na ilha de Janitzio, no lago de Pátzcuaro (Michoacán), ocorre uma das mais singulares celebrações: milhares de pessoas reúnem-se à noite no cemitério à beira-lago para celebrar o Dia dos Mortos no México, com música, cantos e canoas iluminadas, em um ritual ligado ao povo dos purépechas. A tradição atrai turistas que buscam uma experiência cultural profunda.
Em Guadalajara e em Aguascalientes, festivais culturais e artísticos dedicados à Catrina (ícone esquelético da morte homenageado por José Guadalupe Posada) ocorrem no entorno da data. Em Aguascalientes, por exemplo, o Festival de Calaveras reúne arte, dança e gastronomia na primeira semana de novembro.
A flor de cempasúchil ganha destaque nas ruas e altares no Dia dos Mortos: acredita-se que o aroma e a cor viva ajudam a guiar os espíritos ao seu antigo lar.
O pão do morto (pan de muerto), macio e decorado com “ossos” de massa, é consumido e também oferecido como parte das ofrendas. Outro símbolo forte são as caveiras de açúcar (calaveras de alfeñique), com nomes e cores vivas, que decoram altares ou são dadas como presentes. Papel picado em bandeiras, tapetes de areia, máscaras e figurinos de esqueletos popularizam-se como manifestações visuais da festa.
A gastronomia regional também marca presença no Dia dos Mortos. Em Oaxaca, por exemplo, pratos com molho escuro (mole negro) e bolinho de massa de milho (tamales) decoram as feiras que antecedem a celebração. No Yucatán, a abóbora em calda (calabaza en tacha) acompanha a festa.
O Dia dos Mortos tornou-se também um motor de turismo. Cidades como a Cidade do México, Oaxaca e Janitzio ampliaram sua infraestrutura para receber estrangeiros que desejam vivenciar a celebração. Em municípios mais tradicionais, milhares se deslocam para participar das ruas decoradas e das procissões.
Ao mesmo tempo, articulações internacionais destacam que embora o ritual seja cada vez mais reconhecido globalmente, ele enfrenta o desafio de manter autenticidade diante da comercialização e da influência do Halloween.
A razão pela qual o Dia dos Mortos continua tão vivo vai além da simples lembrança dos falecidos. A tradição oferece uma visão de que a morte não representa o fim, mas parte de um ciclo contínuo da vida.
México se burla de la muerte.
Mientras otras culturas esconden el miedo a morir, los mexicanos lo invitan a comer, le cantan y convierten el dolor en color.
Esto es lo que el Día de Muertos enseña al mundo y el porqué de nuestra relación con la muerte... 🧵 pic.twitter.com/DGDeaXNldE
— FinanzasEstoicas (@FinanzaEstoicas) October 31, 2025
Em diversas comunidades indígenas, como San Miguel Canoa, nos arredores de Puebla, o ritual não mudou significativamente ao longo dos séculos e continua sendo praticado em língua originária e segundo calendários próprios.
A celebração assume diferentes formas conforme a região, mas o princípio comum — o reencontro entre vivos e mortos — permanece intacto.
Para quem pretende vivenciar o Dia dos Mortos no México, é recomendável conhecer com antecedência as festas locais e suas peculiaridades regionais. Em muitas localidades, a noite de 1 de novembro é dedicada às crianças falecidas (“Angelitos”), enquanto o dia 2 àqueles que partiram adultos.
Respeito aos costumes, como não confundir o ritual com o Halloween, e atenção a áreas de alto fluxo turístico ajudam a garantir uma experiência rica e significativa.
Pão dos Mortos exposto no Altar de Muertos da Fundación Casa de Mexico (Getty Images). (Getty Images for National Geographic Magazine)
A tradição mexicana do Dia dos Mortos ultrapassou fronteiras e conquistou o mundo por meio do cinema. Produções como “Viva – A Vida é uma Festa” (Coco, 2017), da Pixar, apresentaram de forma sensível e visualmente vibrante o simbolismo do Día de los Muertos, com suas oferendas, altares e a crença no reencontro entre vivos e mortos.
O sucesso internacional do filme ajudou a popularizar e a desmistificar a celebração, transformando-a em um ícone cultural reconhecido.