Agência de notícias
Publicado em 21 de outubro de 2025 às 17h37.
O vice-presidente dos Estados Unidos, JD Vance, disse durante uma visita a Israel nesta terça-feira que não há prazo para o grupo islamista Hamas se desarmar. A desmilitarização do grupo palestino é um dos pontos previstos nas próximas fases do acordo de paz elaborado pelo presidente americano, Donald Trump, para a Faixa de Gaza.
Em declaração à imprensa, Vance não explicou como autoridades envolvidas nas negociações garantiriam vários pontos críticos do frágil cessar-fogo. Embora o vice-presidente tenha repetido as palavras de Trump ao afirmar que o grupo palestino seria “destruído” caso se recusasse a entregar as armas, ele declarou não saber se o Hamas terá algum papel na futura governança do enclave palestino — uma proibição que está explícita no plano acordado por Israel e Hamas.
A viagem de Vance acontece em meio a uma corrida de Trump para consolidar o acordo mediado pelos EUA para promover a paz definitiva em Gaza.
— Não acho que seja realmente aconselhável dizer que isso precisa ser feito em uma semana — disse ele sobre a estipulação de um prazo para que o desarmamento do Hamas seja efetivado. — Nosso alerta ao Hamas é muito direto: o Hamas precisa se desarmar, o Hamas precisa se comportar e, embora todos os combatentes possam receber algum tipo de clemência, eles não poderão matar uns aos outros e seus companheiros palestinos.
Logo após seu desembarque, Vance se juntou a Steve Witkoff, enviado de Trump para o Oriente Médio, e Jared Kushner, genro do presidente, para um almoço de quase duas horas no Aeroporto Ben Gurion, a cerca de 20 km a sudeste de Tel Aviv. Witkoff e Kushner foram fundamentais na mediação do acordo de cessar-fogo, juntamente com mediadores de Catar, Egito e Turquia.
Na sequência, o vice-presidente americano seguiu para o sul, até a cidade de Kiryat Gat, para briefings privados em um centro de coordenação civil-militar que abriga pessoal americano que monitora a implementação do cessar-fogo. O planejamento prevê que Vance se reúna com alguns líderes israelenses durante a visita.
Durante uma entrevista coletiva em Kiryat Gat, Vance garantiu, se referindo às negociações pela paz em Gaza, que "as coisas estão indo francamente melhor do que pensava", mas alertou que a execução completa do acordo de paz levará "muito, muito tempo".
Vance afirmou ainda que as questões sobre como Gaza deve ser governada no futuro devem ser deixadas para depois que a segurança tanto dos palestinos em Gaza quanto dos israelenses, bem como a assistência humanitária a Gaza, sejam garantidas.
— Como seria a autoridade máxima em Gaza? — perguntou ele. — Não sei a resposta para essa pergunta.
Vance e Kushner minimizaram os relatos de que o acordo de paz está fracassando por conta dos surtos de violência dos últimos dias. Kushner afirmou que ambos os lados estavam "em transição após dois anos de guerra muito intensa".
No domingo, militantes palestinos atiraram contra soldados israelenses na cidade de Rafah, no sul de Gaza, matando dois militares. Em resposta, Israel lançou uma onda de ataques que matou 45 palestinos, segundo autoridades de saúde de Gaza. A violência durou pouco, mas analistas alertaram que a trégua provavelmente será testada de novo.
As forças israelenses também atacaram palestinos que, segundo elas, cruzaram uma linha de demarcação, para onde as forças militares israelenses recuaram ainda dentro de Gaza. Os militares israelenses disseram que alguns eram membros de grupos armados, mas no sábado, autoridades de Gaza disseram que vários civis, incluindo várias crianças, foram mortos.
Kushner disse também que os EUA e seus aliados estão considerando iniciar a reconstrução de Gaza em partes do enclave atualmente controladas pelas forças israelenses. Isso representa cerca de metade de Gaza, segundo o exército israelense.
— Nenhum fundo de reconstrução será destinado a áreas que o Hamas ainda controla — acrescentou, mesmo que a limpeza possa começar em uma "nova Gaza".
Segundo ele, isso "daria aos palestinos que vivem em Gaza um lugar para ir, para conseguir empregos e para morar. Kushner acrescentou que esta era apenas uma proposta em consideração e não deixou claro se a área em questão estaria sob o controle do exército israelense ou de uma força internacional que ainda não foi criada.
Em um discurso na segunda-feira ao Parlamento israelense, Netanyahu foi vago sobre o que esperava discutir com Vance, afirmando apenas que a conversa teria dois tópicos principais: “desafios de segurança e as oportunidades diplomáticas que enfrentamos”. Nesta terça-feira, o gabinete do primeiro-ministro informou que ele se encontrou com o chefe de inteligência do Egito, general Hassan Rashad, para discutir o cessar-fogo em Gaza e outras questões regionais.
Israel e Hamas concordaram no dia 10 de outubro com uma trégua na guerra de dois anos, um acordo baseado em partes num plano delineado por Trump. Em 13 de outubro, o grupo armado palestino entregou os 20 reféns israelenses que ainda mantinha em Gaza, enquanto Israel libertou quase 2 mil prisioneiros e detidos palestinos em troca.
Embora tenha menos de duas semanas, o cessar-fogo já está sob pressão. Analistas disseram que a viagem de Vance a Israel, que deve durar até quinta-feira, tem como objetivo enviar um alerta tanto a Israel quanto ao Hamas para que não minem a trégua. O vice-presidente, no entanto, negou a relação entre a visita e as recentes ameaças à continuidade do acordo.
Vários funcionários de Trump, falando sob condição de anonimato para discutir conversas privadas, disseram ao New York Times na segunda-feira que havoa preocupações dentro do governo de que o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, pudesse anular o acordo apoiado pelos EUA.
Hoje pela manhã, Trump afirmou que, se o Hamas violasse o acordo, vários aliados não identificados dos EUA no Oriente Médio "receberiam com satisfação a oportunidade" de responder ao grupo militante com "força pesada".
"Ainda há esperança de que o Hamas faça o que é certo. Se não fizerem, um fim ao Hamas será rápido, feroz e brutal", escreveu o republicano nas redes sociais.
Por enquanto, tanto Israel quanto o Hamas afirmam estar comprometidos com o cessar-fogo, apesar dos repetidos surtos de violência nos últimos dias.
Trump e seus mediadores esperam dar continuidade ao cessar-fogo para concretizar uma ambiciosa visão pós-guerra para Gaza, que veria os combatentes do Hamas deporem suas armas, uma força internacional assumir a segurança e uma administração palestina independente eventualmente assumir o controle político do enclave. O Hamas expressou sérias reservas sobre esse plano, especialmente quanto ao desarmamento de seus combatentes. E ambos os lados ainda não cumpriram partes significativas do acordo inicial de cessar-fogo, muito menos chegaram a um acordo mais amplo sobre o futuro de Gaza.
O Hamas devolveu os corpos de pelo menos 13 pessoas a Israel, e as autoridades israelenses devolveram os corpos de pelo menos 150 palestinos a Gaza. Nesta terça-feira, o Hamas afirmou que planeja devolver mais dois corpos a Israel às 21h, horário local (15h, no horário de Brasília). Os corpos dos outros 15 reféns, que o Hamas é obrigado a devolver a Israel sob o acordo de cessar-fogo, permanecem em Gaza. Autoridades do grupo islamista disseram que estão fazendo o melhor que podem, mas que recuperar os restos mortais em meio aos escombros deixados pela guerra está sendo um desafio, como previsto durante as negociações.
— Levamos a sério a entrega de todos os corpos, conforme estipulado no acordo — declarou Khalil al-Hayya, um importante líder do Hamas, à televisão estatal egípcia na manhã desta terça-feira.
Líderes israelenses, incluindo Netanyahu, chegaram a acusar o Hamas de violar o acordo ao não devolver imediatamente os restos mortais de mais reféns — inicialmente, apenas quatro tinham sido entregues. A retaliação dos israelenses se materializou com o fechamento da passagem de Rafah, entre Gaza e o Egito, para a entrada de ajuda humanitária no enclave.
Durante o pronunciamento à imprensa nesta terça-feira, Jared Kushner afirmou que "tem havido uma coordenação surpreendentemente forte entre as Nações Unidas e Israel" na entrega de ajuda humanitária desde o início do cessar-fogo. No entanto, a ONU tem reclamado repetidamente das restrições israelenses à entrada de ajuda desde o início da guerra, ou do que chamou de restrições israelenses onerosas à movimentação de trabalhadores humanitários no enclave.
Por sua vez, Israel tem repetidamente atribuído a escassez de suprimentos humanitários em Gaza a saqueadores armados, agentes do Hamas e organizações internacionais como as Nações Unidas. O governo de Netanyahu afirmou que essas organizações frequentemente não têm sido administradores competentes da ajuda.