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Empresários veem alívio no tarifaço, mas querem resolução antes das eleições

Brasil e Estados Unidos terão eleições em 2026, que poderão tirar o foco da questão tarifária

Abrão Neto, presidente da Amcham, durante evento em São Paulo (Divulgação)

Abrão Neto, presidente da Amcham, durante evento em São Paulo (Divulgação)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 27 de novembro de 2025 às 06h01.

O ano de 2025 foi o mais difícil na história da relação entre Brasil e Estados Unidos por causa do tarifaço do presidente Donald Trump contra produtos brasileiros. A sensação entre empresários com negócios envolvendo os dois países é a de que o pior já passou. No entanto, ainda não está claro quando a situação será resolvida de vez, e há temores de que a aproximação das eleições no Brasil e nos EUA possa travar as conversas.

"Depois de meses de tensões, estamos aliviados de perceber a melhoria do clima político a partir da aproximação entre os presidentes dos dois países e o início de um desejável processo de negociações comerciais", disse Abrão Neto, presidente da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham), em discurso em um evento da entidade, na terça-feira, 25, em São Paulo.

Neto disse que a eliminação das sobretaxas de 50% para um conjunto de mais de 200 produtos da agroindústria brasileira foi "um alívio importante" para setores que exportam cerca de US$ 4 bilhões aos EUA. "Mas ainda há bastante trabalho pela frente, uma vez que mais da metade das exportações brasileiras continua sujeita a sobretaxas, com impactos não apenas sobre o comércio, mas sobre a previsibilidade dos negócios bilaterais", afirmou.

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"Caminhamos para o final do ano ansiosos com a resolução das tarifas, mas com otimismo e expectativa de avanços concretos nas tratativas bilaterais", disse o presidente da Amcham.

A aproximação de 2026 também traz a preocupação de que as eleições, nos dois países, possa tirar o foco da questão. Em outubro, o Brasil escolherá um novo presidente e, em novembro, os EUA terão as midterms, para renovar o Congresso.

"É importante aproveitar essa janela de oportunidade, pois ela não necessariamente fica aberta de maneira indefinida. Ano que vem é um ano em que muito da atenção no Brasil já se volta para dentro, então, há um senso de urgência em se aproveitar essa janela e continuar se tendo avanços nas conversas", disse Neto.

O embaixador Roberto Azevedo, ex-diretor da Organização Mundial do Comércio, reforça a questão temporal. "O tema precisa ser resolvido, sob a perspectiva americana, antes de o processo eleitoral ganhar ímpeto", disse, no mesmo evento.

"O horizonte de tempo é curto. A ideia é que encontremos soluções no curto prazo, nos próximos três meses", afirmou.

"Temos interesse em resolver essa questão com os Estados Unidos o quanto antes. Temos pressa", disse Tatiana Prazeres, secretária de comércio exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

Conta das tarifas pendentes

Atualmente, 22% das exportações brasileiras aos EUA estão sob a tarifa direcionada ao Brasil, de 40% ou 50%, 27% estão sob as taxas da Seção 232, que valem para todos os países, e 51% dos itens estão com tarifa de 0% ou 10%.

"O próximo passo é excluirmos mais produtos [do tarifaço] e reduzirmos a alíquota. O trabalho agora vai ser continuar neste acordo", disse o vice-presidente Geraldo Alckmin.

Entre os setores ainda afetados, estão o de máquinas agrícolas, pescado e mel.

"Há setores que têm uma alta dependência das suas exportações para os Estados Unidos. Na metalurgia, há uma dependência de mais de 30%", disse Constanza Negri, Gerente de Comércio e Integração Internacional da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

José Velloso, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), apontou que a queda nas exportações do setor para os EUA caiu 42% em outubro, na comparação com o ano anterior.

"Estamos esperando uma queda muito maior em novembro. É uma consequência muito grande porque a tarifa é muito alta", afirma Velloso.

Fernanda Carneiro, diretora adjunta de Relações Internacionais da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), apontou que 78% do mel exportado pelo Brasil vai para os EUA, e a de tilápia, 80%, e que buscar novos mercados é um processo demorado e complexo.

"Os hábitos de consumo de outro país não são exatamente aqueles dos Estados Unidos. A mandioca que se come nos Estados Unidos, que não é a mesma mandioca que se consome na Europa", disse.

Opções de negociação

A redução de tarifas da semana passada teve um ponto curioso: ela veio sem que o Brasil tivesse feito concessões significativas, como ocorreu com outros países.

Assim, o Brasil segue com várias possíveis concessões na mesa, em diversas áreas, como minerais críticos, terras raras, cooperação em energia e aumento do combate à pirataria.

"Em minerais críticos, os Estados Unidos têm o anseio de diversificar os seus fornecedores, e o Brasil, que tem uma das maiores reservas desses minerais do mundo, precisa de investimentos, de parcerias, de expertise e tecnologia para explorar e beneficiar esses produtos aqui. Existe a possibilidade de se encontrar um compromisso que beneficia os dois países", disse Neto, da Amcham.

Para o embaixador Azevedo, o Brasil terá de ser pragmático nas negociações, uma vez que elas não seguirão o roteiro tradicional de pedidos e ofertas.

"Vai ser mais um jogo de sedução interesseira", disse o ex-diretor da OMC. “O momento que nós encabeçamos com os EUA é de oportunidade. Mas essa janela de oportunidade é evidentemente efêmera. Muitas coisas podem acontecer para fechar essa janela, inclusive tensões que possam advir da política externa dos Estados Unidos, que tende a ser muito transacional, como o presidente [dos Estados Unidos, Donald] Trump, volátil.”

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