Mundo

Itália: o verdadeiro desafio de Mario Monti começa agora

Novo premiê tem duas tarefas difíceis pela frente: reconquistar a confiança do mercado com o novo pacote de medidas e exorcizar o fantasma de Berlusconi

Mario Monti tem a missão de comandar a Itália por uma transição complicada  (Tony Gentile/Reuters)

Mario Monti tem a missão de comandar a Itália por uma transição complicada (Tony Gentile/Reuters)

DR

Da Redação

Publicado em 3 de dezembro de 2011 às 15h52.

Em pouco mais de 20 dias, a Itália - sob os olhos atentos e apreensivos de toda a Europa - acompanhou a reestruturação de seu governo, confiante de que o novo primeiro-ministro, Mario Monti, consiga tranquilizar o mercado mundial e recuperar a boa imagem do país após a saída do furacão Silvio Berlusconi e seu "bunga bunga".

Agora, Monti terá de provar se é mesmo capaz de recuperar a economia italiana, afundada em uma recessão que reduziu drasticamente as previsões de crescimento do país. E o primeiro passo será dado nesta segunda-feira, quando ele apresenta suas novas medidas de austeridade, entre as quais estão mudanças no sistema de aposentadoria e até a criação de um imposto sobre as classes mais ricas.

Segundo analistas, esse momento exige ação e rapidez. “A razão pela qual a Itália está com problemas econômicos é amplamente ligada à sua inércia. E o principal problema estava em sua liderança”, analisa ao site de VEJA James Waltson, professor de ciência política na Universidade Americana de Roma.

Nesse contexto, Mario Monti foi a escolha mais acertada, por ser um economista renomado e também passar uma imagem íntegra, analisa Maurizio Viroli, professor da Universidade Princeton e da Universidade da Suíça Italiana. "Ele deve ser capaz de restaurar a credibilidade da Itália e tentar superar a atual crise financeira e econômica”, acredita. Contudo, suas qualidades técnicas não devem levá-lo muito além dessa fase de transição, ressalva Viroli.

“Depois, o país precisará de um governo capaz de enfrentar também sérios problemas políticos. A Itália necessita de uma reforma moral, uma renovação cívica, uma restauração política completa, uma terapia radical. O país está seriamente doente”, completa.

Um sucessor imediato ainda não é apontado: o cenário da oposição, da centro-esquerda, está caótico e dividido, enquanto a centro-direita, liderada por Angelino Alfano, é temida por representar um prolongamento da época de Berlusconi - sem Berlusconi. “No momento, não consigo imaginar um político capaz de liderar a Itália nos próximos anos. Seu primeiro passo deveria ser confirmar que realmente o país entrou numa nova fase.”

O fantasma

A figura de Berlusconi é excentricamente burlesca. A cada aparição pública, já se esperava uma nova gafe ou um novo escândalo - ligado a corrupção ou, principalmente, mulheres. Apesar disso, ele foi eleito três vezes (em 1994, 2001 e 2008) e conquistou seguidos votos de confiança do Parlamento durante seus mandatos. A verdade é que muitos italianos - se não a maioria deles - ainda o defendem ou, pelo menos, não o condenam.


Para eles, os escândalos sexuais, por exemplo, não tem grande valor. “Pelo contrário. Muitos deles o admiram por suas atividades sexuais. Para seus incontáveis apoiadores, não faz diferença se Berlusconi é corrupto. Ainda melhor se for, porque isso lhes permite ser também”, diz Viroli, lembrando que o ex-premiê deixou o poder devido à pressão da comunidade internacional, e não dos cidadãos italianos.

O professor salienta, porém, que o sistema político alimentado por ele encorajava a corrupção. “Ele estabeleceu na Itália um sistema de poder baseado em sua própria figura, graças à sua riqueza e ao controle do império das comunicações no país. Além disso, é dono do seu partido e tem carisma. Com essas qualidades ele se torna capaz de garantir favores às pessoas - muitas dependem dele para ter privilégios, fama e dinheiro.”

Por 17 anos, Berlusconi se apresentou como o único possível salvador da Itália - e a população acreditou nesse personagem. “Para isso, ele contou com recursos midiáticos e financeiros, os quais permitiram que ele persuadisse uma maioria considerável de italianos a apoiá-lo”, observa Waltson.

Isso explica por que, poucos dias antes de renunciar, o então premiê ainda parecia invencível. Mas sua força como comunicador esbarra na falta de capacidade política. “Ele é capaz de negociar, convencer, reunir alianças e aprender rapidamente. Mas suas habilidades são demagógicas.”

Os próximos governantes - tomara mais sérios - devem ao menos colocar um fim à ideia de que política é performance: aparecer na televisão e fazer piadas. Para Viroli, que é autor do livro The Liberty of Servants: Berlusconi's Italy (Editora da Princeton University), é preciso imprimir clareza e integridade ao governo italiano: "Não podemos continuar a pensar que a política é uma comédia. O lugar de rir é no teatro, a vida real é diferente. É preciso mudar o estilo dos italianos de pensar a política".

Acompanhe tudo sobre:Crise econômicaEuropaItáliaPaíses ricosPiigs

Mais de Mundo

EUA e China chegam a acordo para reduzir tensões comerciais, diz Bloomberg

Ex-presidente Cristina Kirchner deve ser presa por corrupção, decide Suprema Corte

Atirador em escola da Áustria morre após ataque, diz polícia

Trump diz que, se necessário, invocará Lei da Insurreição para conter protestos