Daiana Molero, deputada federal por Buenos Aires, na Argentina (Reprodução/Linkedin)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 25 de outubro de 2025 às 14h00.
Buenos Aires - Durante a campanha eleitoral dos últimos meses, o governo de Javier Milei teve acertos na economia, mas falhas na política. Apesar disso, o bloco governista chega ao dia da votação com sinais de esperança de um bom resultado nas eleições legislativas deste domingo, 26, avalia a deputada federal Daiana Molero.
“Vejo uma chance de que essas eleições sejam boas para o governo. Nas últimas semanas, a agenda do governo foi retomada e está começando a mostrar algumas conquistas”, diz Molero, em conversa com a EXAME, em um café na Recoleta, em Buenos Aires, na tarde de sexta-feira, 24.
Molero representa a cidade de Buenos Aires e integra o PRO, partido do ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019), que integra o bloco governista.
“Na frente econômica, o governo fez as coisas muito bem para chegar a essas eleições. Mas a equipe política deveria ter feito o mesmo para garantir que não houvesse surpresas. No entanto, eles dinamitaram as relações com governadores importantes, que retiraram apoio e permitiram a aprovação de leis que comprometeram o equilíbrio fiscal”, diz Molero.
As pesquisas apontam para um cenário acirrado. Um estudo da Atlas Intel, feito entre os dias 15 e 19 de outubro, apontou que o partido de Milei, A Liberdade Avança, teria 41,1% de preferência, ante 37,2% do Força Pátria, de esquerda.
Veja, a seguir, mais trechos da entrevista.
Como avalia a campanha eleitoral deste ano?
Foi bastante movimentada. O Liberdade Avança (LLA) tinha quase tudo para ganhar, mas depois começou a cometer uma série de erros, desde os candidatos que apresentaram até alguns casos de corrupção, o que impediu que estivesse no centro da agenda. Eles [o partido LLA] controlavam muito a agenda de comunicação, e depois daquele momento, ficaram sem forças nessa área. Assim, a oposição nem precisava dizer o que queria fazer, pois só se falava dos candidatos do Liberdade Avança com problemas.
Nas últimas semanas, no entanto, a agenda do governo foi retomada e está começando a mostrar algumas conquistas. Na quinta, foi publicado o índice de confiança do consumidor da Universidade Torcuato Di Tella. É um dos mais consistentes com os resultados das eleições, o que é uma boa esperança para o governo.
Como prevê os resultados deste domingo?
As eleições serão acirradas. Em relação às eleições na província de Buenos Aires, em setembro [perdidas pelo LLA], espera-se que os resultados sejam melhores. Primeiro, porque são eleições diferentes. Naquele caso, estavam em jogo cargos nos governos locais, que atraem e mobilizam muito apoio, e agora não teremos tanta força da oposição.
Por outro lado, a derrota de 14 pontos na província de Buenos Aires foi um choque para as pessoas indecisas, porque esta eleição de meio de mandato é altamente polarizadora. Então, há muitas pessoas que não queriam votar e que agora vão votar. Ao mesmo tempo, muitos estrangeiros que votam nas eleições provinciais não votam nas nacionais. Então, vejo uma chance de que essas eleições sejam boas para o governo.
Como avalia a atuação do governo nos últimos meses?
Na frente econômica, o governo fez as coisas muito bem para chegar a essas eleições. O dólar foi mantido sob controle para que isso não se traduzisse em inflação, com o custo de perder alguma atividade devido a taxas mais altas. Mas a equipe política deveria ter feito o mesmo para garantir que não houvesse surpresas. No entanto, depois de maio, eles dinamitaram as relações com governadores importantes, que então retiraram seu apoio no Congresso e permitiram a aprovação de leis nos últimos meses que comprometeram o equilíbrio fiscal e, portanto, impactaram a economia. Isso foi quase mais um erro político do que econômico.
Qual o peso das eleições deste domingo?
Em maio, me encontrei com investidores do exterior e disse a eles: "Essas são eleições de meio de mandato que não mudam, matematicamente, em nenhum dos cenários, a composição da Câmara. Em todos eles, o Liberdade Avança terá mais legisladores. Mas eles me disseram: "Não importa. Quero ver se as pessoas continuam apoiando isso [o governo Milei] o suficiente para, eventualmente, fazermos investimentos ou algo assim”. Isso foi sentido tanto por investidores quanto por pessoas comuns aqui na Argentina, que dizem: "Espere, eu consigo uma hipoteca ou não?", dependendo de como o governo vai agir.
Como deverá seguir a aliança entre o PRO e o Liberdade Avança nesta segunda parte do mandato de Milei?
Vai depender muito do governo. O PRO sempre demonstrou apoio quase incondicional, porque apoiou todas as reformas, e não acho que isso vá mudar substancialmente. Vamos apoiar as coisas que estão indo bem; não há dúvida disso. Mas esperamos uma mudança no governo na forma de fazer política, especialmente no Congresso, e que eles tenham uma atitude diferente em relação aos seus aliados. Nos parece que houve uma série de erros, tendo exacerbado desnecessariamente o conflito, o que os levou a perder constantemente votações no Congresso que não deveriam ter perdido.
Com o PRO, o governo garante o terço dos votos no Congresso, tão necessário para manter os vetos [presidenciais], mas não suficiente para aprovar as reformas, que precisam de 129 votos [mais da metade do total de 257 assentos]. Então, você vai precisar de um diálogo um pouco mais frutífero com os grupos de centro.
Milei poderá celebrar uma vitória se seu bloco conquistar um terço dos votos?
Mais ou menos. Na realidade, este um terço parece garantido para ele em quase todos os cenários, mesmo nos mais pessimistas. A comunicação sobre isso, se ele ganha ou perde, é mais importante. Os números no Congresso, que estão entre os cenários mínimo e máximo, não mudam substancialmente. E mesmo no cenário mais otimista, nunca haveria votos suficientes para aprovar as reformas.
Para mim, o que está em jogo é o framing [forma como o resultado será visto], se será uma eleição em que o governo sairá bem. Isso lhe dará uma espécie de força para trazer os outros atores à mesa para negociar as reformas restantes. Além disso, as expectativas são menores do que as que ocorreram na eleição de Buenos Aires.
As próximas reformas propostas por Milei são nas áreas trabalhista e tributária. Elas terão poder de reanimar a economia?
As reformas são muito importantes, mas, ao mesmo tempo, acho que outra coisa que será importante é, primeiro, se ele conseguir o apoio do povo nas urnas. Isso já daria uma dose de confiança para relaxar as taxas de juros, uma das coisas que estão impactando a atividade. Isso pode reativar bastante a economia. Não será imediato, nem um foguete, mas pode começar a te dar mais fôlego, assim como se os projetos de investimento começarem a se materializar. Além disso, uma mudança nas expectativas eleitorais, que são muito mobilizadoras na Argentina, também pode puxar as coisas para cima.
Como vê o futuro do modelo de bandas cambiais para controlar o dólar, que é colocado em dúvida pela falta de reservas na Argentina?
As eleições também são um fator que te leva a querer comprar mais dólares. Para mim, há um certo exagero quanto à necessidade de uma mudança de regime [cambial]. O governo já fez a coisa mais difícil: sair do cepo [controle cambial total] e implementar as bandas, sem um salto na inflação. Isso rompeu com uma lógica de que, se o dólar se movia, os preços o acompanhavam um a um. Isso se rompeu e é um passo muito importante para o que vem a seguir.
Depois das eleições, que impulsionaram muito o mercado de câmbio, você pode expandir um pouco mais essas faixas, mas não é a mesma coisa que dois ou três meses atrás, quando diziam: "O peso está caro, a Argentina está cara". Hoje, não parece mais assim, e você pode relaxar um pouco suas políticas sem ser tão drástico. Se o déficit fiscal continuar sob controle e não houver emissão [de pesos], os desafios serão mais administráveis.
O que mais tem ouvido das demandas das pessoas durante a campanha?
Hoje, a demanda mais concreta é sobre quando virá a reativação da economia. A inflação caiu, é o que muitos percebem, mas, ao mesmo tempo, o salário não é suficiente, mesmo que a inflação tenha diminuído,
As demandas das sociedades de hoje são instantâneas, como a nossa velocidade de rolagem dos stories no Instagram, e os processos de estabilização são longos e complexos. A próxima demanda é crescimento, mais emprego, e me parece que é isso que terá que seguir essa direção na agenda do governo.
As demandas das pessoas, há cerca de dois anos, eram a segurança e a inflação. Bem, hoje em dia, esses dois são mais controlados. Na Argentina, sempre havia piquetes e fechamento de ruas. As pessoas perceberam isso, mas quando você já tem coisas, você rapidamente as coloca de uma forma que parece natural e tem novas demandas.