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O líder catalão comemora, mas só no futebol

Os 7 milhões de catalães começaram a semana sem saber ao certo quem manda na região – mas após assistir a um feito esportivo simbólico no fim de semana

GIRONA VS. REAL MADRID: time do deposto Charles Puigdemont venceu o Real Madrid, de Mariano Rajoy, no domingo  / Albert Gea/ Reuters (Albert Gea/Reuters)

GIRONA VS. REAL MADRID: time do deposto Charles Puigdemont venceu o Real Madrid, de Mariano Rajoy, no domingo / Albert Gea/ Reuters (Albert Gea/Reuters)

EH

EXAME Hoje

Publicado em 30 de outubro de 2017 às 12h14.

O Barcelona pode ser o time mais famoso e mais imbricado no tortuoso processo de independência da Catalunha. Um de seus principais jogadores, o zagueiro Gerard Piqué, chegou a cogitar não jogar mais pela seleção espanhola, e passou a ser vítima de inflamadas reações dos dois lados. Mas foi outro clube catalão, o pequeno Girona, que conquistou um feito esportivo simbólico no fim de semana.

Recém-promovido à primeira divisão pela primeira vez, o Girona derrotou o Real Madrid, atual campeão europeu, por 2 a 1. Foi a primeira vez que o time da capital, maior campeão europeu da história, visitou a cidadezinha de 98.000 habitantes a 100 quilômetros de Barcelona. Para melhorar o peso histórico da vitória, o Girona é o time do coração do deposto presidente catalão, Charles Puigdemont, que comemorou o feito pelo Twitter no domingo.

"A vitória do Girona sobre um dos grandes times do mundo é todo um exemplo e referência para muitas situações", escreveu. O Real Madrid ainda é o time do chanceler espanhol, Mariano Rajoy, que vem conduzindo com mão pesada a tentativa catalã de se separar do restante do país, considerada ilegal pela Justiça espanhola.

As autoridades chegaram a cogitar o adiamento da partida por questões de segurança. Manifestantes contra e a favor da independência tomaram ruas de cidades catalãs no fim de semana. Na maior manifestação, em Barcelona, 300.000 pessoas pediram pela continuidade da união com a Espanha.

Os 7 milhões de catalães começaram a semana sem saber ao certo quem, afinal de contas, manda na região. Na sexta-feira, vale lembrar, o parlamento catalão declarou independência. Horas depois, Madri destituiu o governo da província e marcou novas eleições para o dia 21 de dezembro. Puigdemont, feliz pela vitória esportiva, é o grande artífice da polêmica que começou com um referendo no dia 1o de outubro em que 43% dos eleitores catalães foram às urnas, e 90% deles votou pela independência.

O chefe do governo espanhol, Mariano Rajoy, ordenou na sexta-feira a destituição de Puigdemont, de todo seu gabinete e outros altos cargos e convocou eleições autônomas para o dia 21 de dezembro, amparado no artigo 155 da Constituição espanhola. Nesta segunda-feira, a Promotoria Geral da Espanha apresentou denúncias por rebelião, insurreição e outros crimes contra Puigdemont e os integrantes do destituído governo da região e os membros da mesa do parlamento autônomo por impulsionar um processo independentista.

Em um pronunciamento à imprensa, o procurador-geral José Manuel Maza explicou que a denúncia contra os membros do gabinete catalão será levada à Audiência Nacional, porque nenhum deles conta com fórum especial após terem sido destituídos na sexta-feira passada pelo governo espanhol. Os membros da mesa do parlamento deverão responder perante o Tribunal Supremo por contarem com um fórum especial como parlamentares, acrescentou Maza.

O Executivo espanhol deu “algumas horas” para que os membros do governo regional da Catalunha, destituídos na sexta-feira passada, possam recolher seus objetos pessoais dos escritórios oficiais e sair deles em seguida, acompanhados de um agente policial.

Em meio à disputa, o paradeiro de Puigdemont virou assunto do dia na Espanha. Ele postou pela manhã uma foto da sede do governo catalão acompanhada de um "bom-dia". Mas o céu azul ao fundo não correspondia às condições climáticas de Barcelona. Pouco depois o jornal El País revelou que na verdade ele está em Bruxelas. No domingo, o secretário de migração da Bélgica, Theo Francken, ofereceu asilo a Puigdemont, numa oferta que depois foi negada pelo primeiro ministro do país, Charles Michel.

A única certeza desse quiproquó é o impacto econômico da indefinição. Mais de 500 empresas já deixaram a Catalunha, entre elas bancos importantes, como o CaixaBank, e companhias de consumo como a fabricante de espumantes Cordoniú.

A polêmica também pega a Espanha justamente num momento de euforia econômica depois de uma década de recessão. Nesta segunda-feira foi divulgada a prévia do PIB do país para o trimestre terminado em setembro, com crescimento de 0,8%, pouco abaixo das estimativas de 0,9%. Ainda assim, é muito acima do que o mais otimista dos espanhóis podia prever até pouco tempo atrás. A economia do país cresceu 3,1% no último ano, graças a aumento no emprego, alta do turismo e das exportações e retomada do investimento industrial.

Como os dados vão até setembro, não computam o peso da incerteza política. A Catalunha já apresentava dados piores que o restante do país, com queda na vendas do varejo e crescimento do emprego a taxas menores das demais regiões espanholas. O peso maior, tanto para a região quanto para o país, estará nos próximos trimestres. O governo calcula que as tensões políticas podem custar de 3 a 12 bilhões de dólares de queda no PIB. Ainda assim, a Espanha prevê crescer 2,5% no ano que vem.

Mas, como ficou claro com o referendo e a partida em Girona, eventos inesperados sempre podem mudar o cenário.

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