Irfaan Ali, presidente da Guiana, que busca a reeleição, durante comício em Georgetown (Joaquin Sarmiento/AFP)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 27 de agosto de 2025 às 11h37.
Última atualização em 27 de agosto de 2025 às 11h39.
A Guiana, país vizinho ao Brasil, vive a melhor fase econômica de sua história. Nos últimos anos, o país teve o maior crescimento real do PIB no mundo: a economia aumentou seis vezes de tamanho em dez anos, puxada pela exploração de petróleo. Esse ritmo deve seguir forte, com previsão de crescer a uma média anual de 14% nos próximos cinco anos, nas contas do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Este também será o tempo de mandato do novo governo, que será eleito em 1º de setembro, e terá cinco anos para comandar o país e decidir o que será feito com tanta riqueza.
"Esta eleição na Guiana representa um grande desafio, não apenas para o país, mas também para os mercados globais de energia e o Caribe", diz Benjamin Gedan, professor na universidade John Hopkins, que visitou o país em março.
A disputa atual, no entanto, pode acabar em crise política. Em 2020, o presidente Irfaan Ali foi eleito com cerca de 15 mil votos de vantagem, em um país de 800 mil pessoas, e a apuração levou cinco meses para ser concluída, por pedidos de recontagem.
“Na última vez que os guianenses foram às urnas, uma disputa sobre a contagem de votos ameaçou a jovem democracia do país”, diz Gedan. A Guiana só se tornou independente em 1966.
“Este é um momento ainda pior para uma crise eleitoral, já que o país enfrenta uma crescente disputa territorial com a Venezuela, a ameaça do crime organizado atraído pelas riquezas do petróleo e um potencial conflito interno, enquanto comunidades étnicas disputam fatias da crescente renda nacional”, prossegue.
Na visita, Gedan se encontrou com o presidente Ali e viu um país em crescimento vertiginoso. A produção de petróleo atingiu 900 mil barris por dia em agosto, sendo que no começo do ano era de 650 mil.
"Ali canalizou essa riqueza inesperada para projetos de infraestrutura ambiciosos e populares, incluindo hospitais, escolas e rodovias", diz o professor.
O PIB da Guiana era de US$ 4,2 bilhões em 2015, e atingiu US$ 24 bilhões em 2024. O crescimento supera dois dígitos desde 2020, com números como 63% de alta em 2022, 34% em 2023 e 43% em 2024, segundo o Banco Mundial.
A riqueza da Guiana explodiu após o início da exploração de reservas de petróleo em sua costa, na região perto da Margem Equatorial brasileira, na década passada. O país fechou contratos com petroleiras estrangeiras, como a norte-americana ExxonMobil, que lidera a exploração, e a chinesa CNOOC.
“A produção de petróleo está aumentando rapidamente e, juntamente com o forte crescimento não petrolífero e o investimento em infraestrutura em larga escala, está sustentando a maior taxa de crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo, com uma média registrada de 47% no período 2022-2024”, diz um relatório do FMI, publicado em maio.
“As perspectivas permanecem altamente favoráveis. A produção de petróleo continuará se expandindo rapidamente, e espera-se que o crescimento real do PIB não petrolífero permaneça forte, em grande parte apoiado pelos esforços do governo para investir em infraestrutura, incluindo para adaptação às mudanças climáticas, promoção da diversificação econômica e melhoria do bem-estar da população”, afirma o fundo.
Pessoas caminham em rua de Georgetown, capital da Guiana (Joaquin Sarmiento/AFP)
Na campanha eleitoral, tanto o presidente quanto a oposição fazem promessas grandiosas, como garantir casa própria para todos os 814 mil habitantes do país, construir pontes, estradas, aumentar a segurança e cortar impostos, tudo custeado pelos recursos do petróleo.
O governo tem feito também repasses de dinheiro diretos à população. No final de 2024, foi aprovado um benefício de 100 mil dólares da Guiana, cerca de R$ 2.500, para todos os cidadãos do país com mais de 18 anos, a ser pago uma vez. Mais iniciativas do tipo deverão ser feitas nos próximos anos, para "dividir a riqueza da nação", segundo Ali.
Ao mesmo tempo, há um discurso do governo de manter a austeridade, e de acusar a oposição de querer exceder os gastos.
"Temos que criar riqueza antes de distribuir a riqueza. Qualquer um que diga o contrário está te enganando", disse o vice-presidente Bharrat Jagdeo, em entrevista a um site local. "Se dizemos que vamos dar 100 mil em um benefício, eles dizem que vão dar 400 mil", afirmou.
A oposição busca também adotar um tom de comedimento e promete limitar o uso de outro benefício, pago para pais com crianças na escola. "Não queremos te dar dinheiro para você ir fazer as unhas", disse Aubrey Norton, principal nome da oposição, em um discurso no começo de agosto.
A política na Guiana tem uma característica peculiar: os eleitores tendem a se agrupar nos partidos por critérios de etnia. Historicamente, o partido governista PPP/C atrai mais descendentes de indianos, e o rival APNU reúne afro-guianenses. O país se tornou independente do Reino Unido apenas em 1966, e os britânicos costumavam trazer pessoas de outras colônias para trabalhar lá.
"Os dois lados fazem promessas muito parecidas, e o voto étnico poderá fazer a diferença", diz Vinicius Vieira, professor de relações internacionais na FGV.