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Shutdown: entenda o que está em jogo em possível paralisação do governo dos EUA

Impasse atual gira em torno de subsídios do Obamacare, que expiram em dezembro, e cortes de quase US$ 1 trilhão no Medicaid aprovados pela administração do presidente americano

Governo dos EUA: Congresso passa por impasse e corre risco de shutdown (Sky Noir Photography by Bill Dickinson/Getty Images)

Governo dos EUA: Congresso passa por impasse e corre risco de shutdown (Sky Noir Photography by Bill Dickinson/Getty Images)

Publicado em 30 de setembro de 2025 às 08h13.

O governo dos Estados Unidos corre risco de paralisação a partir da meia-noite desta terça-feira, 30, caso Congresso e Casa Branca não cheguem a um acordo sobre o orçamento.

A última vez que isso ocorreu foi em 2018–2019, quando os EUA enfrentaram 35 dias de shutdown, o mais longo da história do país.

O impasse atual gira em torno de subsídios do Obamacare, que expiram em dezembro, e cortes de quase US$ 1 trilhão no Medicaid aprovados pelo governo do presidente americano, Donald Trump. Sem renovação, 22 milhões de norte-americanos poderão ter aumento médio de 75% nos prêmios de seguro de saúde, segundo o KFF, grupo de pesquisa em políticas públicas.

Economistas projetam que uma paralisação de um mês pode reduzir o Produto Interno Bruto (PIB) americano entre 0,5% e 1,5%, além de deixar mais de 2 milhões de servidores sem pagamento imediato. Serviços essenciais, como Previdência, Medicare, segurança de fronteiras e controle aéreo, seguiriam em funcionamento.

Por que isso importa?

O presidente Trump reuniu líderes do Congresso na segunda-feira, 29, mas o encontro terminou sem avanços. O vice-presidente JD Vance acusou os democratas de “se recusarem a agir com responsabilidade”.

Republicanos tentaram aprovar uma resolução temporária que manteria os gastos até novembro, incluindo recursos para segurança e programas de veteranos, mas a proposta foi rejeitada no Senado. Do lado oposto, os democratas apresentaram alternativa que revertia cortes no Medicaid e prorrogava os créditos do Obamacare — também sem sucesso.

Na prática, a disputa reflete uma batalha mais ampla sobre o papel do Estado no financiamento da saúde pública americana. A proximidade do fim dos subsídios aumenta a pressão porque, em 1º de novembro, começa o período oficial de inscrições (open enrollment) no mercado de seguros de saúde do Obamacare.

É nessa janela anual que milhões de norte-americanos contratam ou renovam seus planos, e as seguradoras precisam saber antes se os subsídios serão prorrogados para definir os valores das apólices. Sem essa certeza, as companhias tendem a repassar o risco aos consumidores, com prêmios muito mais altos já na próxima temporada.

O que torna este shutdown diferente?

Ao contrário de paralisações anteriores, a administração Trump determinou que agências federais preparem planos de Reduction in Force (RIF), que podem extinguir permanentemente cargos considerados “não essenciais”.

Diferente dos shutdowns passados, em que servidores eram apenas suspensos temporariamente e recebiam salários retroativos, agora há a possibilidade de cortes definitivos de pessoal.

A medida se insere em uma estratégia mais ampla do governo para reduzir o tamanho da máquina pública. Desde o início de 2025, a Casa Branca tem implementado cortes em agências e programas federais considerados de baixa prioridade.

Impactos nos mercados

A incerteza política já se reflete nos juros dos EUA. Os títulos curtos (T-bills) sobem com prêmios de liquidez, enquanto os papéis de longo prazo recuam pelo movimento de flight to quality. Nos últimos dias, os Treasuries de 30 anos registraram queda, o que tende a beneficiar países emergentes, como o Brasil, via diferencial de juros, segundo o economista André Perfeito.

A situação complica ainda mais o trabalho do Federal Reserve (Fed). Com a paralisação, órgãos como o BLS (responsável pelo payroll, relatório de emprego dos EUA) e o BEA (que divulga PIB e inflação) deixam de publicar indicadores cruciais. Sem esses dados, a capacidade do Fed de calibrar a política monetária fica reduzida, o que contribui para o aumento da volatilidade nos mercados globais.

No Brasil, a tendência de queda dos juros longos nos EUA pode aliviar a ponta longa dos DIs e favorecer ativos de maior duração. Já no câmbio, a volatilidade deve se intensificar, com forças opostas: de um lado, o fortalecimento global do dólar em momentos de aversão a risco; de outro, a redução dos yields americanos de longo prazo, aponta a análise de Perfeito.

O que esperar daqui para frente?

O Congresso segue dividido. Embora os republicanos controlem Câmara e Senado, não alcançam os 60 votos necessários para aprovar medidas no Senado sem apoio democrata. A Câmara só retorna em 7 de outubro, após a data-limite, o que torna a paralisação praticamente inevitável.

Se o impasse se prolongar, os impactos podem ser significativos. Durante o shutdown de 2018–2019, o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO) calculou perdas de US$ 11 bilhões no PIB. Desse total, US$ 3 bilhões nunca foram recuperados.

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