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Como ele transformou seis contêineres encalhados em um negócio de R$ 50 milhões

Depois de perder o maior cliente e ficar com o estoque parado, Alisson Frizon apostou no e-commerce direto ao consumidor e criou a Damie, marca de poltronas premium que fatura milhões

Alisson Frizon, da Damie: “Mais de 90% da nossa receita já vem do nosso próprio e-commerce” (Divulgação)

Alisson Frizon, da Damie: “Mais de 90% da nossa receita já vem do nosso próprio e-commerce” (Divulgação)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 18 de maio de 2025 às 08h14.

Seis contêineres. Foi isso que sobrou para Alisson Frizon depois que o maior cliente da sua importadora de móveis resolveu cancelar um pedido milionário, já com a carga a caminho do Brasil.

As poltronas reclináveis, trazidas da China, ficaram empilhadas num depósito em Frederico Westphalen, no interior do Rio Grande do Sul. Para muitos, seria o fim da linha. Para Frizon, foi a desculpa perfeita para virar do avesso o próprio negócio.

Sem contrato assinado e sem capital de giro, ele fez o que dava: abriu uma lojinha no marketplace da Americanas, passou a vender direto para o consumidor e — em poucas semanas — viu que o faturamento superava o que vinha do atacado.

O que começou como plano B, virou modelo A. E, aos poucos, a marca Damie nasceu.

Hoje, a Damie é uma fabricante nacional de poltronas reclináveis premium com operação 100% "direct to consumer". A empresa tem fábrica própria, cerca de 70 funcionários, entrega para todo o Brasil (com restrições logísticas no Nordeste, por ora) e está ampliando o portfólio com sofás e camas compactas. Tudo com foco em design, conforto e experiência digital.

Em 2024, a empresa faturou R$ 35 milhões. Para 2025, a projeção é chegar aos R$ 50 milhões — com crescimento puxado por novos produtos, expansão da operação e um branding que fez da Damie uma das únicas marcas reconhecíveis no universo das poltronas brasileiras. “Mais de 90% da nossa receita já vem do nosso próprio e-commerce”, diz Alisson.

A seguir, os bastidores de como uma importadora quase quebrada virou um case raro no setor de móveis — desburocratizado, direto ao consumidor e com planos ambiciosos de dominar o país.

A virada de chave

Quando fundou sua empresa, ainda na faculdade de administração, Alisson Frizon fazia o que dava: importava desde papel de parede até equipamentos para solda.

Foi numa dessas que surgiu a ideia de trazer móveis da China — mais especificamente, poltronas reclináveis e cadeiras de área externa. O negócio começou tímido, mas em pouco tempo já tinha um grande comprador que respondia por quase todo o faturamento.

“Esse cliente representava uns 90% das nossas vendas. Eu era inexperiente, não tinha estrutura e fechei um pedido enorme sem contrato”, lembra. A compra foi cancelada com os produtos já embarcados no navio, e a empresa ficou com seis contêineres lotados de poltronas, sem ter para quem vender.

Sem fluxo de caixa e com estoque parado, Frizon resolveu tentar algo novo: abriu uma lojinha na Americanas (à época, B2W) e começou a vender direto para o consumidor final.

“Em dois, três meses, já estava vendendo quase a mesma coisa que vendia para aquele cliente grande”, diz. Foi aí que veio o estalo — e o modelo de venda direto para o consumidor entrou de vez na operação.

De importadora a fábrica própria

A primeira coisa que Frizon percebeu ao vender direto para o consumidor foi que os clientes queriam mais do que ele podia oferecer. As poltronas vinham em duas versões: marrom ou preta.

“Tinha cliente pedindo tecido diferente, logotipo bordado, detalhes sob medida. E a gente não tinha como atender”, afirma.

Foi então que ele decidiu comprar uma fábrica local que já produzia poltronas mais simples. A ideia era clara: oferecer um produto de alto padrão, mais robusto para o corpo do brasileiro e com personalização — algo impensável no modelo de importação.

Mas não foi simples.

“A gente achava que ia sair uma Ferrari, mas na linha de produção estava mais para um Fusca”, afirma. Foram dois anos de ajustes em maquinário, design, qualidade e processos. Só então a Damie se consolidou como indústria — com 70 funcionários e produção própria em Frederico Westphalen.

Aos 31 anos, Alisson ainda comanda a empresa onde tudo começou: sua cidade natal.

Antes de virar empreendedor, estudou comércio exterior, área que ajudou a embasar suas primeiras viagens à China e a lidar com o mercado internacional.

“A gente começou pequeno e sem entender quase nada. Hoje, temos um produto de design nacional, pensado para o público brasileiro, e uma operação que gira muito caixa”, diz.

Quais são os desafios do setor

O setor moveleiro brasileiro é grande, pulverizado e majoritariamente analógico. A maioria das marcas ainda opera via representantes e lojas físicas.

“Sofá e poltrona, no Brasil, quase nunca têm uma marca forte por trás. A pessoa compra, mas não sabe de quem”, diz Frizon. Foi justamente esse espaço de marca e posicionamento que ele quis ocupar.

Hoje, 90% das vendas da Damie acontecem no seu próprio e-commerce — a damie.com.br. O restante é dividido entre marketplaces onde mantém lojas oficiais, como Amazon e Mercado Livre. O objetivo é ter controle sobre a experiência do cliente, desde a navegação até o pós-venda.

“Construir marca é trabalho diário. A gente responde cliente, ajusta produto, testa novos tecidos, entrega, cuida da garantia, mesmo quando a culpa é da transportadora. Isso é o que gera confiança”, afirma. Segundo ele, fortalecer a marca é hoje a principal pauta da gestão.

Poltronas para gamers, clínicas e home cinema

Com uma base de clientes variada, as poltronas da Damie chegaram a públicos que vão além do esperado. Estão em clínicas de soroterapia, consultórios médicos, salas de cinema particulares e quartos de idosos. “Já teve família que dividiu em três vezes pra dar uma de presente pra mãe”, conta o fundador.

A personalização é uma das chaves do negócio: a empresa oferece opções de tecido, acessórios e configurações diferentes, tudo produzido sob demanda — mas com um diferencial de velocidade: o prazo de produção gira em torno de cinco dias úteis, muito abaixo da média de 30 dias do setor.

Além das poltronas, a Damie vem testando novas frentes.

Recentemente lançou um sofá compacto, pensado para passar em portas estreitas e elevadores, e uma cama de montagem rápida que chega em três partes. “A gente só lança quando está seguro. Fizemos muito teste com influenciadores, ajustes, até ficar redondo”, diz.

Os planos para os próximos anos

Com faturamento de R$ 35 milhões em 2024 e meta de R$ 50 milhões para 2025, a Damie aposta em dois pilares: gestão com base em dados e expansão do portfólio. “Antes, a gente não sabia direito de onde vinham os pedidos. Agora, temos dados claros sobre canais, produtos e resultados”, diz Frizon.

A empresa também planeja uma segunda planta industrial no Nordeste para melhorar o atendimento logístico e o suporte técnico na região, que foi suspenso por limitações de pós-venda. “As poltronas têm componentes eletrônicos. Às vezes queima uma fonte de R$ 100 e custa R$ 200 só o frete. Isso inviabiliza o atendimento remoto”, explica.

Mas o maior desafio, segundo ele, está longe das prateleiras: é o time. “Montar um time forte no interior é difícil. Às vezes, a gente precisa buscar gente de fora. Tô trazendo um profissional de Portugal, outro de Minas Gerais. Achar pessoas boas, com cultura alinhada, leva tempo.”

Sobre captar investimento externo, a resposta é direta: por necessidade de caixa, não. “Mas se for um parceiro estratégico, a gente está sempre aberto. Nosso objetivo é claro: dominar o Brasil nos próximos anos.”

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