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Como esta cafeteria mineira vai abrir primeira loja nos EUA — mesmo com tarifaço de Trump

Com mais de 900 unidades no Brasil, a Cheirin Bão aposta na cultura do café para entrar no mercado americano, mesmo com guerra comercial e incertezas globais

Isabela Rovaroto
Isabela Rovaroto

Repórter de Negócios

Publicado em 6 de maio de 2025 às 15h04.

Última atualização em 6 de maio de 2025 às 15h13.

Abrir uma cafeteria brasileira nos Estados Unidos no meio do tarifaço de Trump parece, no mínimo, contraintuitivo. Mas é exatamente o que a Cheirin Bão, maior rede de cafeterias do Brasil, está prestes a fazer. Enquanto o governo americano aumenta tarifas sobre importados, impactando cadeias globais e criando um clima de incerteza global, a marca mineira prepara sua primeira unidade fora do país, em Boston.

A Cheirin Bão é parte da holding Universal Franchising desde 2016 e se consolidou como a principal rede de cafés especiais do Brasil. Seu crescimento foi calcado em um modelo de franquias com mais de 900 lojas (800 em operação) e forte apelo emocional.

A decisão de entrar nos Estados Unidos agora, segundo os sócios, não foi impulsiva. A empresa estruturou seus processos para operar de forma autogerenciável e replicável.

“Escolher os Estados Unidos como primeiro passo internacional foi uma decisão estratégica: é um mercado exigente, consolidado, com forte cultura de consumo de café e abertura a novas experiências gastronômicas”, afirma Wilton Bezerra, CEO da Cheirin Bão.

O movimento vem acompanhado de uma parceria com o Grupo Zanon e será voltado inicialmente ao público latino e brasileiro. A ideia é adaptar a operação gradualmente ao gosto do consumidor americano.

O plano contempla a abertura de 130 novas unidades no Brasil em 2025 e as primeiras nos EUA, com expectativa de crescimento de 18% no faturamento da rede — que fechou o último ano com faturamento de R$ 400 milhões, alta de 10%.

“Mesmo com os desafios significativos devido à alta nos preços, seguimos resilientes e em constante adaptação. Um dos diferenciais que impulsiona a marca frente ao cenário é seu sistema de produção próprio”, diz Bezerra.

Como surgiu a Cheirin Bão

Eduardo Schroeder e Wilton Bezerra, da Cheirin Bão: rede de franquias vai abrir sua primeira operação nos EUA (Cheirin Bão/Divulgação)

A Cheirin Bão foi criada no final de 2015 e início de 2016 em São Lourenço, cidade mineira localizada na região da Serra da Mantiqueira. O plano inicial era simples: oferecer uma experiência gastronômica com doce de leite, café e pão de queijo. Mas o que começou com uma ideia modesta logo se transformou em um negócio de franquias com presença em todo o Brasil.

Eduardo Schroeder, sócio-fundador da marca, entrou cedo no mundo dos negócios, ajudando a cuidar do comércio de papelaria da família em Teófilo Otoni. Apesar de ter optado por seguir a graduação em Direito, com planos de seguir para o concurso público, um estágio em um escritório especializado em franquias virou o jogo.

Foi ali que Eduardo conheceu Wilton Bezerra, um paulista que começou a empreender por necessidade, vendendo cocada aos 9 anos para ajudar a família. A trajetória de Bezerra inclui passagens por lanchonetes, representação comercial e, finalmente, consultoria estratégica.

Foi durante o trabalho conjunto para um cliente no interior de Minas que surgiu a ideia de empreender juntos. A parceria que começou com muitas conversas e troca de ideias logo se consolidou em um "casamento" que já dura quase 10 anos. Eduardo, já com um restaurante de carnes e cervejas especiais, viu no café especial uma oportunidade para inovar e expandir. O salto para o universo dos cafés veio rapidamente, com o nascimento da Cheirin Bão, uma rede focada em proporcionar momentos únicos com o aroma e o sabor do café.

Como outras redes de franquias, a Cheirin Bão apostou em cafés 100% arábica, grãos conhecidos pela intensidade e diversidade de sabores. Os grãos vêm tanto de fazendas próprias quanto de produtores parceiros, todos localizados na região da Serra da Mantiqueira, uma das áreas mais renomadas na produção de café no Brasil.

Apesar do início promissor, a Cheirin Bão enfrentou desafios financeiros e só conseguiu se consolidar após uma virada estratégica durante a pandemia. Em 2020, com R$ 10 milhões em dívidas, os sócios decidiram não reduzir os gastos, mas acelerar o desenvolvimento da empresa.

Lançaram novos cardápios e mais de 70 produtos, incluindo opções da chamada “cozinha afetiva”, e fortaleceram a relação com fornecedores. A atitude ousada e a aposta na inovação ajudaram a Cheirin Bão a sair da crise e a crescer ainda mais, acelerando sua expansão.

De olho no futuro, apesar do cenário

A aposta nos Estados Unidos vem num dos momentos mais tensos do comércio internacional. O presidente Donald Trump retomou sua política de tarifas como ferramenta de pressão: as taxas sobre produtos chineses passaram de 145%, afetando a dinâmica de preços e a previsibilidade para empresas estrangeiras. Mais de 180 países foram impactados por tarifas americanas entre 10% e 50%.

A Cheirin Bão, no entanto, afirma que esse cenário já foi considerado no plano. “Mais do que um obstáculo, vemos a taxação como parte do processo natural de entrada em um novo mercado e estamos preparados para isso”, diz o CEO, que contratou consultorias para estruturar a operação sob a lógica tributária americana.

A expansão internacional vem acompanhada de reforços na área de branding. O influenciador Tiago Fonseca, com mais de 2 milhões de seguidores, assumiu o cargo de diretor criativo da marca, com a missão de fortalecer o posicionamento digital da rede. Além disso, a empresa aposta em ativações de marca em eventos como a Porsche Cup e o podcast de Joel Jota, com mais de 3 milhões de ouvintes.

Expandir para os Estados Unidos em meio à turbulência comercial é um movimento que exige mais do que otimismo. A Cheirin Bão aposta no controle da cadeia de produção e no modelo de franquia como antídoto contra as incertezas — mas terá que provar que o café com gosto de infância também convence quem nasceu longe de Minas Gerais.

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