Celso Berri, fundador e CEO da Syncker: startup está em busca de estruturar um FIDC
Repórter
Publicado em 4 de setembro de 2025 às 06h15.
Na construção civil, a desconfiança é uma constante. Entre incorporadoras, construtoras, empreiteiros e bancos, a coleta e validação de dados no canteiro de obras ainda são feitas de maneira manual e independente. Cada parte envolvida — seja para liberar pagamentos ou fiscalizar a obra — coleta os próprios dados de maneira isolada, geralmente com o uso de planilhas.
Isso resulta em informações desatualizadas, imprecisas e, muitas vezes, erradas, levando a atrasos e a um fluxo de dinheiro muito mais lento do que a obra realmente exige. Foi para resolver essa dor — a falta de confiança e a dependência de dados manuais — que a Syncker desenvolveu um sistema de Inteligência Artificial Física capaz de validar automaticamente o avanço físico da obra em tempo real.
“Cada um tem a própria visão e ninguém pode confiar no trabalho do outro. Isso faz com que o dinheiro flua devagar e as obras avancem com dados desatualizados”, explica o CEO Celso Berri.
Antes de fundar a Syncker em 2021, Berri teve passagens pela Alpargatas e a Bosch, e já trabalhou em mais de 30 países ao longo da carreira. Um interesse em trazer dados de ambientes físicos ao digital com facilidade, mais o encontro com o sócio Luiz Fernando Duarte, especialista em neurociência e computação, levaram a criação da empresa.
Ao longo dos anos, a dupla morou em diversas capitais para trabalhar, mas decidiram ir para Timbó, em Santa Catarina, uma cidade perto de onde haviam crescido e de aproximadamente 50 mil habitantes, para abrir a Syncker. "Cada um estava num canto, mas aqui é uma cidade bem empreendedora, com custo de vida mais baixo e mais familiar", resume Berri.
A Syncker utiliza uma combinação de simulação 3D, deep learning e um gêmeo digital da obra.
A tecnologia da startup brasileira é treinada com modelos BIM (Building Information Modeling), que contêm todos os detalhes do projeto de construção. É uma espécie de "enciclopédia digital", fornecida pelos clientes da Syncker para que a tecnologia aprenda a sequência lógica da obra.
Com a ajuda de câmeras embarcadas em smartphones, a IA da Syncker enxerga o canteiro, detecta o que foi construído, compara com o planejado e atualiza automaticamente a representação digital da obra. A IA interpreta o que foi feito, o que ainda precisa ser feito e até prevê os próximos passos.
“O dado é automaticamente registrado no sistema, que atualiza o planejamento da obra em tempo real. E, o melhor, isso pode ser feito mesmo sem internet no local, uma grande dificuldade para obras em áreas com infraestrutura de rede limitada”, diz Berri.
A Syncker quer que a tecnologia desenvolvida destrave o fluxo financeiro das construções, como um "gatilho" para automatizar mais e mais a liberação de crédito.
O mercado da construção civil brasileiro gerou R$ 484,2 bilhões em 2023, e, segundo o IBGE, cerca de 40% desse valor é destinado à mão de obra e serviços terceirizados. Isso significa que o potencial de antecipação de crédito na indústria da construção pode variar entre R$ 140 bilhões e R$ 190 bilhões por ano.
Para acelerar a liberação de crédito, a Syncker atualiza o gêmeo digital da obra e registra tudo de forma imutável em blockchain. Assim, a incorporadora reconhece a medição, o crédito se torna elegível e um FIDC ou banco parceiro antecipa o pagamento por meio da cessão do recebível.
A startup também está em conversas com gestoras de fundos de investimento para a estruturação de um FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios).
“Hoje, se a obra avançou, o dinheiro pode — e deve — fluir na mesma velocidade da obra. É isso que estamos permitindo com a nossa tecnologia. Isso resulta em menos risco, menos pressão no caixa dos fornecedores e maior previsibilidade para a gestão da obra”, diz Berri.
A Syncker já está em fase de testes com grandes incorporadoras e construtoras como FG Empreendimentos e Tecnisa, aplicando a tecnologia em quatro obras que somam mais de R$ 3 bilhões em valor geral de vendas (VGV).
“Estamos criando um novo padrão de validação técnica, que vai transformar o setor. O canteiro de obras pode e deve ser digital, confiável e conectado. E estamos preparando nossa plataforma para ser o alicerce disso tudo”, diz Berri.