Negócios

Ela transformou uma academia de bairro em uma rede de R$ 177 milhões que nunca fecha

Para crescer sem perder o controle, a rede aposta na formação de líderes internos e em um modelo híbrido de franquias e cotistas — e agora exporta o formato para América Latina

Priscila Aguiar, CEO da Gaviões: Quando aparece um problema, a gente pensa: como isso seria com 10, 50 ou 100 academias? Essa forma de pensar acelerou muito os nossos processos” (Leandro Fonseca/Exame)

Priscila Aguiar, CEO da Gaviões: Quando aparece um problema, a gente pensa: como isso seria com 10, 50 ou 100 academias? Essa forma de pensar acelerou muito os nossos processos” (Leandro Fonseca/Exame)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 24 de julho de 2025 às 13h51.

Última atualização em 24 de julho de 2025 às 19h00.

O setor de academias quase dobrou de tamanho no Brasil nos últimos cinco anos. Em 2019, eram 30.000 academias registradas. Em 2024, o número chegou a 57.000.

Parte desse avanço vem de uma mudança de mentalidade do consumidor, que passou a enxergar a atividade física como prioridade. Mas outra parte se explica por um crescimento agressivo de redes como a Gaviões, que multiplicou seu tamanho num ritmo raro para o setor.

Criada há 50 anos como uma academia de bairro na zona norte de São Paulo, a Gaviões virou um negócio de 177 milhões de reais por ano, com mais de 150 unidades entre operações ativas e em implantação — e todas funcionando 24 horas por dia, inclusive nas cidades do interior.

Agora, começa a pisar em solo internacional, com três unidades em funcionamento no Paraguai e outras três em construção.

A meta era chegar a 150 unidades até o fim de 2025, mas o número foi atingido com um ano de antecedência. Agora, a rede começa a negociar contratos para chegar à Argentina e aos Estados Unidos. A operação internacional ainda é tímida perto da base nacional, mas já indica um novo estágio no crescimento da empresa.

“Já faz tempo que a gente trabalha com mentalidade de quem tem 100 unidades. Quando aparece um problema, a gente pensa: como isso seria com 10, 50 ou 100 academias? Essa forma de pensar acelerou muito os nossos processos”, afirma Priscila Aguiar, CEO da Gaviões.

O modelo 24h virou assinatura da marca. Mais do que conveniência, virou uma forma de se diferenciar no mercado e reforçar o posicionamento da Gaviões como uma academia com liberdade total para o aluno. Mesmo quem nunca treina de madrugada reconhece valor em saber que pode.

Como uma academia de bairro virou rede 24h

A Gaviões nasceu em um cenário bem diferente do atual. No início dos anos 1970, academias ainda eram raras e musculação era vista como atividade de nicho.

A ideia do negócio surgiu quando o pai de Priscila começou a dar aulas de caratê, ainda em espaços improvisados, com halteres de concreto e barras de ferro. A mãe entrou em seguida, oferecendo aulas de ginástica e dança.

Durante anos, o negócio funcionou em garagens alugadas, com estrutura básica e sem qualquer tecnologia. “Era tudo muito precário. Meu pai dava aula com barra de concreto e minha mãe tocava as aulas de ginástica. Nós, filhos, crescemos dentro da academia”, diz Priscila. A primeira sede própria veio só em 1990, no bairro do Tucuruvi, zona norte de São Paulo.

Foi nessa unidade que Priscila começou a trabalhar como recepcionista e vendedora, ainda adolescente.

“Ali eu descobri meu gosto por vendas. Isso virou base pra tudo o que fiz depois”, afirma.

A formação em educação física veio logo depois, e ela passou a dar aulas na própria academia, ao lado dos pais.

Em 2001, com duas unidades próprias, o pai de Priscila decidiu arriscar um novo formato: uma academia funcionando 24 horas por dia. Na época, nenhuma outra rede oferecia esse tipo de operação.

“Foi um diferencial que deu visibilidade à marca e mudou nossa história”, diz ela.

Desde então, todas as novas unidades passaram a operar sem fechar. O modelo virou um traço identitário da Gaviões — e ajudou a consolidar a percepção de que a marca oferece mais liberdade do que as concorrentes.

Como a Gaviões criou um modelo de expansão próprio

Mesmo com cinco unidades próprias, a família resistia à ideia de franquear a marca. O medo era perder o controle sobre uma empresa construída ao longo de décadas.

“A gente pensava: será que vale colocar nosso nome na mão de terceiros?”, conta Priscila. A virada veio quando entenderam melhor os limites e garantias oferecidos pela lei do franchising.

A primeira unidade modelo de franquia foi aberta em São Miguel, com todas as práticas e padrões operacionais formalizados. O sucesso foi imediato, mas a pandemia chegou antes de completar um ano de operação. Ainda assim, o interesse de franqueados não parou de crescer — e muitos procuraram a rede justamente pela busca de suporte em tempos difíceis.

Foi nesse contexto que surgiu o modelo de sócios-cotistas. A Gaviões passou a construir academias com recursos próprios, assumindo o aluguel e a estrutura inicial, e vendendo cotas de participação de 5% a 10% a investidores locais. “Foi esse modelo que alavancou nosso crescimento”, diz Priscila. “E os primeiros cotistas voltaram a investir depois de verem o resultado.”

Hoje, a expansão acontece de forma híbrida: parte via franqueados tradicionais e parte via cotistas. A flexibilidade ajuda a manter o ritmo acelerado e atrai diferentes perfis de investidores — de quem quer apenas retorno financeiro a quem busca participar da operação.

Segundo a CEO, esse modelo viabilizou a abertura de dezenas de unidades em pouco tempo. Hoje já são mais de 60 academias em funcionamento e cerca de 90 em fase de implantação.

Quais são os desafios no meio do caminho

Um dos maiores desafios de quem escala rápido é manter consistência. No caso da Gaviões, cada unidade tem em média 30 funcionários— entre professores, recepcionistas e vendedores. Para evitar o risco de perder o controle da operação, a empresa apostou em desenvolver lideranças internas em vez de contratar gestores prontos no mercado.

“Muitos dos nossos líderes de unidade começaram como professores ou consultores de vendas”, explica Priscila. “A gente prepara, treina, dá oportunidade, e eles crescem junto com a empresa.” Essa estratégia permite que cada unidade funcione de forma padronizada, mas com autonomia local e engajamento real.

O modelo 24h virou o principal diferencial da Gaviões — e continua sendo adotado mesmo em cidades pequenas do interior, como na Bahia ou no Ceará. Segundo Priscila, a operação na madrugada não é lucrativa isoladamente, mas tem um papel estratégico. “Mesmo que ninguém vá treinar às 3 da manhã, o aluno valoriza saber que pode. Isso influencia na hora da escolha”, afirma.

Outro pilar da proposta da marca é a estrutura. Cada unidade é equipada com um mix de máquinas variadas, sem depender de um único fornecedor. A rede opta por selecionar os melhores equipamentos de diferentes marcas para montar a academia ideal — o que também ajuda a reduzir custos para o franqueado e garante variedade para o aluno.

Os planos de expansão

A expansão internacional da Gaviões começou sem um plano formal. Um investidor paraguaio comprou uma cota em uma unidade no Brasil, gostou do modelo e propôs levar a marca para Ciudad del Este.

O projeto deu certo, e hoje ele já opera três academias no Paraguai — com mais três em construção.

Animados com o desempenho, outros investidores começaram a aparecer. Um franqueado argentino também comprou uma unidade no Brasil e agora prepara o primeiro contrato no país vizinho. As negociações para uma entrada nos Estados Unidos também já começaram, embora ainda sem data confirmada.

Segundo Priscila, esse movimento só foi possível porque a empresa se antecipou. “Registramos a marca em vários países mesmo sem saber quando ou onde iríamos entrar. Fizemos isso como preparação, e agora as oportunidades começaram a surgir.”

A meta é terminar 2025 com sete unidades em funcionamento no Paraguai e avançar nas negociações em outros países da América Latina. A Gaviões vê o modelo como exportável, já que une marca forte, operação simples e proposta de valor clara.

Embora ainda represente uma fatia pequena da operação, a expansão internacional mostra que o negócio familiar que começou em Guarulhos agora testa seus limites fora do Brasil.

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