Rodrigo Gedankien e Fabiana Tchalian, da Água na Caixa: “Desde o início a gente dizia: somos água na caixa, não água na lata. Mas não teve jeito. Tentamos alumínio, caixinha com menos gás, nada funcionava. A lata foi o caminho mais viável” (Gabriel Reis/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 25 de junho de 2025 às 17h19.
Última atualização em 25 de junho de 2025 às 19h22.
A economista paulista Fabiana Tchalian não esconde o riso ao lembrar dos primeiros passos como empreendedora. Vinda de uma carreira em empresas como P&G e Amazon, achou que empreender com água mineral seria fácil.
“Eu pensei: já fiz tanta coisa difícil na P&G, por água numa caixa deve ser supersimples”, afirma. Hoje, brinca com o sócio Rodrigo Gedankien: “A ignorância nos protegeu. Se eu soubesse como era difícil, talvez nem tivesse começado”.
Fundada em 2021, a Água na Caixa virou um hit nos empórios e cafeterias de São Paulo e conquistou espaço em hotéis de alto padrão pelo país, oferecendo um produto inusitado: água mineral em caixinhas de papel, como leite longa vida.
Minimalista no design e maximalista no discurso ambiental, a marca cresceu com apelo sustentável e visual, e virou referência no consumo consciente fora de casa.
Agora, os fundadores querem sair do nicho premium e transformar a marca em referência nacional em hidratação. A empresa anunciou três novos produtos — água com gás, água com eletrólitos em pó e a “Caixona” de 8 litros — e projeta dobrar o faturamento em 2025, para R$ 40 milhões.
Um investimento de R$ 3 milhões marca essa virada estratégica.
“Nosso objetivo agora é mostrar que a Água na Caixa não é só a caixinha. Somos uma marca de hidratação", afirma Tchalian.
O plano é ambicioso: crescer para além dos hotéis e restaurantes, conquistar espaço em gôndolas de supermercados e entrar pela primeira vez no e-commerce direto ao consumidor.
Desde o primeiro dia da empresa, Tchalian ouvia a mesma pergunta: “Vocês têm água com gás?”.
A resposta era sempre não. O papel das caixinhas não suporta a pressão do gás. A solução veio depois de quatro anos de tentativas: lançar a Água na Caixa com gás… em lata.
“Desde o início a gente dizia: somos água na caixa, não água na lata. Mas não teve jeito. Tentamos alumínio, caixinha com menos gás, nada funcionava. A lata foi o caminho mais viável”, diz.
A estratégia foi fazer uma lata com o mesmo design da caixinha. A ideia é que, de longe, nem dê para diferenciar qual é caixa e qual é lata.
A segunda novidade é a Água na Caixona, com 8 litros, voltada para o uso doméstico e corporativo. É uma tentativa direta de substituir os galões de plástico.
“Ela tem um terço do plástico de um galão comum e uma experiência muito melhor. A torneirinha é fácil, até criança consegue se servir”, afirma Tchalian. “Pela primeira vez, conseguimos competir em preço com o produto convencional e entregar uma experiência superior”.
Nesse caso, a tecnologia é a mesma usada nas caixas de papelão de vinho, que já vem com uma torneira embutida.
A terceira frente é a entrada no mercado de hidratação funcional, com o lançamento do Mais Eletrólitos, um sachê em pó com fórmula com base nas diretrizes da OMS.
“É o soro caseiro com sabor. Ele tem dez vezes mais eletrólitos e um décimo do açúcar de isotônicos tradicionais. Queremos ser mais que um isotônico”, diz.
A ideia surgiu durante uma viagem aos Estados Unidos, em 2016. Fabiana Tchalian, então executiva da P&G, acompanhava o irmão mais novo em visitas a universidades quando viu pela primeira vez uma água mineral envasada em uma caixinha parecida com embalagem de leite.
“Pedi uma água, e quando entregaram pensei que tinham me dado leite. Era uma caixinha minimalista, preta e branca, com o nome Boxed Water. Aquilo me ganhou pelo visual na hora”, lembra.
Ela levou a embalagem para o Brasil e mandou uma foto para o primo Rodrigo Gedankien, seu futuro sócio. A ideia parecia simples demais para dar errado. “Falei: já fiz tanta coisa difícil em multinacional, colocar água numa caixa vai ser fácil. Mas foi aí que a gente viu o tamanho da encrenca”, afirma.
A dificuldade veio logo no início. Nenhum fabricante no Brasil queria se arriscar a produzir água mineral em caixinha. E, pior: para vender como água mineral, era preciso ter a Lavra, o direito legal de explorar uma fonte.
Sem alternativa, a dupla decidiu importar água envasada da Patagônia. “Era um MVP mesmo. Mas testamos o mercado”, afirma. Batizaram o produto de Água na Caixa — mesmo sem esse nome no rótulo — e conseguiram vender para três clientes estratégicos: Casa Santa Luzia, Adidas Eventos e o Otávio Café, em São Paulo.
Cada um comprou por um motivo diferente. “A Santa Luzia comprou por inovação, o Otávio Café pela experiência, e a Adidas pela sustentabilidade. Foi aí que a gente entendeu quais seriam nossos três pilares”, afirma.
A virada veio com o fechamento de um contrato com a Tetra Pak, que permitiu começar a produção no Brasil. A empresa fez uma primeira rodada de captação com 13 investidores — em formato de friends & family — e levantou R$ 3 milhões para tirar o projeto do papel. Mais tarde, entrou um fundo ligado a Gilberto Zancopé, investidor também da Coffee++ e La Guapa.
“Era um projeto de um SKU só. Vendíamos basicamente um produto: água em caixinha de 500 ml ou 330 ml. Mas a proposta era maior: entregar inovação, experiência e sustentabilidade por meio de uma água”, diz.
A expansão coloca a Água na Caixa em uma encruzilhada. Até agora, o modelo de negócio se sustentava com preços altos, margens mais apertadas e um público disposto a pagar mais por propósito e design. Escalar sem diluir o posicionamento e enfrentando concorrentes com custos muito menores é o maior desafio da empresa.
“Eu tenho de explicar por que o cliente paga R$ 1 na garrafinha e R$ 3,50 na nossa caixinha. É muita história para contar. Escalar exige resiliência”, afirma Tchalian. “A embalagem é o maior custo. A tampa feita com plástico verde é muito mais cara. Mesmo com escala, a gente nunca vai competir com a garrafinha.”
Nos primeiros anos, a empresa enfrentou até a barreira de linguagem visual: era a primeira vez que uma água seria vendida no Brasil em embalagem opaca. “Imagina lançar uma água que a pessoa nem vê. Se além disso eu não pudesse chamar de água mineral, não dava. Por isso insistimos tanto em encontrar uma fonte com Lavra desde o começo”, diz.
O produto original ainda cresce mês a mês, mas é limitado.
Hoje, a Água na Caixa entrega em todos os estados do Brasil, principalmente graças ao mercado hoteleiro.
A nova fase da empresa inclui a entrada no varejo com a Caixona e a estreia no e-commerce com os eletrólitos. Pela primeira vez, a marca venderá diretamente ao consumidor final.
A meta de atingir R$ 40 milhões em faturamento em 2025 depende diretamente do sucesso desses três lançamentos. E a ambição não para por aí. A marca já estuda novos produtos: água com colágeno, com proteína, saborizada ou com gás e eletrólitos ao mesmo tempo.
“O que a gente quer é ser referência em hidratação. Quando alguém pensar em hidratação no Brasil, queremos que pense primeiro em Água na Caixa”, afirma Tchalian.
Na prática, o crescimento fora do eixo “premium” é o grande teste. Até agora, a marca vendeu bem em hotéis, cafeterias, eventos e empórios onde o público valoriza sustentabilidade e design. Levar esse posicionamento para o varejo de massa exige mais do que qualidade — exige mudar a percepção de valor sobre o mais essencial dos produtos: a água.