Fórum NE: encontro da EXAME e Banco do Nordeste debateu o futuro econômico da região com líderes e especialistas (Eduardo Frazão/Exame)
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Publicado em 18 de setembro de 2025 às 15h12.
Com um PIB de R$ 1,5 trilhão (quase o mesmo do Chile) e 57 milhões de habitantes, o Nordeste busca deixar para trás a imagem de região dependente, e passa a exercer um papel cada vez mais fundamental para o desenvolvimento brasileiro. Nos últimos 20 anos, a região ampliou a participação no ensino superior, ganhou força no turismo, tornou-se exportadora de energia limpa e passou a disputar espaço no agro nacional.
Esse movimento foi destaque durante o Fórum NE, realizado pela EXAME em parceria com o Banco do Nordeste, em São Paulo. O encontro reuniu lideranças políticas, econômicas e acadêmicas para debater crédito, transição energética e agroindustrialização — pilares para transformar vocações históricas em vantagens competitivas.
“Estamos falando de uma economia cada vez mais dinâmica, que cria oportunidades e atrai investimentos. O Nordeste tem um papel central nesse cenário, com avanços em setores como energia limpa, indústria, exportação e tecnologia”, disse Lucas Amorim, diretor de redação da EXAME, na abertura.
O primeiro painel, mediado por Luciano Pádua, editor de Macroeconomia da EXAME, contou com a participação de Paulo Câmara, presidente do Banco do Nordeste, o vice-governador da Paraíba, Lucas Ribeiro, e Aristides Monteiro, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Câmara destacou o papel estratégico da instituição para sustentar a expansão econômica regional. Segundo ele, o banco pretende liberar até R$ 70 bilhões em crédito em 2025.
“Há realmente uma janela de oportunidades. Quem investe e quer investir no Brasil precisa olhar para o Nordeste, porque vai encontrar oportunidades fiscais, melhoria de infraestrutura, e mão de obra de qualidade”, disse. “Nos últimos dois anos, crescemos 40% no financiamento de contratações e, em determinados setores, mais que dobramos os investimentos”, afirmou.
Ribeiro reforçou o dinamismo vivido pelo estado, que hoje atrai redes internacionais de resorts, parques aquáticos e registrou alta de 40% no fluxo de passageiros. Ele associou esse avanço à solidez das contas públicas.
“O que foi feito na Paraíba foi uma gestão fiscal eficiente e isso nos permite executar obras com recursos próprios.”
Já o pesquisador do Ipea chamou a atenção para a dimensão econômica regional. Além da riqueza produzida, o Nordeste abriga três grandes metrópoles (Recife, Salvador e Fortaleza) além de outras seis capitais com mais de 1 milhão de habitantes.
Outro ponto destacado foi a formação de capital humano: a participação do Nordeste nas matrículas de ensino superior subiu de 15% para 21% em duas décadas. “Nós precisamos sair daqui afirmando que o Nordeste é um lugar de soluções hoje”, disse Monteiro.
Com moderação de Lia Rizzo, editora de ESG da EXAME, o segundo painel reforçou o protagonismo da região na agenda de energia limpa. Francisco Silva, da Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias (ABEEólica), lembrou que a energia eólica nordestina já representa 16% da matriz nacional, com 35 GW de capacidade instalada. Mas fez um alerta sobre gargalos na infraestrutura de transmissão.
“Hoje, temos energia eólica e solar sobrando, mas muitas vezes não conseguimos escoar por falta de linhas de transmissão. Precisamos dar previsibilidade para garantir os investimentos.”
Para Sávia Gavazza, presidente do Conselho de Administração do Banco do Nordeste e assessora da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, a energia não deve ser tratada apenas como insumo a ser exportado para outras regiões, mas como vetor de industrialização local.
“Não se trata só de gerar energia e mandar para o Sudeste, mas de usar essa energia para desenvolver o próprio Nordeste, com hidrogênio verde, aço sustentável, data centers e inovação industrial.”
Ela também ressaltou a importância da reforma tributária para destravar investimentos. “O Brasil tem o segundo sistema tributário mais complexo do mundo. A reforma elimina distorções e cria segurança jurídica para investidores.”
Na mesma linha, Luiz Alberto Esteves, da CAF, destacou que a transição só se consolidará com políticas sociais inclusivas. “Não existe desenvolvimento econômico sem desenvolvimento social. É preciso investir em gente, em saneamento, em educação, em infraestrutura de base.”
Em seguida, o evento mostrou como a região também ganha espaço no agronegócio. Luiz Sérgio Machado, superintendente do Banco do Nordeste, lembrou que o Matopiba (região formada pelos estados Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) já soma 30 milhões de toneladas de grãos em 15 milhões de hectares. O desafio, segundo ele, é avançar na industrialização da produção.
“O objetivo é manter valor agregado na região, migrando da soja para farelo, carnes e derivados.”
Com mediação do jornalista César Rezende, o debate também abordou o potencial de novas cadeias. Bruno Vanderlei, da Datagro, destacou a força dos biocombustíveis.
“O Norte-Nordeste pode reduzir em 50% a importação de etanol e biodiesel e tornar-se exportador. O nordestino é, antes de tudo, um forte.”
A logística aparece como elo essencial desse processo. Luciana Ferreira, gerente de Negócios e Planejamento da Empresa Maranhense de Administração Portuária (Emap), ressaltou que o Porto do Itaqui, no Maranhão, se consolidou como corredor de exportação. “Estamos expandindo a malha ferroviária e construindo o décimo berço para consolidar o Arco Norte.”
Já Marco Aurélio Bonfim, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), lembrou que o desenvolvimento não se resume aos grãos. A bioeconomia e a agricultura familiar ganham protagonismo.
“O Porto do Itaqui já ultrapassou Paranaguá em exportações de soja. É uma revolução silenciosa, mas muito consistente”, diz. “Temos de valorizar o caju, o babaçu, o bacuri. É bioeconomia, inovação social e agregação de valor no campo.”
O encontro reforçou a visão de que o Nordeste não é mais apenas promessa, mas ator estratégico no futuro do Brasil.