Negócios

O que aprender com o sistema capitalista híbrido chinês

Acabei de passar dez dias na China em uma imersão para negócios. Foi uma aula viva de como pensamento estratégico e disciplina transformam uma nação

Xangai: A China que eu vi não é a caricatura que o Ocidente projeta, é um país que equilibra tradição, disciplina e futuro (Leandro Fonseca/Exame)

Xangai: A China que eu vi não é a caricatura que o Ocidente projeta, é um país que equilibra tradição, disciplina e futuro (Leandro Fonseca/Exame)

João Kepler
João Kepler

CEO Equity Fund Group e colaborador

Publicado em 5 de novembro de 2025 às 20h36.

Tudo sobreChina
Saiba mais

Acabei de passar dez dias na China em uma imersão para negócios. Fiquei impressionado positivamente. Foi uma aula viva de como pensamento estratégico e disciplina transformam uma nação.

O que vi foi propósito coletivo ligado a execução consistente. A disciplina não nasce do medo. Ela nasce de uma cultura que entende que progresso é fruto de constância e método, não de improviso.

Por isso, te convido a ler este texto até o fim. A intenção não é defender, comparar ou idealizar, e sim propor uma nova lente.

Uma forma de enxergar a China além dos rótulos, compreendendo as engrenagens de disciplina, estratégia e coerência que sustentam um dos modelos mais instigantes do mundo atual.

O que mais me impactou foi a forma como a China une o planejamento de longo prazo, representado pelo Plano Quinquenal, com princípios culturais profundos como o Benfen, somados às diretrizes dos 24 caracteres que sustentam sua política moderna.

Essa convergência entre visão e ação cria eficiência que ultrapassa a ideia de produtividade.

Assim como uma empresa, uma nação também precisa de propósito para crescer com sustentabilidade.

O ponto que mais ficou marcado foi a estratégia silenciosa de planejar com profundidade, executar com consistência e só tornar público depois de validar. Uma lição de maturidade estratégica com menos discurso e mais entrega.

Em minha opinião, a China opera sob um sistema híbrido. Um socialismo de base combinado com uma eficiência que se aproxima do capitalismo.

O que torna o modelo admirável é a coerência entre o que se fala e o que se faz, a disciplina coletiva e a capacidade de preservar o propósito comum mesmo em ambiente competitivo.

O Estado participa das decisões estratégicas, mas aparentemente o faz como coordenador, não como opressor.

Ele estabelece o perímetro, define as regras e garante previsibilidade e, dentro dessas fronteiras, a inovação corre solta com velocidade e consistência.

Antes, eu imaginava uma China sombria, poluída, barulhenta, superlotada, repleta de falsificações e marcada por jornadas exaustivas de trabalho. Mas, vendo de perto, encontrei outra realidade.

Um país limpo, seguro, organizado e tecnologicamente avançado, onde praticamente não se vê extrema pobreza, fome ou desemprego porque existem oportunidades reais de trabalho e desenvolvimento.

Sim, ainda há as famosas "Original Copy", mas também há as grandes grifes originais, todas as marcas internacionais, avenidas impecáveis, shoppings modernos e um ritmo de inovação impressionante.

A China que eu vi não é a caricatura que o Ocidente projeta, é um país que equilibra tradição, disciplina e futuro com precisão.

O resultado é um ambiente disciplinado, eficiente e estável, onde empresas prosperam sabendo exatamente até onde podem ir.

Essa harmonia entre público e privado talvez seja o maior diferencial do sistema chinês um modelo que mostra que controle e liberdade, quando bem equilibrados, geram crescimento com propósito.

Durante a viagem publiquei vídeos e dividi o que aprendi olhando de dentro. De fora, meu olhar era ocidental e carimbado por rótulos. Vieram dúvidas e críticas. Respondo direto aqui abaixo:

Controle do Governo

Existe controle rígido, mas eu percebo que ele opera como um range. Há paredes de um lado e de outro, e liberdade dentro do perímetro.

É controle organizacional e estratégico para administrar mais de um bilhão de pessoas. O Estado planeja com visão de décadas. A sociedade aceita porque enxerga resultados.

Não é o liberalismo ocidental. Não sei se pode chamar até de capitalismo com características chinesas. Muitas empresas têm conselheiros alinhados ao interesse público.

O Estado atua menos como controlador e mais como coordenador de um sistema.

Igrejas e religião

A liberdade religiosa existe com registro e licença. Igrejas e Cultos funcionam, inclusive evangélicos, católicos e muçulmanos. Transmissões on-line e atividades públicas seguem regras.

Quem opera fora do sistema enfrenta a lei local. Para o olhar ocidental, casos como o da igreja Zion Church é uam repressão.

Para o sistema interno, eles afirmam que é cumprimento de regras. Há liberdade de culto até um ponto, regulada pelo Estado.

Escravidão e trabalho forçado

O debate real é sobre escravidão moderna. Relatórios internacionais apontam problemas em Xinjiang.

O governo responde com a narrativa de capacitação, transferência de trabalhadores e substituição de penas. O mundo vê violação de direitos.

A China vê tema de soberania. A verdade mora nos detalhes. Em fábricas que visitei, operadores ganhavam acima de cinco mil reais por mês.

Há jornadas longas em alguns setores, mas legislação e padrões de saúde e ambiente avançam.

Qualidade e cópias

A China aprendeu observando e evoluiu construindo. Saiu do rótulo de cópia barata para laboratório de tecnologia, design e IA aplicada ao cotidiano.

Vi carros, satélites, robôs, hardware de ponta e cidades muito bem organizadas. Já não é só preço baixo. É inovação com escala.

Regime político

O sistema híbrido combina Estado forte, mercado de alta tecnologia e planejamento central. As regras implícitas são diferentes do Ocidente. A ênfase está em eficácia social, tecnologia e comunidade.

Liberdade sem disciplina gera dispersão. Disciplina sem propósito vira repressão. O modelo chinês tenta fazer essas forças coexistirem, com contradições, mas com direção.

Nada disso significa que o Brasil precise copiar a China.

Não é sobre decidir se é melhor morar lá ou aqui, se é de esquerda ou de direita, se meu texto favorece ao partido A, B ou C, ou se os Estados Unidos são melhores ou piores.

Significa ampliar repertório e questionar rótulos antigos. Independente do seu viés atual, vá ver de perto e depois me diga se concorda comigo.

Essa viagem foi mais que um roteiro. Foi uma aula de liderança, visão e consciência empresarial.

Voltamos impactados, com ideias novas e, mais importante, com perguntas melhores e é isso que move o crescimento.

Pense Nisso!

Acompanhe tudo sobre:China

Mais de Negócios

Empresa do agro cresce 16% e aposta em IA e franquias para escalar

Heineken inaugura fábrica de R$ 2,5 bi em MG e dobra aposta no puro malte

Como ele poupou R$ 200 milhões na conta de luz dos clientes em 5 anos

Briga judicial histórica de 17 anos entre empresa e ex-funcionário chega ao fim