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Os planos da bilionária empresa por trás dos shows à luz de velas para dobrar de tamanho no Brasil

Com mais de 500 mil ingressos vendidos no Brasil, empresa acelera sua expansão e mira experiências imersivas fora do eixo Rio-São Paulo

Concerto do Candelight: espetáculo da Fever já vendeu 500.000 ingressos (Fever/Divulgação)

Concerto do Candelight: espetáculo da Fever já vendeu 500.000 ingressos (Fever/Divulgação)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 23 de setembro de 2025 às 11h33.

No centro de São Paulo, as luzes do teatro vão se apagando aos poucos enquanto o palco se enche de luzes de velas — de LED.

No setlist, Coldplay, Queen e Taylor Swift — tudo em versão instrumental, executada por músicos clássicos.

No fundo, ninguém sabe exatamente o que esperar, mas todo mundo quer filmar. Assim são os Candlelight Concerts, os shows à luz de velas que viralizaram nas redes e já venderam mais de 500.000 ingressos no Brasil. A responsável por esse formato? A Fever, uma plataforma global de experiências ao vivo avaliada em mais de 1,8 bilhão de dólares.

Fundada na Espanha em 2014, a empresa chegou ao Brasil em 2020 — bem no início da pandemia.

A estreia oficial seria com um projeto imersivo baseado em La Casa de Papel, da Netflix, no Banespão (O Farol Santander), em São Paulo.

A data? 15 de março de 2020. Bem (mas bem, mesmo) no início da pandemia.

“A gente tinha tudo pronto quando o mundo parou”, diz Rafael Foresto Machado, general manager da Fever no Brasil. “A pandemia adiou o projeto, mas também abriu espaço para lançar o Candlelight, que virou o nosso maior acerto.”

A aposta deu certo.

Em 2024, a operação brasileira dobrou de tamanho e já coloca o país entre os cinco principais mercados da empresa no mundo — ao lado de Estados Unidos, Reino Unido, França e Espanha.

O plano agora é dobrar novamente em 2025, ampliando o portfólio de eventos próprios e reforçando parcerias com grandes produtores e marcas. A empresa não divulga faturamento.

“Nosso maior trabalho é mostrar valor em um mercado que costuma se concentrar só em preço”, afirma Machado. “A Fever entrega mais do que ingressos. A gente traz tecnologia, curadoria e uma jornada de descoberta que começa muito antes da compra.”

Para 2025, a empresa escala tanto os grandes projetos, como experiências imersivas em parceria com gigantes como Warner e Disney, quanto os chamados “pockets” — formatos menores, pensados para rodar cidades do interior.

Também há planos para eventos com realidade virtual e experiências sensoriais. “A gente quer estar em mais lugares e com mais formatos”, diz Machado. “Seja na Avenida Paulista ou no interior do Mato Grosso.”

Qual é a história da Fever

Criada por três empreendedores espanhóis, a Fever nasceu com a ambição de ser o “Netflix das experiências presenciais”.

Por trás da operação estão Ignacio Bachiller Ströhlein, Alexandre Perez Casares e Francisco Hein. Os três se juntaram em Madri depois de passarem por experiências no setor de tecnologia e pelo mercado financeiro.

O modelo une dados, curadoria e marketing digital para conectar produtores e consumidores.

A empresa atua como plataforma de venda de ingressos, mas também como produtora de eventos — função que ganhou força nos últimos anos com o selo Fever Originals, que inclui o próprio Candlelight, experiências com Harry Potter, Hot Wheels, Titanic e exposições imersivas.

“A gente faz de tudo: vende, divulga, coleta dados e até desenvolve os projetos. É uma plataforma tecnológica com alma de produtora”, diz Machado. “A diferença está na jornada. A pessoa não está só comprando um ingresso, ela é impactada, convencida e guiada até o evento por um funil de dados e conteúdo.”

Além da venda de ingressos, a Fever monetiza via mídia digital, parcerias com marcas e produção de experiências próprias.

O braço editorial da empresa — que inclui os canais São Paulo Secreto e Rio de Janeiro Secreto — serve tanto para distribuir eventos como para mapear tendências de consumo cultural nas cidades.

“É ali que a gente entende o que está quente, o que pode virar experiência, o que ainda falta no mercado”, diz. “Tem equipe local em cada cidade, gente nativa mesmo, que conhece a cena e sabe onde vale apostar.”

Como é o modelo de negócio

A Fever opera com dois modelos principais de receita: comissão sobre a venda de ingressos de terceiros (como uma "etiqueteira premium") e participação direta nos lucros (ou prejuízos) de eventos próprios.

Nos eventos originais, a empresa atua como sócia, investidora e produtora — e em alguns casos, também capta patrocínio ou usa leis de incentivo.

“Nós ganhamos junto com o sucesso do parceiro. Se o evento vai bem, a gente ganha mais. Se vai mal, a gente sente também”, diz Machado. “É diferente das plataformas que só cobram uma taxa por venda.”

No Brasil, a empresa tem buscado projetos com apelo popular e potencial de escalabilidade.

Um exemplo é o Titanic, experiência imersiva desenvolvida na Europa e trazida ao Brasil em parceria com um produtor que já havia feito os eventos de Van Gogh com a Fever em 2020.

“Foi uma sociedade que começou num momento muito incerto, mas que cresceu com base em confiança e execução”, diz Machado. “Quando o Titanic ficou pronto, já estava claro que o Brasil seria um dos mercados principais.”

Quais são os planos de expansão no Brasil

Em 2022, a operação da Fever começou a ganhar tração real, com abertura de escritório e montagem de equipe local.

Hoje, a empresa atua em 41 cidades brasileiras — e tem capacidade de lançar um Candlelight em locais como Sinop, no Mato Grosso, em menos de uma semana.

“Criamos um processo muito otimizado. Sabemos como contratar músicos, produzir eventos, montar a cenografia. Isso permite escalar rápido, com qualidade e baixo custo operacional”, afirma o executivo.

Segundo ele, o Brasil hoje está entre o top 5 global da Fever em receita e volume de eventos — e já aparece entre o terceiro e o quarto lugar em número de público impactado.

A operação brasileira dobrou de tamanho em 2024, e a meta é repetir o feito em 2025.

“A gente tem volume, tem diversidade de público e uma demanda gigante por experiências diferentes. Mesmo com o real desvalorizado, o número de pessoas compensa.”

A estratégia inclui tanto os grandes eventos, feitos com estúdios como Warner e Disney, quanto os formatos menores e mais escaláveis. “Queremos descentralizar. Não é só Rio e São Paulo. A gente está indo para Ribeirão Preto, Goiânia, Curitiba, e cidades onde ninguém espera um evento imersivo, mas onde a resposta do público é enorme.”

Quais são os desafios no meio do caminho

Com o sucesso do Candlelight, surgiram cópias.

“Vimos muitos produtores imitando o conceito, até com nomes parecidos. Mas eu vejo como uma homenagem. Quem tenta copiar mostra que o modelo funciona”, diz Machado. “A diferença está na execução. A qualidade da nossa entrega é muito superior. A gente já fez até com Gilberto Gil, Chico César, AnaVitória, fora os artistas internacionais.”

Outro desafio é o mercado secundário, como os casos de cambismo e revenda não autorizada.

“É um problema global. A gente usa tecnologia para mitigar isso: ingressos dinâmicos, QR codes que se atualizam e ferramentas de fila virtual”, afirma.

A Fever também atua em projetos com grande volume de acessos, como a Bienal do Livro.

“Na última edição, a gente usou o mesmo sistema de fila da final da Champions League para organizar o acesso aos autógrafos do Felipe Neto.”

O setor de eventos também enfrenta desafios estruturais no Brasil: leis desatualizadas, escassez de espaços e insegurança regulatória.

“A gente já viu de tudo nesses cinco anos. Mas isso também cria uma vantagem: a operação aqui é mais complexa, então quando dá certo, vira modelo para outros países.”

O que vem por aí

Depois de captar mais de 100 milhões de dólares em junho de 2025 — num aporte liderado pelos fundos L Catterton e Point72, dono do New York Mets —, a Fever acelerou sua presença global.

A startup opera em mais de 40 países e já atingiu cerca de 200 milhões de usuários cadastrados. A receita baseada em propriedades intelectuais cresceu 45% em 2024, e o ano fechou com EBITDA positivo.

Para o Brasil, a meta agora é trazer grandes marcas internacionais, desenvolver hubs de realidade virtual e explorar novos temas imersivos — de mitologia à neurociência.

“Estamos olhando para formatos que ainda não existem por aqui”, diz Machado. “Queremos experiências que ativem todos os sentidos, que tenham escala, mas que também funcionem em espaços menores.”

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