Negócios

Startup investe R$ 100 milhões comprando empresas para acabar com o susto de uma cirurgia cancelada

A startup mira R$ 150 milhões em receita com tecnologia para integrar toda a jornada do paciente, do pré ao pós-operatório

Márcio Alves, da Galileu: “Nossa missão é fazer com que o paciente seja o CEO da própria saúde” (Galileu/Divulgação)

Márcio Alves, da Galileu: “Nossa missão é fazer com que o paciente seja o CEO da própria saúde” (Galileu/Divulgação)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 20 de junho de 2025 às 08h33.

Última atualização em 20 de junho de 2025 às 08h38.

Mais de 50.000 cirurgias são canceladas por ano no Brasil por falta de organização.

Exames que não chegaram, paciente que não entendeu a preparação, troca de plantão mal comunicada. A maioria desses cancelamentos acontece no dia da cirurgia, em cima da hora. No setor público, isso significa fila represada. No privado, prejuízo operacional.

Esse é o problema que a Galileu Saúde quer resolver. Fundada em 2021, a healthtech paulista é uma plataforma para hospitais e operadoras de saúde conseguirem fazer a gestão de custos, equipamentos e da jornada do paciente, de maneira digital.

Agora, acaba de acaba de anunciar sua quarta aquisição em menos de um ano: a Teller Saúde, especializada na gestão da etapa cirúrgica, do agendamento à alta.

Com ela, a startup fecha o que considera a última etapa para integrar completamente a jornada do paciente. E projeta dobrar o faturamento, alcançando 150 milhões de reais.

A compra da Teller também permite mais um passo da Galileu na estratégia de crescimento por consolidação. Em menos de 12 meses, a Galileu investiu mais de 100 milhões de reais na aquisição de quatro empresas: Neomed (de cuidado cardiovascular), Valor e Saúde (de gestão de recursos de saúde), Lincon Health (de monitoramento remoto de pacientes) e agora a Teller (de acompanhamento na cirurgia).

Todas com propostas complementares, voltadas a digitalizar partes específicas da gestão de saúde pública e privada.

“Nós não estamos comprando receita, estamos comprando capacidades. Cada aquisição trouxe canais diferentes, dados e tecnologia. Agora, com a Teller, conseguimos atuar dentro do hospital, organizando o coração do problema: a cirurgia”, diz o CEO da Galileu, Márcio Alves.

A meta agora é acompanhar 80.000 cirurgias por ano até 2027, oferecendo uma plataforma que conecta todas as pontas do processo: paciente, médicos, hospital e operadora. Segundo Alves, o cancelamento cirúrgico por falha de comunicação é “um sintoma da fragmentação do sistema de saúde brasileiro”.

Qual é a história da Galileu

A ideia da Galileu surgiu em 2019, quando Márcio Alves deixou a Amil, operadora privada na qual havia liderado projetos de digitalização de pronto-socorro e uso de telemedicina desde 2012.

Com mais de 28 anos de experiência como médico, ele viu no setor público uma oportunidade de levar a inovação que já havia funcionado no privado.

“Quando fomos olhar para o SUS, vimos um abismo entre a entrega dos grandes hospitais de São Paulo e a das unidades públicas. Criamos um sistema que começava com diagnóstico automatizado via inteligência artificial e entregava orientações clínicas personalizadas”, diz.

Esse primeiro modelo foi sendo ajustado e expandido. Em 2021, nasceu oficialmente a Galileu. Um ano depois, foi lançada a plataforma que se tornaria o produto central da empresa, usada hoje por hospitais, operadoras e empresas com grandes volumes de vidas sob gestão.

Desde o início, a proposta da startup foi atuar como um orquestrador do sistema de saúde. Em outras palavras, uma única plataforma em que hospitais e operadoras de saúde podem fazer gestão dos pacientes e da própria estrutura hospital. Por ali, é possível unificar dados, fazer análises preditivias e focar a gestão de saúde num modelo mais preditivo e menos reativo.

O sistema acompanha o paciente desde o atendimento básico até o pós-operatório e o cuidado de rotina, com apoio de inteligência artificial e automação.

“Nossa missão é fazer com que o paciente seja o CEO da própria saúde”, afirma Alves.

O modelo da empresa permite ser contratado por diferentes perfis de cliente: hospitais, operadoras de planos, empresas de saúde laboral e até entes públicos.

O que significa a nova aquisição

A Teller Saúde, nova aquisição da Galileu, atua diretamente na etapa mais crítica do sistema: a internação.

A empresa organiza a agenda cirúrgica, conecta os plantões médicos e automatiza etapas da preparação pré-operatória. Segundo a Galileu, é justamente aí que os erros mais comuns acontecem.

Com a Teller, a plataforma da Galileu agora acompanha o paciente desde o primeiro exame até o 365º dia após a alta hospitalar. O objetivo é garantir que nenhuma etapa do processo fique solta, reduzindo erros e cancelamentos. “Com a Teller, a gente completa o ciclo da jornada. Agora temos tecnologia para atuar do exame ao centro cirúrgico, da admissão à reabilitação”, diz Alves.

Esse movimento também explica o salto na projeção de faturamento. No ano passado, a empresa faturou cerca de 75 milhões de reais. Com a entrada no hospital, a estimativa é dobrar esse número e chegar aos 150 milhões de reais.

A aposta da Galileu é que o setor hospitalar está diante de uma inflexão. Os custos aumentam com a adoção de novas tecnologias, como imunoterápicos e procedimentos de alta complexidade. Mas a eficiência operacional continua estagnada. “A saúde está atrasada digitalmente. Ainda opera com fax e papel. A gente quer mudar isso com dados, integração e automação”, afirma o CEO.

Segundo ele, só é possível escalar esse tipo de solução via consolidação. Daí o investimento de 100 milhões de reais nas últimas quatro aquisições. O plano é continuar comprando empresas que complementem o ecossistema e entreguem valor por meio de inteligência de dados.

O Brasil como epicentro das healthtechs

A aposta da Galileu acontece em um momento de consolidação do Brasil como principal polo de healthtechs da América Latina.

Segundo dados da consultoria Distrito, 64,8% das startups de saúde da região estão no Brasil — um número muito acima de México e Argentina, o segundo  e terceiro país, respectivamente.

Esse protagonismo é resultado de um conjunto de fatores. De um lado, o SUS cria uma demanda estrutural por eficiência, escala e coordenação de atendimento. De outro, o setor privado pressiona por competitividade e redução de custos.

Além disso, a análise da Distrito é que o Brasil conta com um ambiente regulatório mais evoluído para soluções digitais na saúde e um histórico recente de parcerias público-privadas que permitem testar novas abordagens com impacto real. A digitalização de processos, o uso de dados e a gestão preditiva ganham cada vez mais espaço.

Entre os modelos de negócio adotados pelas startups de saúde, o mais comum é o SaaS, Software as a Service, que permite acesso contínuo às plataformas via assinatura. De acordo com o Distrito, 41,2% das healthtechs brasileiras operam nesse formato.

Do lado do público-alvo, o B2B domina o setor. Cerca de 39,3% das healthtechs atendem empresas, hospitais e operadoras, enquanto 35% são focadas em B2C, ou seja, diretamente no consumidor final.

Qual vai ser o futuro da Galileu

A Galileu já chegou ao breakeven. Com o novo ciclo de aquisições, quer se consolidar como a principal plataforma de gestão da jornada do paciente no Brasil. Isso significa atuar de ponta a ponta — da atenção básica à alta hospitalar, do exame periódico ao tratamento crônico.

A estratégia é seguir crescendo por meio de compras de empresas que tragam novas habilidades, canais e produtos. E a entrada no hospital, via Teller, inaugura uma nova fase neste objetivo.

Acompanhe tudo sobre:Planos de saúdeSetor de saúdeStartupsFusões e Aquisições

Mais de Negócios

Mr. Cheney entra para a Hypper Brands e leva cookies (e microfranquias) ao interior do Brasil

Da torra do café ao leite em pó: como a Nestlé vem usando IA nas fábricas

Nestlé investe R$ 7 bilhões no Brasil até 2028 para modernizar fábricas e inovar na produção

Ele pediu R$ 50 mil emprestados à tia para abrir um negócio. Hoje fatura R$ 60 milhões