Festival de Cinema de Gramado: atores debatem indústria brasileira de cinema (Edison Vara/Ag.Pressphoto)
Repórter de POP
Publicado em 22 de agosto de 2025 às 07h02.
Última atualização em 22 de agosto de 2025 às 07h42.
Gramado (RS)* — Hollywood prova como a indústria do cinema pode ser mercadológica. São bilhões de reais todos os anos. Mas no lugar do inglês, poderia ser o português do Brasil — que teria toda a possibilidade de ser uma das maiores produtoras cinematográficas do mundo se houvesse o incentivo financeiro necessário. Pelo menos é o que pensa a atriz Denise Fraga.
"A gente não é uma indústria como é a indústria estadunidense. É muito difícil ganhar dinheiro com filme no Brasil. É preciso tornar isso uma indústria, só que para isso acontecer, você não pode ser jogado aos leões", disse a atriz em entrevista à EXAME.
A atriz esteve no 53º Festival de Cinema de Gramado para a estreia brasileira de "Sonhar com Leões", filme protagonizado por ela e que concorre ao principal prêmio do evento.
Fraga destacou, ainda, a importância da regulamentação do streaming e do incentivo do Governo Federal ao audiovisual brasileiro para que a produção de filmes e séries nacionais se tornem ainda mais globais.
"Todas as vezes que o nosso cinema é incentivado, coisas boas acontecem: a gente vai para o Oscar, ganha prêmios em Cannes, leva o Urso de Prata em Berlim, porque temos um vigor criativo muito grande, uma potência. O Brasil seria um grande produtor cinematográfico do mundo, se isso fosse incentivado como se deve", completou a atriz. "Se a gente não tiver cota de tela, se tivermos essa proteção no VOD (video on demand), a gente sucumbe".
"Sonhar com Leões" é uma co-produção brasileira em parceria com Portugal e Espanha. A primeira estreia foi em 2024, na Europa. O filme leva direção de Paolo Marinou-Blanco, cineasta greco-português, e faz uma reflexão cômica e ácida sobre a eutanásia.
O longa conta a história de Gilda (Denise Fraga), uma imigrante brasileira vivendo em Lisboa que chegou ao fim da linha. Com uma doença terminal e apenas um ano de vida pela frente, o único desejo dela é morrer enquanto ainda é ela mesma, ainda tem sua dignidade e sem dor. O único problema é que a morte assistida é proibida em muitos países — e só consegue ter acesso quem paga um bom dinheiro por ela.
O longa chega aos cinemas de todo o Brasil no dia 11 de setembro e concorre à Mostra Competitiva de Longas Metragens brasileiros do 53º Festival de Cinema de Gramado. O vencedor será anunciado no dia 23 de agosto.
Hoje, o Brasil conta com algumas leis de incentivo ao cinema nacional, entre elas a Lei do Audiovisual, criada para fomentar a indústria cinematográfica brasileira e independente. Os recursos são captados pelo Fundo Setorial do Audiovisual, e distribuídos para obras aprovadas nos editais.
Na gestão Lula, o Ministério da Cultura fez o maior investimento no setor na história do Brasil, de R$ 2,8 bilhões através da lei Paulo Gustavo. Entre 2023, 2024 e começo de 2025, também foram investidos R$ 2 bilhões através do Fundo Setorial do Audiovisual, afirmou Márcio Tavares, secretário do Ministério da Cultura à EXAME.
A reestruturação de políticas públicas para a cultura, das quais entre 25 a 30% dos recursos são direcionados ao audiovisual, disse Tavares à EXAME neste sábado, tem sido "reconstruída após a gestão de Jair Bolsonaro".
Já a proposta de regulamentação do streaming, da qual Denise Fraga declarou ser favorável, está em debate no Congresso. O PL foi aprovado no Senado e retornou à Câmara, onde segue com alvos de questionamento sobre as alíquotas e tem dificuldade de aprovação pela bancada de oposição ao governo Lula. O relator é Nelsinho Trad (PSD-MS). O projeto altera a Medida Provisória 2228/01, que criou a Agência Nacional do Cinema (Ancine) e a Lei da TV Paga.
No início de julho, a votação do projeto que regula o streaming foi retirada da pauta da Câmara dos Deputados. Não foi a primeira vez: houve sucessivos adiamentos na comissão, devido a obstruções e manobras da oposição, como inversão de pauta e requerimentos para retirada do projeto da ordem do dia. O projeto ainda não foi votado no Plenário da Câmara neste ano, e o texto está sob relatoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) na Comissão de Cultura.
Os motivos pelos quais a oposição está barrando a aprovação do projeto de regulamentação do streaming são sobretudo políticos e ideológicos. Parte da bancada teme que a regulação configure algum tipo de censura ou restrição excessiva da atuação das plataformas digitais na internet, o que pode gerar resistência ao projeto em temas que envolvem o espaço digital e a liberdade de expressão online.
Mas há também pressão das grandes empresas e setores contrários a certos pontos da regulação, devido à cobrança de impostos (Condecine), cotas obrigatórias de conteúdo nacional e fiscalização pela Ancine.
Hoje, o problema maior para as companhias de streaming são as alíquotas.Feghali quer propor uma taxa de 6%. No texto atual, a alíquota para companhias com faturamento acima dos R$ 96 milhões — como é o caso das gigantes do streaming Netflix, Disney+, Prime Video e HBO Max — é de 3%.
*A repórter viajou a convite da Gramado Parks para a cobertura do 53º Festival de Cinema de Gramado