The Last of Us: veja a crítica do episódio 2 da segunda temporada (Liane Hentscher/HBO)
Repórter de POP
Publicado em 21 de abril de 2025 às 02h40.
Última atualização em 21 de abril de 2025 às 12h28.
A gente sabia que ia acontecer. Sabia até como ia acontecer. Mesmo assim, quando o momento chegou, prevaleceu a certeza: nada seria capaz de preparar o público para os minutos finais do novo episódio de "The Last of Us", que estreou neste domingo de Páscoa, 20, no streaming da Max e canais da HBO.
CRÍTICA | 'The Last of Us': o fardo das consequências é um dos mais pesadosCom 57 minutos de duração, "Through the Valley" veio aí para provar mais uma vez que as adaptações de games para a TV e o cinema não precisam ser idênticas à obra original para serem fidedignas. É possível contar a mesma história de maneiras diferentes e, ainda assim, abrir espaço criativo para explorar novas narrativas.
O novo capítulo se ateve a dois momentos-chave da história que são, cada um a sua maneira, devastadores. O primeiro foi a frenética invasão dos infectados em Jackson, uma das últimas cidades daquele universo em que a humanidade prevaleceu. E o segundo foi a inevitável morte de Joel (Pedro Pascal), principal porto-seguro de Ellie (Bella Ramsay), que vai mudar o rumo da trama daqui para frente.
Com o fim bruto, violento e traumático para os dois lados da história — o de quem fica e o de quem mata —, começa agora uma nova narrativa entre Ellie e Abby (Kaitlyn Denver) recheada de luto, vingança e impotência, sentimentos conflitantes que são o DNA de "The Last of Us" desde o lançamento do primeiro jogo.
Bella Ramsay como Ellie em "The Last of Us", segunda temporada (Liane Hentscher/HBO)
Taco de golfe, arco de vingança e primeira interação de boa-fé: os recursos que Craig Mazin e Neil Druckman, criadores da série, usaram no segundo episódio foram os mesmos que aparecem no jogo. O que mudou para a TV — e fez toda a diferença — foi a sutileza dos detalhes.
Começou nas expressões de Kaitlyn Denver, que já deixa claro porque foi selecionada para o papel. O luto ali é palpável e a raiva transborda. Nesse ponto, pouco importa a falta de músculos: o posicionamento de corpo da atriz fala mais do que o monólogo escrito para ela — que venha daí a indicação ao Emmy de Melhor Atriz Coadjuvante em série dramática.
Kaitlyn Denver como Abby em "The Last of Us", segunda temporada (Liane Hentscher/HBO)
Mas a brutalidade do momento foi construída por muitos outros elementos: a boa direção de Mark Mylod ("O Menu") enquadra o taco de golfe quebrado ao meio ao canto da tela, o rosto de Joel ensanguentado é um ponto de destaque mesmo distante da câmera e o suor nas têmporas de Denver, acompanhado da falta dos casacos na maior nevasca da região, corrobora com a violência da cena.
Diferente dos jogos, que conta com cenas bem mais explícitas, os detalhes mostrados na série — e isso inclui a mixagem de som e a direção também das expressões de Bella Ramsay — são os que provocam o sentimento da perda, da raiva e do inconformismo.
Os minutos que vem depois, entretanto, são os que amarram o verdadeiro aperto no peito de quem assiste. E são bem mais fiéis ao próprio material.
Na primeira temporada da série, lançada em 2023, um dos maiores pontos de tensão foi aquele em que Joel, atingido por uma estaca de madeira no abdômen, retira o objeto com as próprias mãos e perde tanto sangue que acaba inconsciente. Deitado em um colchão velho num abrigo improvisado, com febre e quase sem conseguir falar, ele deixa para Ellie toda a responsabilidade da sobrevivência dos dois — e ela faz o melhor que consegue com uma agulha e linha de costura.
Primeira temporada de "The Last of Us", Elie salva Joel (Montagem EXAME/ Liane Hentscher/HBO)
Antes de improvisar os pontos, há uma conexão física singela, mas de suma importância entre os dois: Joel segura nas mãos de Ellie, com os dedos entrelaçados aos dela em um claro gesto de afeto, antes que ela o costure sem anestesia alguma. Passado o momento tenso, Ellie deita ao lado de Joel e apoia a cabeça em seu peito, encostada ao rosto dele.
Faz muito sentido para o segundo episódio da nova temporada, então, que assim que vê o corpo de Joel inerte, o primeiro contato de Ellie comece pelas mãos, no mesmo entrelaçar de dedos. Daí vem um dos paralelos mais sofridos entre os dois capítulos: no primeiro, ele corresponde. No segundo, não há como responder. E quando ela apoia o rosto no dele, não há pulsação ali que possa ser ouvida.
Se no primeiro caso é Joel quem retira a estaca de madeira do próprio corpo, no segundo, quem o faz com o taco de golfe é Ellie. É a vez dela tomar a frente, porque ele já não está mais lá como guia.
Segundo episódio da segunda temporada (a imagem teve cores alteradas da original) (Reprodução HBO/ Montagem EXAME)
Também construída na sutileza, é arrebatadora a escolha de terminar o episódio com o corpo de Joel ensacado e arrastado na neve de volta a Jackson — outro detalhe exclusivo da série.
Enquanto o terreno esfria para o trágico fim de Joel nos arredores de Jackson, a cidade se prepara para combater a horda de infectados que a invade. A montagem do clima de tensão, tanto por parte dos atores quanto pela própria construção de cena, é uma das coisas mais formidáveis do episódio todo.
Ficam aqui três detalhes importantes que constroem uma abordagem técnica admirável e fortalecem a narrativa dos personagens coadjuvantes — coisa rara de se ver em séries hoje em dia:
Na primeira temporada, a série já havia revolucionado a forma como adaptações de game são feitas para a TV e o streaming. O caminho não foi simples: os atores escalados são diferentes dos que aparecem na obra original — e até hoje Bella Ramsay sofre com as comparações feitas pelos fãs e Kaitlyn Denver foi muito criticada pela falta dos músculos que Abby apresenta no jogo. Alguns personagens também tiveram sua história modificada dentro de um sentido completo da série.
No caso específico de Abby, o que mais intriga daqui para frente não é bem a fisionomia da atriz e sim a relação que o público vai criar com ela. No segundo jogo, há uma empatia maior pela personagem porque, antes que ela mate Joel, o jogador precisa viver o lado dela da história. Na série, o ritmo anda mais rápido.
Resta ver como Neil Druckmann e Craig Mazin vão resolver o "problema". Parte do DNA da história é construído pela empatia que o espectador cria com Abby, reforça a mensagem de que as escolhas de Joel tiveram consequências severas. De que no mundo pós-apocalíptico, a linha que separa o certo do errado é tênue.
Mas para um capítulo tenso do início ao fim, com uma batalha angustiante e a cena mais devastadora da trama, "The Last of Us" vai se confirmando como a melhor adaptação de série de ação dramática da década.
Resta ver como vai repercutir nas premiações, do Emmy ao Globo de Ouro.
A Max contém todos os episódios da primeira temporada de "The Last of Us" disponíveis em seu catálogo.