Publicado em 18/10/2025, às 08:01.
Última atualização em 18/10/2025, às 08:01.
Ativa - e hiperconectada
Os jovens da chamada geração Z – aqueles que nasceram entre 1997 e 2012 – recentemente passaram a tomar ruas pelo mundo em intensos protestos contra regimes estabelecidos.
Do Quênia ao Nepal, da Indonésia a Madagascar, do Peru a Bangladesh e além, essaa juventude se ergueu sob cânticos de revolução e cartazes que demandam mudanças drásticas na política.
Trata-se de uma onda que tem peculiares em cada localidade, mas guarda um sentimento geral de cansaço com o status quo nesses países, alimentada por uma geração hiperconectada. Em comum, também são protestos que se organizam rapidamente e não contam necessariamente com lideranças estabelecidas e hierarquizadas.
"O que conecta esses protestos liderados por jovens é uma sensação comum de que os sistemas políticos tradicionais não respondem às preocupações de sua geração, sejam elas corrupção, mudanças climáticas ou desigualdade econômica. O protesto se torna então a válvula de escape lógica quando os canais institucionais parecem bloqueados”, disse Sam Nadel, diretor do Social Change Lab, uma organização sem fins lucrativos sediada no Reino Unido que pesquisa protestos e movimentos sociais, para a AP News.
Ao ocupar universidades e praças públicas, os manifestantes também retomam seu espaço na política, e erguem suas vozes.
Além disso, por terem crescido com internet e tecnologia, fazem inteligente uso das plataformas digitais, que se tornaram importantes ferramentas.
Um dos maiores difusores de informação foi o uso hábil de plataformas online, principalmente redes sociais tradicionais, a plataforma Discord, e o uso de inteligência artificial para comunicar, programar, eleger e debater.
O interesse e amor por cultura pop, exemplificado pela adoção de uma bandeira pirata que pulula por vários continentes, construiu pontes de solidariedade entre manifestantes e deu símbolo a um sentimento antes difuso.
Os jovens apresentam uma forte frente unida internacional devido em grande parte a internet, e demonstram o impacto que o ativismo virtual pode ter. Hoje, suas causas se espalham com velocidade estonteante devido ao uso de redes sociais.
O momentum da tendência rebelde da geração Z não para, e continua inspirando manifestações em países como Sérbia e Timor-Leste.
A EXAME montou a cronologia do desenvolvimento das principais manifestações para explicar como a tecnologia e as redes sociais têm sido usadas de forma inédita pelos jovens, além de mostrar depoimentos e o desenvolvimento dos protestos que derrubaram -- ou agitaram -- governos mundo afora.
Nairobi, Quênia: manifestante durante ato em junho que marcou um ano dos protestos que deixaram 60 mortos no Quênia - Donwilson Odhiambo/Getty Images
Quênia (maio de 2024) – projeto de lei financeira e as armas da Gen Z
Os primeiros protestos em massa da geração Z foram organizados em meados de maio do ano passado por estudantes no Quênia.
As manifestações vieram em resposta a um projeto de lei financeira que incluía, entre outros gastos, um aumento nos impostos.
Já enfrentando poucas oportunidades de emprego e grandes dificuldades financeiras, a juventude do Quênia se mobilizou, de forma inédita, por meio de plataformas online como X, TikTok, e Instagram para organizarem grandes protestos contra a reforma.
No primeiro exemplo do poder do conhecimento digital da geração Z, que se tornou uma importante arma nos protestos pelo mundo, manifestantes fizeram amplo uso de ferramentas digitais e do espaço online pela sua causa.
Uma coletânea de métodos categorizada pelo veículo jornalístico The Conversation organiza as táticas dos jovens.
Utilizando ferramentas de inteligência artificial, foram capazes de traduzir os termos do projeto para as diversas línguas utilizadas por minorias étnicas do país, muitas vezes marginalizadas por não falarem inglês ou swahili.
Desenvolvedores de software criaram programas com GPT (mesmo modelo do ChatGPT) para explicar seus termos de forma simplificada para a população, que muitas vezes tem baixa educação.
Além disso, ao hackearem sites do governo, foram capazes de vazar números de telefone privados de políticos, o que resultou em spam em massa.
Nas redes sociais, fortes programas de conscientização e arrecadação de fundos foram lançados, apoiando a causa e informando mais pessoas - no país e no exterior - sobre o que estava acontecendo.
"As plataformas de mídia social, especialmente TikTok, X (antigo Twitter) e Facebook, têm sido fundamentais para mobilizar e direcionar a luta, contrariando a propaganda estatal", disse Okaka Onyango, um manifestante de Nairobi, pela ONG Waging Nonviolence, que acompanha e analisa movimentos sociais pelo mundo.
Segundo ele, as redes sociais criaram "uma atmosfera em que até mesmo aqueles que eram apolíticos se sentiram chamados a agir"
Sem um líder, característica que se tornaria comum em manifestações futuras da Gen Z, as massas da juventude marcharam por Nairobi e outras cidades, em protestos originalmente pacíficos que se tornaram tumultuosos após a aprovação do projeto de lei.
"A ausência de um líder único significava que não éramos um alvo fácil para o Estado", acrescentou Onyango. "Foi assim que conseguimos sobreviver em meio aos ataques da polícia e ao terrorismo e violência patrocinados pelo Estado."
Do dia 18 de junho ao dia 25, protestos se alastraram por todo o país, e conflitos com a polícia causaram mortes.
Manifestantes marcharam e incendiaram o parlamento. Ao todo, as Nações Unidas estimam ao menos 60 mortos ao longo dos protestos, que ocorreram em todo o país.
No dia 26 de junho, manifestantes conseguiram reverter a lei, que foi revogada pelo presidente William Ruto.
Além disso, os protestos conseguiram uma reforma ampla no gabinete, com muitos membros da oposição sendo nomeados, o que mudou o rumo da política do país.
Manifestantes antigovernamentais marcham em direção ao palácio da primeira-ministra Sheikh Hasina enquanto militares montam guarda na área de Shahbag, perto da universidade de Dhaka, em Bangladesh.
Bangladesh (Julho, 2024) – a Revolução de Julho
No mesmo ano, pouco tempo após os acontecimentos no Quênia, foi a vez dos jovens estudantes de Bangladesh se mobilizarem em meio a uma série de cotas que reservava mais de metade dos postos de serviços civis a certos grupos – o principal entre eles os descendentes dos guerrilheiros que lutaram contra o Paquistão na guerra de liberação de Bangladesh, nos anos 70.
Esses descendentes ocupavam assentos desproporcionais, na avaliação popular, no parlamento, incluindo a então premiê Sheikh Hasina, filha de um importante líder da época, o que tocou em um sentimento de nepotismo excessivo no país.
Um estudante e manifestante explicou a situação no momento:
“Um emprego público é uma oportunidade realmente boa”, disse Maruf Khan, 29, em entrevista à CNN. “Cerca de 500.000 a 600.000 pessoas estão competindo por 600 a 700 empregos públicos e, além disso, há uma cota de 56%. Não é fácil”.
De acordo com dados do Banco Mundial do período, em uma nação de 170 milhões, mais de 30 milhões não estavam empregados ou estudando.
Foi o desemprego e o sentimento de nepotismo que novamente atiçou a raiva da Gen Z, que tomou as universidades todo o país em manifestações intensas, organizadas virtualmente e sem um líder.
Dessa vez, os protestos escalaram com o envolvimento de outro grupo de jovens: estudantes da liga Bangladesh Chatra, que era afiliada ao partido Awami, em poder no período, atacaram manifestantes.
A partir disso, membros do protesto entraram em conflito com a polícia e apoiadores do governo.
O banimento de redes sociais e a implementação de um toque de recolher mandatório por Hasina apenas enfureceu ainda mais os jovens, que sobrepujaram seus oponentes e marcharam em direção à residência presidencial.
A brutalidade que se seguiu chamou a atenção da ONU: Volker Türk, chefe da Comissão de Direitos Humanos da ONU, reporta que durante os 46 dias de manifestações 1.400 pessoas foram mortas.
“Há motivos razoáveis para acreditar que funcionários do antigo governo, seus aparatos de segurança e inteligência, juntamente com elementos violentos associados ao antigo partido no poder, cometeram violações graves e sistemáticas dos direitos humanos”, disse Türk em relatório oficial da ONU sobre o ocorrido.
Todavia, apesar da forte e violenta repressão, manifestantes da Gen Z conseguiram chegar à residência presidencial e a vandalizaram, causando incêndios e quebrando janelas.
Isso fez com que Hasina renunciasse e fugisse do país para a Índia, derrubando um mandato de 15 anos.
O período ficou conhecido no país como a Revolução de Julho, e culminou em um governo interino a cargo do vencedor do Nobel da Paz Muhammed Yunus, mudando drasticamente o cenário político do país.
O governo interino ficará em vigor até as históricas eleições previstas para fevereiro.
A Revolução de Julho, devido à sua magnitude, instigou ainda mais mobilização da Gen Z pelo mundo, que foram diretamente inspiradas pelos manifestantes de Bangladesh.
Manifestante protesta em barco do anime One Piece, durante as manifestações da Gen Z na Indonésia em outubro
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Indonésia (Fevereiro, 2025) – Nasce um símbolo
Instigados por privilégios de moradia para membros do governo do ex-comandante das forças especiais Prabowo Subianto, agora presidente, estudantes indonésios seguiram o exemplo de outros protestos globais e foram às ruas e aos campus de suas universidades.
Eles combatiam benefícios que incluíam depósitos mensais de 50 milhões de rúpias (cerca de R$ 16.000) voltados para moradia para membros da Câmara dos Deputados do país – cerca de 10 vezes o salário-mínimo da Indonésia.
Os protestos, que começaram em fevereiro, eram novamente pacíficos em origem, mas se tornaram violentos após um caminhão blindado da polícia, cuja repressão já era intensa, atropelar e matar um jovem vendedor ambulante em agosto, sem prestar socorro.
A partir disso, os movimentos se intensificaram em magnitude e violência.
Quando Prabowo, altamente impopular, ordenou que todos os cidadãos hasteassem bandeiras nacionais para a comemoração do aniversário de 80 anos do país, certos grupos de caminhoneiros hastearam em seu lugar a bandeira pirata do famoso anime One Piece, protagonizado pelo personagem Monkey D. Luffy, de 1997, que continua lançando episódios.
"Luffy é muito determinado. Ele tem uma missão. Ele e sua tripulação certamente passaram por obstáculos, mas continuaram perseguindo seu objetivo" diz Andrea Horbinski, uma especialista em mangás e animes, e doutora em estudos japoneses modernos, à CNN. "É isso que as pessoas estão percebendo e pensando quando levam a bandeira para esse tipo de protesto."
A bandeira, preta e que ostenta uma caveira com ossos cruzados e um chapéu de palha, se tornou o símbolo tanto da tripulação dos Chapéus de Palha no anime quanto dos manifestantes na vida real.
Durante os protestos da Indonésia, que estão ativos até hoje, manifestantes adotaram suas bandeiras negras e a caveira se tornou rapidamente sinônimo dos movimentos jovens.
"Este movimento é muito importante, pois simboliza a prova de que nossa geração, a Geração Z, está disposta a se levantar e lutar pela justiça em nosso país. A Geração Z provou que não somos indiferentes. Nós nos importamos, agimos e lutamos pela justiça", disse o manifestante Derry, 25, cujo nome completo foi censurado por motivos de privacidade, à organização de direitos humanos Anistia Internacional.
Continua: "Quanto à minha mensagem às autoridades: sempre existiremos — e nos multiplicaremos. Quanto mais tentarem nos silenciar, mais altos seremos. Não temos medo, porque a repressão apenas expõe o medo de vocês. Isso mostra que vocês, e não nós, têm pavor da verdade e medo do povo."
Além disso, a imagem da bandeira e seu significado se espalharam rapidamente através das plataformas de redes sociais.
Singha Durbar: incêndio atingiu sede do governo do Nepal em meio a protestos liderados por jovens contra corrupção e desigualdade
Nepal (setembro, 2025) – Parlamento e residências em chamas
No Nepal, a origem das manifestações era relativamente modesta: um banimento nas redes sociais pelo governo, que vetou sua participação no país por não se registrarem.
Apesar da lei que ditou isso ser controversa, jovens manifestantes, privados de suas principais plataformas de entretenimento e comunicação, foram às ruas protestar pacificamente no dia 8 de setembro.
O que acontece a seguir é incerto, mas analistas suspeitam de infiltrações de elementos radicais nos protestos, que os empurraram até passar as barreiras erguidas pela polícia:
“Temos boas fontes que nos dizem que a destruição e a violência que ocorreram a seguir foram devidas a diferentes tipos de infiltradores e de ativistas políticos sequestrando as manifestações. Foi algo mais complexo do que apenas um protesto da Gen Z. Começou como manifestações deles, mas temos informações confiáveis de que outros elementos políticos sequestraram os protestos, o que levou à anarquia que vimos”, disse Ritanjan Das, que leciona estudos políticos da Ásia do Sul na Universidade de Leiden, na Holanda, em entrevista à EXAME.
Corroborando essa ideia, o jornalista nepalês Kanak Mani Dixit, que acompanhou os protestos, explicou em entrevista à The Wire:
“O protesto que ia das 9 ao meio-dia no dia 8 foi sequestrado por intrusos [...] foram eles que tomaram conta das manifestações e foram eles que invadiram as premissas do parlamento, que resultou nessa retaliação horrível pelo exército.”
O confronto com a polícia e as forças armadas resultaram em 19 mortes no primeiro dia, muitas das quais foram de jovens em seus uniformes escolares.
Como resultado, as manifestações dos dias seguintes se intensificaram, e causaram níveis de destruição e vandalismo até antes não vistos nas manifestações da geração Z.
A ira dos jovens se estendeu aos problemas políticos e sociais no país: baixa oportunidade, nepotismo, e corrupção foram seus catalisadores.
Manifestantes ergueram suas bandeiras negras e tomaram as ruas, citando seus compatriotas na Indonésia como inspiração direta.
Ao longo dos protestos, vários prédios parlamentares, residências privadas de políticos, e símbolos da desigualdade social, como luxuosos hotéis, foram vandalizados e incendiados.
As colunas de fumaça foram tão altas que o aeroporto internacional da capital Kathmandu interditou as operações.
Muitos parlamentares e suas famílias necessitaram de evacuação por helicóptero de suas casas em chamas.
O primeiro-ministro K.P Oli renunciou, e muito de seu gabinete o seguiu.
Como resultado, o governo caiu totalmente, e um governo interino seguiu. No total, mais de 70 manifestantes foram mortos nos protestos.
A líder escolhida pela Gen Z foi Sushila Karki, a primeira mulher a ser chefe de justiça da Suprema Corte do Nepal e agora a primeira mulher a ocupar o cargo de premiê.
Karki foi escolhida por votações pelo Discord, plataforma de comunicação principalmente utilizada por gamers.
O governo interino promete eleições para o começo de 2026.
Grupo militar Capsat assume poder de Madagascar e promete transição democrática em menos de dois anos
Madagascar (Setembro, 2025) – Uma união improvável
Os protestos em Madagascar começaram semanas após os do Nepal, em 25 de setembro desse ano, contra a falta de água e eletricidade na ilha.
Tais falhas são comuns, e sua frequência foi o que causou os protestos em primeiro lugar.
As manifestações se intensificaram por causa da repressão violenta da polícia ante a desordem e vandalismo, e 22 manifestantes foram mortos.
Todavia, a multidão inabalável continuou sua marcha na capital de Antananarivo, clamando pela deposição do presidente Andry Rajoelina.
Os motivos por trás da raiva contra o presidente seguem mesma tendência de outras manifestações: o nepotismo enquanto cidadãos vivem na pobreza, corrupção dentro do governo e as poucas oportunidades.
Além disso, Rajoelina planejava fortes investimentos em projetos supérfluos, como a construção de um teleférico sobre a capital que custaria 152 milhões de dólares.
O fervor foi tanto que simpatizantes da causa surgiram dentro do Capsat, unidade de elite do exército da ilha, que eventualmente tomaram controle do grupo.
O mesmo aconteceu com a polícia e com forças paramilitares.
Como resultado, essas forças passaram a escoltar os manifestantes pelas ruas da cidade, apoiando sua causa sob as mesmas bandeiras piratas.
"Para a Geração Z, protestar não é uma escolha, é uma necessidade moral. Estamos crescendo em um mundo onde a injustiça se tornou algo cotidiano, onde a corrupção sufoca a esperança e onde o silêncio às vezes é mais perigoso do que se manifestar", disse Rova, de 23 anos, também à Anistia Internacional.
"Em Madagascar, os jovens vivem em uma realidade difícil: pobreza, desigualdade, cortes de energia, abuso de poder e medo de expressar suas opiniões. No entanto, apesar desses obstáculos, escolhemos nos manifestar, marchar e denunciar", complementou.
Percebendo a falta de apoio das forças armadas, Rajoelina saiu do país com a ajuda da França e dissolveu o parlamento.
Por mais que contestasse as mudanças e buscasse se manter no poder, foi deposto em um golpe militar quando forças do Capsat, lideradas por Michael Randrianirina, tomaram o poder nessa terça feira, dia 14.
Governo militar promete ficar no poder por até dois anos, para que o país possa se reajustar e conduzir novas eleições.
Manifestantes da Gen Z ondulam bandeira pirata do anime One Piece durante os protestos em 15 de outubro de 2025 no Peru
Peru (Setembro, 2025) – "Estamos travando a mesma batalha"
Ocorrendo simultaneamente aos protestos em Madagascar, a juventude do Peru foi às ruas no fim de setembro para exigir a deposição da presidente Dina Boluarte.
Sua taxa de aprovação já estava com um único dígito há meses, uma das menores da América Latina.
As manifestações se originaram após uma reforma de pensões que requisitava o pagamento de jovens a um fundo privado.
Em meio a sua alta impopularidade e índices criminais, manifestantes foram às ruas com cartazes demonstrando a mesma caveira do chapéu de palha demandando a queda de Boluarte.
"Estamos travando a mesma batalha — contra políticos corruptos que, no nosso caso, também são assassinos. No meu caso, é indignação pelo abuso de poder, pela corrupção, pelas mortes", disse David Tafur, um eletricista de 27 anos, para a AP News.
Caminhoneiros, taxistas e outros serventes públicos rapidamente se juntaram à causa da Gen Z, dizendo que o governo de Boluarte não estava fazendo o suficiente para lidar com o alto crime.
Além disso, a vice-presidente estaria envolvida em diversos escândalos: dentre eles uma ausência não comunicada para realizar uma cirurgia plástica no nariz e bens de luxo não indicados em sua lista de bens, como relógios da Rolex.
Manifestantes entraram em conflitos violentos com a polícia, o que resultou em dezenas de feridos de ambos os lados, e pelo menos uma morte.
Por pressões externas e internas à política, parlamentares se reuniram na madrugada do dia 10 de outubro para uma sessão de impeachment.
Boluarte foi convocada para apresentar sua defesa, mas não compareceu. Como resultado, após apenas 20 minutos de espera, foi destituída do governo em uma deposição relâmpago. Os deputados deram como motivo de sua destituição uma “incapacidade moral permanente” para lidar com as fortes ondas de criminalidade que assolam o país.
"Protestar como jovem no meu país significa enfrentar todas as violações dos direitos humanos, sejam elas quais forem. Protesto por um mundo mais justo, onde levantar a minha voz não seja sinônimo de morte. Protesto porque quero que todas as pessoas se sintam livres e orgulhosas de serem quem são e de amarem quem quiserem. Protesto e me mobilizo porque quero um ecossistema que seja respeitado e amado", disse Paola, 26, ativista e delegada da juventude pela Anistia Internacional.
Um governo interino sob o comando de Jose Jerí, 38, foi instaurado até julho de 2026, quando o país terá novas eleições gerais.
Jerí é o sétimo presidente do Peru em 8 anos.
Manifestantes da Gen Z no Marrocos erguem cartaz do anime One Piece, com foto e recompensa para o político Rashid Talbi Alami
Marrocos (Setembro, 2025) – "Não vai ter copa!"
Os protestos em Marrocos também são simultâneos aos do Peru e de Madagascar, começando no dia 25 de setembro.
As manifestações se iniciaram após a morte de oito mulheres grávidas que fariam o procedimento de cirurgia cesariana em um hospital público em Agadir. O episódio detonou um sentimento de baixa qualidade dos estabelecimentos de saúde.
Os jovens protestam contra os fortes investimentos do governo em hotéis e estádios para a copa em 2030, enquanto o sistema de educação e saúde continua precário.
Organizados novamente através da plataforma Discord e sob a organização Gen Z 212, em alusão ao código telefônico do país, manifestantes conflitaram com a polícia e, ao todo, mais de 400 foram presos, muitos menores de idade, e centenas feridos.
Mustapha, 22, cujo nome completo foi omitido por segurança, disse ao The Guardian: "Fui protestar porque vi violência governamental toda a minha vida; não física, mas psicológica. Nos hospitais, não há médicos. Nas escolas, as salas de aula estão lotadas com mais de 50 alunos."
Mustapha foi preso no segundo dia dos protestos. Explicou: "Meu amigo falou com a imprensa e foi preso imediatamente. Tentei ir embora, mas um policial à paisana me prendeu. Eles nos obrigaram a assinar documentos admitindo que participamos de protestos ilegais."
Mantido sob custódia por 48 horas, não teve contato com a família e não obteve permissão para falar com advogados.
Apesar de a organização liderar os protestos, novamente não há um líder central, ou uma única figura protagonista.
As primeiras mortes ocorreram no começo de outubro, e até então, são duas mortes confirmadas.
Em entrevista à BBC, um manifestante anônimo comparou o estado de hospitais a presídios: sujos, lotados e onde é necessário subornar guardas e enfermeiros para conseguir ver um médico.
As manifestações já se alastraram pelo país inteiro, incluindo a capital Rabat, o centro comercial de Casablanca e o polo turístico de Marrakesh.
O porta-voz do Ministério do Interior, Rachid El Khafi, informou que 263 policiais foram feridos durante os protestos, e que 142 de seus veículos foram vandalizados. O número de feridos entre os civis é de 23, e duas mortes, afirma o ministério.
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Créditos
Matheus Gonçalves
Repórter
Formado em Relações Internacionais pela Universidade de Leiden. Especializado em política e economia do Leste Asiático.