Diego Villar, CEO da Moura Dubeux: “Em nove meses, a empresa fez mais do que em qualquer outro ano na história” (Leandro Fonseca /Exame)
Repórter de Mercados
Publicado em 27 de novembro de 2025 às 06h00.
Uma das empresas que mais ganharam valor na bolsa brasileira em 2025 é do Nordeste — e não faz questão de sair de lá. As ações da incorporadora Moura Dubeux dispararam desde o IPO (Oferta Pública Inicial) realizado em fevereiro de 2020. Só neste ano, saltaram 194%, sendo a terceira companhia que mais valorizou dentro das carteiras dos índices da B3. Também é a única incorporadora no top 5. Enquanto as ações disparam na bolsa, a Moura Dubeux busca fazer valer o prestígio que ganhou dos investidores. Neste ano, chegou a um novo patamar, dizem os administradores da companhia, amparados pelos resultados acumulados ao longo de 2025.
“Em nove meses, a empresa fez mais do que em qualquer outro ano na história”, afirma Diego Villar, CEO da Moura Dubeux. Foi uma melhora generalizada — em vendas, lançamentos, lucro, receita, margens e melhor retorno do patrimônio. A companhia basicamente dobrou o tamanho da operação em dois anos, tornando-se uma empresa de 4 bilhões de reais. Ela não possui guidance formal, mas, pelo desempenho do ano até agora, o CEO dá como certo um lucro muito acima do de 2024. Só nos primeiros três trimestres do ano, a cifra já superou 300 milhões de reais. O setor imobiliário ganha força no Nordeste, com demanda crescente não só por lançamentos, mas também por imóveis usados, como mostram os dados do FipeZAP, detalhados nesta edição.
No mercado imobiliário, há quem veja a Moura Dubeux com potencial para explorar as grandes capitais do Sudeste. Mas a empresa garante que a ambição é outra: tornar o Nordeste um polo econômico alternativo aos grandes centros urbanos.
Avenida Boa Viagem: com a Moura Dubeux criada, os sócios decidiram explorar a região mais nobre do Recife. A incorporadora fez mais de 40 empreendimentos na via (Dircinha S Welter/Getty Images)
Para isso, a companhia vai ter de superar um desafio antigo: a persistente evasão de talentos que faz tantos migrarem para o Sudeste, especialmente São Paulo, em busca de referências e oportunidades. “Prova é que muitas das aprovações no ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica] vêm do Ceará, mas ficam em São Paulo por falta de grandes empresas que captem esses talentos”, argumenta. A MD está empenhada em inverter essa lógica, com potencial de promover uma guinada nordestina.
Um dos pontos que tornam esse plano plausível é a forte presença da Moura Dubeux em sete dos nove estados da região. Para manter relevância, a companhia, voltada para médio e alto padrão, lançou novas marcas para atender também o segmento econômico, com imóveis que se enquadram no programa habitacional Minha Casa, Minha Vida (MCMV). Criada mais recentemente, a Un1ca nasceu focada especificamente na faixa 3, atendendo famílias com renda mensal entre 4.700,01 e 8.000 reais. Já a Mood vai atender famílias com renda entre 12.000 e 15.000 reais que, até então, não eram contempladas no MCMV — mas agora se enquadram no programa, após mudanças recentes na faixa 4.
Em setembro, aumentou ainda mais a exposição ao segmento econômico ao estabelecer uma joint venture com a Direcional, que participa ativamente do programa habitacional desde o início. A parceria entre as incorporadoras foi vista por especialistas como um ganha-ganha: a Moura Dubeux abre caminho para a Direcional no mercado nordestino, enquanto a Direcional soma sua longa experiência com o MCMV, principalmente nas faixas 3 e 4.
O Nordeste ganha um papel relevante na estratégia da construtora mineira. A região concentra 15% dos lançamentos da Direcional neste ano, e a meta é chegar a 25% da operação da companhia no futuro. “Vemos uma oportunidade muito grande atualmente. É uma região onde há um déficit habitacional relevante e uma demanda grande, com o Minha Casa, Minha Vida podendo cada vez mais atender a população nordestina. E a relevância que a Moura tem por lá acelera muito esse processo de crescimento”, afirma Ricardo Gontijo, CEO da Direcional.
A demanda cresce no Nordeste
A parceria foi firmada em momento oportuno: o Nordeste tem ganhado certo protagonismo no programa habitacional, desde que passou a utilizar integralmente a verba que lhe era destinada. Está revertendo o padrão histórico de -subutilização de recursos, observado antes. Isso também ocorre por mudanças no próprio programa habitacional que ampliaram o acesso ao financiamento: aumento do teto do valor do imóvel, subsídios mais generosos (de até 55.000 reais) e alongamento do prazo de financiamento para 35 anos.
Famílias com renda mais baixa passaram a ter acesso a financiamentos que antes não conseguiam contratar. O Nordeste, apesar de ter a renda média mais baixa do Brasil, é também a região que conta com as menores taxas de juro do programa, que podem chegar a 4%.
“Até 2022, parte dos recursos que não eram gastos no Norte e no Nordeste era devolvida para o Sul e o Sudeste. Agora, se 5 bilhões de reais chegam, 5 bilhões são gastos, e o dinheiro não é mais devolvido, porque as pessoas passaram a ter condição para ser aprovadas no financiamento”, explica José Carlos Martins, presidente do Conselho Consultivo da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).
Martins foi um dos criadores do Índice de Demanda Imobiliária (IDI) Brasil, numa parceria entre a CBIC, o Ecossistema Sienge, CV CRM e o Grupo Prospecta. Trata-se de uma ferramenta estratégica que mede e avalia a atratividade de 79 cidades brasileiras em relação à demanda por imóveis em diversas faixas de preço. No segmento econômico, cinco capitais nordestinas estão entre as dez cidades com maior demanda imobiliária: Fortaleza (CE), Recife (PE), Salvador (BA), Aracaju (SE) e Maceió (AL). “O mercado provavelmente começou a perceber que a população da região passou a conseguir financiamento pelo MCMV e começou a lançar empreendimentos. Com o lançamento, a venda aumenta, assim como a visita aos estandes de venda, quesitos considerados na elaboração do índice”, diz.
No médio e no alto padrão, as capitais nordestinas também foram bem. Na avaliação do especialista, o segmento econômico serviu como catalisador para os demais segmentos. No alto padrão, Recife ficou em terceiro lugar; Fortaleza, em quarto; e Salvador, em sétimo. No médio, Salvador ficou em quarto; e Fortaleza, em sétimo.
Ricardo Gontijo, CEO da Direcional: o Nordeste concentra 15% dos lançamentos da companhia neste ano, e a meta é chegar a 25% da operação no futuro (Leandro Fonseca /Exame)
Condomínio fechado no DNA
Independentemente do segmento, a Moura Dubeux está pronta para fechar o cerco. Fundada em 1983, no Recife, a companhia nasceu para o alto padrão pelo tino empreendedor de três irmãos e engenheiros, Gustavo, Marcos e Aluísio, que até então administravam um posto de gasolina. “Eles decidiram comprar um terreno com amigos para construir um prédio para morar. Dos amigos, eles cobraram uma taxa de administração por estarem executando a obra. No fim do dia, o que eles queriam mesmo era ter um apartamento bom e barato”, conta Diego Villar.
O primeiro empreendimento foi o Morada de Apipucos, no bairro de mesmo nome, na capital pernambucana. Gustavo e Aluísio foram de fato morar no edifício, mas Marcos decidiu vender seu apartamento e mais do que triplicou o dinheiro investido na obra. A conclusão era óbvia: o negócio era mais rentável do que o antigo posto de gasolina administrado pelos irmãos.
Com a Moura Dubeux criada, os sócios decidiram explorar a região mais nobre do Recife, a Avenida Boa Viagem. Foi uma disrupção. A MD conseguia negociar preços bem mais em conta para a média do bairro ao trabalhar com um modelo diferente da incorporação tradicional: o de condomínio, no qual moradores custeiam diretamente os gastos da obra. “Isso revolucionou o mercado na época. Depois, fizemos mais de 40 prédios na avenida.” Além dos custos da obra, os condôminos dividem responsabilidades, com um CNPJ próprio e rateio de despesas não tributadas. A MD assume o risco de inadimplência, garantindo a entrega das obras e eliminando o risco de distratos.
O modelo se consolidou como principal estratégia de negócios da companhia. Com o passar dos anos, o nome Moura Dubeux passou a ser associado a imóveis de qualidade. Diante da força da marca, a MD percebeu que não fazia sentido ficar apenas no Recife. Naquela mesma época, as incorporadoras de São Paulo estavam se listando na bolsa, buscando capital para expandir pelo Brasil. Facilmente chegariam ao Nordeste. A Moura Dubeux não queria ficar para trás.
Até 2008, a companhia se financiava com dívidas bancárias, conseguiu crescer, até que precisou lidar com uma explosão no custo da mão de obra. Quando as incorporadoras de fora por fim chegaram à região, trouxeram a base salarial de São Paulo junto com elas, e a inflação foi às alturas. Nessa época, a Moura Dubeux chegou a firmar uma parceria com a MRV, com foco no segmento econômico. A colaboração durou dez anos e terminou porque a MD decidiu focar os segmentos de média e alta renda.
Mesmo sem a parceria, a MRV continuou no Nordeste. Mas outros players tradicionais decidiram se retirar quando turbulências na economia nacional geraram uma crise de distratos na região. “Nós tínhamos um modelo de negócios mais resiliente [referindo-se ao condomínio fechado], então conseguimos sobreviver. Não ficamos bem, mas sobrevivemos a essa época. Em 2018, a economia voltou a crescer, a taxa de juros estava mais baixa, e não tínhamos mais competidores na região”, relembra.
Quando a situação melhorou, a demanda passou a ficar maior do que o que a Moura Dubeux podia ofertar e, a partir dali, a companhia poderia seguir por dois caminhos. No primeiro, as coisas ficariam como estavam: a empresa não atenderia à demanda do mercado, mas também não conseguiria crescer. Ao mesmo tempo, continuaria pagando juros elevados dos empréstimos que havia tomado. O resultado seria lucro quase zero. A segunda via parecia fazer mais sentido: vender um pedaço da empresa e levantar capital sem se endividar. Algo que uma listagem na bolsa possibilitaria.
Uma das caçulas na bolsa
A Moura Dubeux abriu o capital na B3 em fevereiro de 2020. A companhia levantou aproximadamente 1,25 bilhão de reais. Destinou 90% dos recursos captados à redução do endividamento — o que não costuma ser tão bem recebido pelo mercado — e usou os outros 10% para reforçar caixa e adquirir terrenos. A incorporadora fez parte de uma safra de IPOs que ocorreu na esteira dos juros baixos, no período de pandemia. Os últimos antes de uma seca de ofertas públicas que completou quatro anos em 2025.
A disparada das ações da Moura Dubeux desde a estreia na bolsa é apoiada por uma tese robusta, segundo os analistas. O que salta aos olhos do mercado é justamente a posição de liderança no Nordeste, sendo a única listada em bolsa totalmente exposta à região. Não à toa, o BTG Pactual (do mesmo grupo controlador da EXAME) passou a fazer a cobertura dos papéis da companhia em setembro de 2025, dando recomendação de compra e um preço-alvo de 40 reais. Para os analistas do banco, a experiência regional dá à construtora a vantagem competitiva que funciona como barreira para a entrada de novos concorrentes.
O modelo de condomínio fechado continua trazendo resiliência à incorporadora, oferece um fluxo de caixa positivo, pois o financiamento da obra é realizado pelos próprios clientes, e as variações de custos são compartilhadas com os condôminos. Isso blinda a empresa de prejuízos inesperados e contribui para manter baixa a alavancagem da empresa, um dos pilares estratégicos da companhia. Diego Villar diz que a empresa não buscará crescimento que comprometa a manutenção dessa alavancagem em nível baixo.
“Saímos de 800 milhões de reais de vendas em 2020 para mais de 3,5 bilhões de reais no final de 2025. Saí-mos de 1.000 para 8.000 funcionários. Fomos expandindo, mas sem sair do Nordeste e sem comprometer a alavancagem, numa estratégia agressiva de ocupar a região. Quando as incorporadoras de fora perceberam que o mercado daqui estava voltando, nós já estávamos lançando. Nesse meio-tempo, expandimos o modelo de condomínio fechado em todos os estados onde atuamos”, afirma o CEO.