Revista Exame

Memórias do cárcere

Laureado com os três maiores prêmios do cinema (Berlim, Veneza e Cannes), o iraniano Jafar Panahi tornou a experiência na prisão um emocionante filme

Foi Apenas um Acidente: Palma  de Ouro no Festival de Cannes de 2025 (MUBI/Divulgação)

Foi Apenas um Acidente: Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2025 (MUBI/Divulgação)

Luiza Vilela
Luiza Vilela

Repórter de Casual

Publicado em 27 de novembro de 2025 às 06h00.

Dez meses em uma prisão iraniana foi o material bruto que o cineas­ta Jafar Panahi usou para produzir um filme que trata, surpreendentemente, de otimismo. Em Foi Apenas um Acidente (2025), filme com o qual o diretor estreou no Festival de Cannes deste ano e levou a Palma de Ouro, a reflexão segue um rumo oposto à busca de justiça pela força bruta, como se poderia esperar.

A trama acompanha um grupo de ex-detentos do regime iraniano que tentam descobrir se um desconhecido capturado é mesmo o homem que os torturou na prisão. E, claro, decidir o que fazer com ele.

Enquanto não se decidem, as pessoas — um homem que trabalha em uma oficina de carros, um casal de noivos, a fotógrafa do casamento e um simples trabalhador — se deparam com uma série de imprevistos tragicômicos. Muitos deles relacionados à vida pessoal do torturador, que colocam o caráter e a empatia dos personagens em xeque.

Panahi foi preso duas vezes na prisão de Evin, em Teerã, por suposta propaganda contra o sistema. Na primeira passagem, em 2010, foram três meses em cárcere. Na segunda, em 2022, foram sete. Poderiam ter sido mais se ele não tivesse iniciado uma greve de fome. O período na prisão foi suficiente para que o cineasta colhesse depoimentos de detentos políticos, que serviram para a construção do roteiro de Foi Apenas um Acidente.

“Quando você trabalha com cinema social e sua essência é humana, se concentra no caminho para passar uma mensagem. Não queria dar nem falsa esperança nem falso desespero com esse filme”, disse o diretor à Casual EXAME na passagem por São Paulo para a 49a Mostra Internacional de Cinema. “A proposta não era expor a violência na prática, mas compô-la com uma visão esperançosa de que as coisas podem ser mais otimistas.”

Para gravar o longa, o diretor utilizou uma equipe secreta, em locais e horários variados, para driblar o regime. “Quando você decide não aceitar a censura, precisa saber que vai ter muitos problemas. Para mim, para a história que eu queria contar com o que eu vivi, não havia outra escolha a não ser encontrar caminhos. Minha equipe sabia dos riscos. Só foi possível fazer porque eles confiavam que era um trabalho importante e estavam dispostos a arcar com as consequências.”

Com roteiro leve e final arrebatador, com os horrores do regime expostos na sutileza dos diálogos, o filme segue como uma das principais apostas para o Oscar de 2026. Ilegal pelo Irã, concorrerá à estatueta de Melhor Filme Internacional como o representante da França. A produção chega aos cinemas brasileiros no dia 4 de ­dezembro, distribuída pela Mubi.



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