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Como o Tumblr encolheu e hoje queima US$ 30 mi ao ano para ter 0,28% do setor

Matt Mullenweg chama Tumblr de seu maior fracasso; rede opera no prejuízo e com equipe reduzida dentro da dona do Wordpress

Tumblr: rede social criada em 2007 mantém 135 milhões de usuários ativos, mesmo no prejuízo (Canva/Montagem/Exame)

Tumblr: rede social criada em 2007 mantém 135 milhões de usuários ativos, mesmo no prejuízo (Canva/Montagem/Exame)

Publicado em 25 de novembro de 2025 às 07h38.

Última atualização em 25 de novembro de 2025 às 08h24.

Na década de 2010, o Tumblr era um planeta próprio. Um lugar onde blogs tocavam músicas em autoplay sem restrições, onde GIFs ocupavam telas inteiras, fandoms construíam universos paralelos e servia espaço para adolescentes com insônia reescreverem suas identidades manipulando linhas de HTML. Era caótico, íntimo, barulhento e, justamente por isso, irresistível.

Em 2018, no ápice, o site sustentava 521 milhões de visitantes mensais. Um volume que o colocava entre os gigantes da época. Mas a internet mudou. O humor ficou mais curto, os feeds mais calculados, e a estética low profile dos millennials ficou presa numa espécie de cápsula cultural. A partir de 2023, o Tumblr já recebia menos da metade do tráfego do seu auge, oscilando entre o culto e o colapso silencioso.

Em 2025, estabilizou-se com 360 milhões de visitantes únicos por mês e 135 milhões de usuários ativos, número expressivo, mas ainda distante do que um dia foi. Mesmo assim, para Matt Mullenweg, CEO da Automattic, empresa responsável pelo Tumblr e pelo WordPress, o investimento na rede social foi o "seu maior fracasso ou oportunidade perdida".

O Tumblr mantém 135 milhões de usuários ativos e 12,8 milhões de posts diários, mas sua receita mensal é de apenas US$ 97 mil, enquanto o prejuízo operacional anual atinge US$ 30 milhões, segundo os últimos dados divulgados por Mullenweg.

Em termos de mercado, o Tumblr representa hoje apenas 0,28% do mercado de redes sociais, contra 73,12% do Facebook e 5,28% do Instagram, segundo dados da BrandWell, plataforma de AI especializada em crescimento de marcas digitais.

De altos e baixos, do topo à queda, a questão agora é se o Tumblr está preparado para continuar relevante mesmo com uma fatia tão pífia da internet.

Da startup à aquisição milionária

Quando David Karp, de 21 anos à época, fundou o Tumblr em 2007, sua ideia era criar uma plataforma simples, flexível e voltada para expressão pessoal — algo entre blog e rede social, mas sem as exigências de performance, identidade ou formato que já marcavam o ambiente digital.

Em apenas duas semanas, a rede somou 75 mil usuários registrados e, em um ano, atraiu investidores, alcançando uma avaliação de US$ 3 milhões.

Na fase inicial, o Tumblr se destacou por oferecer uma experiência radicalmente diferente das plataformas dominantes do período. Não havia contagem pública de seguidores, nem feed algorítmico, nem exigência de nome real.

O foco era a personalização extrema: cada usuário podia editar o HTML de seu blog, escolher temas visuais e publicar múltiplos formatos com um clique — texto, foto, citação, link, áudio, vídeo ou chat.

A simplicidade da interface, combinada com a lógica de reblogs encadeados, transformou o Tumblr em um espaço de circulação criativa. A ausência de métricas visíveis e a possibilidade de anonimato incentivavam interações espontâneas e colaborativas, com destaque para fanfics, edições visuais, GIFs e narrativas experimentais.

Com essa base, a rede passou a atrair um público jovem, especialmente adolescentes e universitários. Em 2010, metade dos visitantes tinha menos de 25 anos. Fandoms de séries, livros e filmes encontraram ali um ambiente de expansão cultural pouco moderado, o que consolidou o Tumblr como espaço de referência para subculturas digitais, debates sobre sexualidade e identidade de gênero.

O ecossistema se expandiu rapidamente: entre 2010 e 2011, o número de visitantes cresceu 218%. Em 2013, no auge, a plataforma foi vendida ao Yahoo por US$ 1,1 bilhão, com 109 milhões de blogs ativos e mais de 50 bilhões de posts. Foi ali que os problemas começaram.

Publicidade forçada, perda de identidade e crise

O Yahoo tentou transformar o Tumblr em um ativo publicitário. A promessa inicial da CEO Marissa Mayer era preservar a identidade da rede e não “estragar” o que a tornava única.

Mas, em 2015, a executiva decidiu fundir a equipe de vendas do Tumblr com o time comercial do próprio Yahoo, eliminando a estrutura dedicada que havia sido construída para lidar com marcas de forma mais alinhada à cultura da plataforma.

A transição foi descrita por ex-funcionários como “caótica”. Não houve plano de integração, nem adaptação ao perfil dos criadores e comunidades que impulsionavam o engajamento na rede. A medida interrompeu o ritmo de crescimento e desarticulou parcerias em andamento.

Com a mudança, a plataforma passou a exibir anúncios invasivos e perdeu parte da liberdade criativa que caracterizava a experiência do usuário.

A moderação de conteúdo foi reformulada sob pressão de anunciantes, com foco em tornar o ambiente mais “seguro” para marcas — um movimento que alienou comunidades centrais, como artistas independentes, criadores LGBTQIA+ e autores de conteúdo erótico consensual.

A estratégia falhou. Em 2016, o Yahoo anunciou um prejuízo de US$ 230 milhões relacionado ao Tumblr, reconhecendo publicamente que o investimento não havia dado retorno. A rede social perdeu audiência, a taxa de engajamento caiu e as metas comerciais ficaram cada vez mais distantes.

Em novembro de 2017, Karp anunciou sua saída da empresa. A decisão consolidou uma fase de esvaziamento estratégico. Sem Karp, o Tumblr perdeu a figura que servia de ponte entre o produto e sua comunidade. A partir dali, a plataforma entrou em um período de desorientação interna, agravado por problemas técnicos, queda de receita e estagnação da base de usuários.

O colapso de 2018

O evento tido como o mais destrutivo da história recente do Tumblr aconteceu em dezembro de 2018, com o banimento de todo conteúdo adulto, incluindo arte e pornografia consensual. A medida foi tomada após o aplicativo ser removido da App Store por permitir a circulação de material ilegal.

A resposta foi imediata. Em dois meses, o tráfego caiu 29%. Os posts diários, que eram 84 milhões em 2014, despencaram para 21 milhões em 2019. Estima-se que até 50% da atividade da plataforma estivesse ligada a conteúdos classificados como not safe for work, ou NSFW, (expressão em inglês usada para conteúdos que não seguros para se ver no trabalho).

Uma nova tentativa de recuperação

Em 2019, após a aquisição da Yahoo pela Verizon, o Tumblr foi considerado inviável. A plataforma foi vendida para a Automattic, controladora do WordPress, por uma quantia simbólica. A operação incluiu 200 funcionários e 475 milhões de blogs.

O CEO da Automattic, Mullenweg, anunciou planos ambiciosos de migração do backend do Tumblr para a estrutura do WordPress. O objetivo era reduzir custos e preparar a plataforma para integração com o fediverso, rede de plataformas sociais interoperáveis. A migração nunca foi realizada.

Em 2023, a Automattic realocou a maior parte dos funcionários dedicados ao Tumblr para outros projetos. A manutenção da plataforma foi entregue a uma equipe reduzida, com foco apenas em estabilidade e segurança básica.

O caso ganhou repercussão em 2024, quando Mullenweg baniu pessoalmente uma usuária trans e divulgou dados vinculados a uma conta associada. O episódio, apelidado de “Mullenweg Meltdown”, gerou críticas sobre prioridades da moderação. Enquanto isso, bots, conteúdo de ódio e spam seguiam circulando livremente.

David Karp: fundador do Tumblr (Enrique Dans from Madrid, Spain/Wikimedia Commons)

Comunidade ativa, jovem e fiel

Apesar da queda de relevância no mercado, o Tumblr manteve sua base ativa. Em 2025, são 12,8 milhões de posts por dia. O tempo médio de permanência é de 4,51 páginas por visita. Dos usuários, 31% acessam a rede diariamente, 86% semanalmente.

A demografia permanece jovem: 70% têm menos de 35 anos, com 40% da geração Z.  "O mais empolgante é como o Tumblr se tornou multigeracional: 65% das novas contas este ano são da geração Z", diz Andrii Nikitiuk, atual líder da rede social na Automattic, em entrevista exclusiva à EXAME

Para Nikitiuk, o apelo cultural da rede segue firme. "Em muitos aspectos o Tumblr continua o mesmo em sua essência, um lar para fandoms, artistas e criadores que definem a cultura da internet", afirma.

Ele destaca ainda a influência que a rede exerce sobre o comportamento digital atual. "Estamos vendo um ressurgimento de tags da era 2014, estéticas virais e memes que começam no Tumblr antes de aparecerem no TikTok e Instagram", diz.

A base de blogs cresceu — são 618 milhões, alta de 19% desde 2023 —, e o tempo médio por sessão é de 13 a 14 minutos. Em outubro de 2025, o site registrou 165,28 milhões de visitas, uma recuperação modesta sobre o fundo do poço em 2023, mas ainda 69% abaixo do pico de 2018.

A estratégia da plataforma, segundo Nikitiuk, está centrada na manutenção da identidade original.

"Nossa prioridade é manter a plataforma aberta e criativa. Estamos investindo nos comportamentos que fazem o Tumblr ser o Tumblr, como reblogs, notas e descoberta", afirma. "O Tumblr foi e ainda é construído para participação, não perfeição. Onde outras redes priorizavam seguidores, o Tumblr valorizava descoberta, remix e diálogo".

Resistência cultural sem retorno financeiro

O Tumblr ainda abriga 618 milhões de blogs. É uma rede onde a descoberta, o remix e a participação seguem como fundamentos. "O Tumblr foi e ainda é construído para participação, não perfeição", disse Nikitiuk. “Reblogar era nossa linguagem muito antes de ‘repost’ virar padrão em outras plataformas”.

Sem conseguir atrair anunciantes e sem estrutura técnica viável para crescer, a plataforma opera como exceção em um ecossistema dominado por algoritmos e monetização agressiva.

"É provavelmente meu maior fracasso ou oportunidade perdida... mas ainda estamos trabalhando nisso", disse Mullenweg no WordCamp Canada 2025. Um jeito de negar que a rede social tenha morrido por completo. A verdade, no entanto, é que respira por aparelhos, sem previsão de alta ou de piora nos próximos anos.

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