Orkut: comunidades fizeram sucesso entre os brasileiros (Orkut/Reprodução)
Repórter
Publicado em 2 de novembro de 2025 às 10h09.
Última atualização em 2 de novembro de 2025 às 11h29.
Com mais de 36 milhões de usuários em seu auge, o Orkut foi uma febre entre os brasileiros nos anos 2000 — e a derrocada foi tão icônica quanto o ápice. A plataforma, criada em 2004 pelo engenheiro turco Orkut Büyükkökten, virou sinônimo de rede social para uma geração inteira, dominando o mercado no Brasil por quase uma década.
Mas em 30 de setembro de 2014, o Google desligou oficialmente os servidores da rede social.
O encerramento do Orkut foi resultado de uma combinação de fatores técnicos, estratégicos e de mercado, com destaque para a ascensão fulminante do Facebook, que passou a oferecer funcionalidades atualizadas, como feed de notícias, melhor privacidade e usabilidade adaptada para dispositivos móveis.
Era 2004 quando Orkut criou a rede que conquistaria o Brasil.
O engenheiro turco Orkut Büyükkökten lançou a plataforma que levava seu nome em 22 de janeiro de 2004, dentro de um programa do Google que permitia aos funcionários dedicar parte do tempo a projetos pessoais. A proposta da rede social era simples: criar um espaço digital para conectar pessoas com interesses em comum.
Antes disso, Büyükkökten já havia desenvolvido duas redes sociais na Universidade de Stanford: o Club Nexus, voltado a estudantes, e o inCircle, focado em ex-alunos. Ambas as experiências serviram de base para o Orkut, que nasceu inicialmente com o nome Eden, e foi testado entre funcionários do Google antes de ser lançado ao público.
O nome da plataforma foi escolhido a pedido da liderança do Google, que sugeriu o uso do próprio nome de seu criador, tanto por originalidade quanto pela simplicidade de domínio. Mesmo com limitações técnicas — a previsão era de suportar até 200 mil usuários — o Orkut explodiu em popularidade logo após o lançamento, impulsionado pelo formato de convites exclusivos e uma comunidade engajada.
O crescimento foi particularmente rápido no Brasil e na Índia, que se tornaram os dois maiores mercados da rede social. Ainda em 2004, a plataforma já tinha versões em vários idiomas e uma base sólida de usuários fora dos Estados Unidos — onde, ironicamente, nunca teve grande alcance.
Avaliação de amigos: ferramenta mostrava o que os amigos achavam um dos outros (Orkut/Reprodução)
Em pouco tempo, o Brasil se transformou no principal mercado do Orkut, superando os Estados Unidos em número de usuários.
O sucesso foi resultado de uma combinação de fatores únicos. O espírito comunitário dos brasileiros se encaixou naturalmente no formato das comunidades, onde milhões de pessoas discutiam de tudo — de música e política a humor e confissões cotidianas. O
Orkut virou uma espécie de espelho social do país: criativo, acolhedor e cheio de ironia. Comunidades como “Eu odeio acordar cedo” ou “Tô com fome e já escovei os dentes” marcaram uma era e revelaram o tom leve e afetivo com que os brasileiros usavam a internet.
Outro fator foi o timing perfeito. O Orkut surgiu quando o acesso à internet começava a se popularizar, principalmente por meio das lan houses, e oferecia uma interface simples e colorida, fácil de usar até para quem estava online pela primeira vez. O site também carregava o prestígio do Google, o que transmitia segurança aos novos usuários em um momento em que a confiança digital ainda estava em construção.
Há também um toque de sorte na história.
O ativista John Perry Barlow, um dos primeiros a receber convites do criador, distribuiu boa parte deles para brasileiros. Esse gesto ajudou o país a se tornar o primeiro polo global do Orkut. O nome fácil de pronunciar, o visual com cores semelhantes às da seleção brasileira e o acesso inicial apenas por convite (que dava um ar de exclusividade) completaram a fórmula de sucesso.
No auge, 11 milhões dos 14 milhões de internautas brasileiros estavam no Orkut, uma penetração digital que o Facebook levaria sete anos para alcançar. O Google percebeu rapidamente o protagonismo do Brasil e adaptou o site ao público local, traduzindo toda a interface para o português e reconhecendo oficialmente: o Orkut era, acima de tudo, uma rede social brasileira.
No anúncio do encerramento, o Google foi direto: “YouTube, Blogger e Google+ decolaram, enquanto o Orkut não acompanhou esse crescimento”. A declaração veio de Paulo Golgher, então diretor de engenharia da empresa, sinalizando que o foco do Google migraria para outras plataformas.
A decisão, porém, teve raízes mais profundas. O código-fonte do Orkut era considerado tecnicamente ultrapassado, com base em ferramentas da Microsoft. Engenheiros da empresa alegavam que não havia como escalar a plataforma de forma eficiente.
“Eles deixaram morrer. Quando reescreveram de forma aceitável, o Orkut já estava morto fora do Brasil”, disse Paul Buchheit, criador do Gmail, à época.
O Orkut também não oferecia recursos modernos que rapidamente se tornaram padrão em redes sociais — como controle de privacidade, timeline personalizável e integração mobile. O Facebook, com um design mais dinâmico, conquistou o público global e, a partir de 2011, ultrapassou o Orkut em número de usuários no Brasil.
Em junho de 2014, o Google anunciou oficialmente o encerramento da rede, marcado para setembro do mesmo ano. As comunidades públicas foram arquivadas, mas esse acervo foi desativado em 2017. Com o fim da plataforma, a marca foi devolvida a Orkut Büyükkökten, seu criador.
Apesar do fracasso, o Orkut deixou um legado: popularizou o uso da internet social no Brasil, foi palco de discussões, amizades e até relacionamentos. Frases como “Sou legal, não estou te dando depoimento por isso” ou “Scraps” entraram de vez no vocabulário popular.
Em 2022, o site orkut.com foi reativado com uma mensagem: “Estamos construindo algo novo”.
Büyükkökten afirmou no ano passado que trabalha em uma nova plataforma, desta vez focada em inteligência artificial (IA). Ainda sem nome ou data de lançamento, o projeto promete resgatar a essência de interação mais humana que o Orkut promovia, agora com recursos modernos.
Enquanto isso, para muitos, o Orkut permanece como um símbolo nostálgico da primeira geração das redes sociais. E uma lembrança viva de uma era em que as comunidades falavam mais do que mil palavras.