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Setor de mel sugere que governo arque com tarifa de 50% de Trump para manter as cadeias de produção

Mais de 40 mil famílias dependem da produção de mel orgânico, aponta Samuel Araújo, CEO do Grupo Sama

Samuel Araújo, CEO do Grupo Sama, que produz mel orgânico (Divulgação)

Samuel Araújo, CEO do Grupo Sama, que produz mel orgânico (Divulgação)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 5 de agosto de 2025 às 17h57.

Última atualização em 5 de agosto de 2025 às 18h50.

Produtores de mel orgânico no Piauí, um dos setores mais afetados pelo tarifaço do presidente americano Donald Trump, estão negociando opções de auxílio com os governos federal e estadual. Uma das propostas feitas por eles é que as autoridades paguem o valor das novas taxas, para manter a exportação dos itens.

"O governo custear esta tarifa, ou parte dela, seria uma das alternativas para a gente negociar com nossos clientes lá fora", diz Samuel Araújo, CEO do Grupo Sama, que produz mel orgânico. Segundo ele, há cerca de 40 mil famílias no Nordeste que dependem da venda do mel, especialmente no Maranhão e no Piauí.

"Também estamos pedindo linhas de crédito subsidiado para garantir a manutenção da cadeia. Temos um custo alto, porque precisamos ter as licenças em dia para exportação. Eu compro do micro e pequeno produtor, mas tenho minhas licenças, como True Source e Halal, que são caras de manter se não está exportando no volume que tem de exportar", afirma Araújo.

Segundo Araújo, cerca de 40 mil famílias no Brasil dependem do mel para se sustentarem. "O mel é uma atividade de subsistência, e uma redução ou interrupção nas compras do produto atinge toda essa cadeia de pequenos e micro produtores, com grande impacto social”, diz.

Um terceiro pedido ao governo é que sejam liberados créditos de PIS/Cofins e ICMS aos produtores, e que as negociações continuem para tentar reduzir as taxas ou obter mais isenções, como foi feito com suco de laranja e aviões, por exemplo.

Araújo pede ainda que as medidas sejam tomadas rapidamente, para preservar empregos e evitar que as cadeias de produção sejam desmontadas.

"Você vai demitir um cara que tem importância para a cadeia. Ele foi treinado, sabe do metiér, dos blends, de tudo. Aí eu boto esse cara para fora, ele vai para outro lugar e isso cria um desequilíbrio", afirma.

Tarifa de 50% inviabiliza os negócios

Araújo avalia que a taxa de 50% torna os negócios inviáveis, e que há dúvidas se será possível encontrar outro destino do porte dos EUA para o mel orgânico.

"Se a gente for reduzir o preço em 50% [para absorver a tarifa], é meio que inviabilizar a atividade, que já teve dois anos difíceis por quedas na produção", diz.

"O Brasil é o maior produtor de mel orgânico do mundo. De tudo que produzimos, de 85% a 90% vai para os Estados Unidos. Algo entre 45 mil a 60 mil toneladas por ano", afirma.

Mel: produto é muito consumido como alimento nos EUA e na Europa (da-kuk/Getty Images)

"O brasileiro não consome mel. Ele associou o mel a um remédio, não a um alimento energético, que tem proteína, sais minerais. Não temos esse hábito como o americano e o europeu têm", diz o CEO.

Além disso, o mercado europeu tem mais exigências que o americano. "O mercado alemão exige muito e paga pouco", afirma Araújo.

No mundo, os produtores de mel brasileiros concorrem principalmente com Vietnã e Índia, mas têm a vantagem de conseguir enviar o produto mais facilmente para EUA e Europa, pela distância, de sete a oito dias de viagem de navio.

Nos EUA, segundo Araújo, 90% da produção de mel é usada para polinização, e só 10% são destinados ao consumo humano, o que faz com que as importações não afetem a indústria local

Entenda as tarifas de Trump contra o Brasil

Em 30 de julho, Trump assinou uma ordem executiva impondo uma tarifa de importação de 50% aos produtos brasileiros. A cobrança entra em vigor nesta quarta-feira, 6 de agosto.

A medida, no entanto, isenta uma série de produtos que o Brasil exporta aos EUA, incluindo suco de laranja, minérios, aeronaves e petróleo. A lista completa soma cerca de 700 itens.

Ao mesmo tempo, a taxa vai incidir sobre outros itens importantes da pauta de exportações brasileiras, como a carne e o café, o que poderá inviabilizar exportações brasileiras, além do mel.

A medida coloca 40% adicionais de tarifas sobre a taxa de 10% anunciada em abril, adotada para todos os países, somando 50%. Assim, os itens isentos agora ficarão com tarifa de 10%.

Como justificativa, o governo americano disse que a ação é uma "resposta a políticas, práticas e ações recentes do Governo do Brasil que constituem uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos", disse a Casa Branca, em comunicado.

"O presidente Trump está defendendo empresas americanas contra extorsão, protegendo cidadãos americanos da perseguição política, salvaguardando a liberdade de expressão nos EUA contra a censura e salvando a economia americana de estar sujeita aos decretos arbitrários de um juiz estrangeiro tirânico", diz a nota.

Além da tarifa, o presidente americano determinou uma investigação contra o Brasil por práticas comerciais desleais, com base na seção 301. O processo está andamento e deverá ser concluído nos próximos meses. Por meio dele, o Brasil poderá sofrer punições comerciais adicionais.

Nas últimas semanas, o governo brasileiro buscou negociar a nova tarifa com os Estados Unidos, mas não obteve sucesso. Apesar disso, membros do governo Lula avaliam que o espaço para negociações permanece aberto.

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