O metanol é produzido naturalmente durante a fermentação de alguns carboidratos, porém apenas se torna um risco em concentrações mais altas, que podem ser atingidas por meio da destilação feita de forma inadequada (invizbk/Getty Images)
Estagiária de jornalismo
Publicado em 3 de outubro de 2025 às 14h58.
Nesta última semana, casos crescentes de intoxicação por metanol geram preocupação no Brasil. Até o momento, o número de casos suspeitos em São Paulo já subiu para 41, além de seis mortes suspeitas e outros 11 casos confirmados. Há ainda ocorrências sendo investigadas em Pernambuco, na Bahia e em Brasília.
Algumas casas noturnas em São Paulo já suspenderam a venda de destilados, dado o alerta nacional. A Polícia Federal iniciou nesta sexta-feira, 3, operações de fiscalização em fábricas de bebidas adulteradas no interior de São Paulo, na região de Campinas, em Chapecó e Joinville (Santa Catarina) e em Poços de Caldas (Minas Gerais). Nesta quinta-feira, um homem de 53 anos foi preso pela Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), suspeito de falsificar e adulterar bebidas alcoólicas.
Nesse turbilhão de informações, a população busca formas seguras de consumir bebidas alcoólicas e formas de se prevenir de uma intoxicação. Para responder a algumas das principais perguntas sobre o metanol, a EXAME entrevistou Thiago Carita Correra, professor do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ USP).
O etanol, substância química que caracteriza as bebidas alcoólicas, é gerado por meio de processos de fermentação alcoólica. Neles, carboidratos são digeridos por leveduras, um tipo de fungo microscópico, que expelem etanol como produto final da digestão.
A base para essa fermentação varia conforme a bebida alcoólica. No caso da cerveja, grãos como trigo, cevada e malte são usados e vinhos são produzidos com uvas. O metanol pode também ser gerado pelas leveduras como produto secundário, em doses baixíssimas, na fermentação.
Já as bebidas destiladas, como whisky, vodca e cachaça, passam por um segundo processo. Elas são produzidas por meio da fervura e destilação do álcool de uma base fermentada. Por exemplo, o conhaque é produzido ao ferver e destilar o vinho. A destilação é o principal momento em que uma bebida pode atingir doses tóxicas de metanol.
"O metanol não é produzido em grande quantidade na fermentação comum, mas pode surgir em pequenas quantidades a partir das pectinas [um tipo de carboidrato] presentes em frutas ou vegetais, como na produção do vinho. Esse processo é comum e gera concentrações baixas, que não oferecem risco quando a produção segue padrões corretos. O risco seria maior em bebidas destiladas de forma inadequada, se o método não for conduzido da forma correta", explica Correra.
Para se evitar isso, um passo essencial do processo de destilação é o descarte da primeira fase destilada.
"O metanol tem um ponto de ebulição mais baixo que o etanol e tende a se concentrar nas chamadas 'cabeças' da destilação, a primeira fração coletada. O equipamento tem que ser capaz de permitir essa separação e ser operado de forma correta, se não, o metanol pode permanecer em quantidades perigosas", conforme o professor.
A produção adequada segue precauções específicas, como se pode ver no vídeo abaixo:
O metanol não tem cheiro, cor ou sabor. Por isso, saber se uma bebida está contaminada ou não, e a dose presente, é apenas possível por meio de testes em laboratórios.
O Correra detalha alguns desses testes. "Existem métodos laboratoriais confiáveis, como cromatografia gasosa, capazes de detectar metanol com precisão. Mas esses testes só podem ser feitos em laboratórios especializados, não em bares ou restaurantes. O que os estabelecimentos podem fazer é adquirir bebidas apenas de fabricantes e distribuidores regulamentados, que já passam por esse tipo de controle."
Correra diz que o risco de intoxicação está quase sempre em produtos clandestinos, falsificados ou vendidos sem controle de procedência. Preços muito abaixo do normal e bebidas de origem duvidosa devem ser evitados pelo consumidor.
"O mais importante é consumir apenas bebidas de origem conhecida, com selo fiscal e registro nos órgãos reguladores. A experiência internacional mostra que a resposta passa por fiscalização intensa e rastreamento das bebidas falsificadas, além de campanhas públicas de conscientização."