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Rafael Barros, fundador do Amazônia na Cuia: restaurante cresceu a uma média de 115% nos últimos anos (Leandro Fonseca/Exame)
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 25 de novembro de 2025 às 17h13.
BELÉM — PARÁ — Em meio à COP30, em Belém, as filas que se formavam diante de um restaurante a poucos metros da conferência do clima da ONU viraram parte da paisagem do evento. O paraense Amazônia na Cuia atraiu delegações, turistas e moradores, transformando-se não só em vitrine da gastronomia local, mas também em um caso de negócios que ajuda a explicar como a COP30 ajudou a movimentar a economia da cidade.
Fundado em 2018 por Rafael Barros, o restaurante viu o faturamento crescer de R$ 4 milhões em outubro para uma projeção de R$ 5 milhões em novembro, impulsionado pelo fluxo recorde de turistas atraídos pela conferência do clima.
O avanço ocorreu sem reajuste de preços, decisão que Barros tratou como estratégica para preservar a reputação da marca.
“Minha preocupação era que os turistas tivessem a impressão de que estavam sendo explorados. Então mantivemos absolutamente todos os preços”, diz o fundador.
Barros, hoje com 35 anos, abriu a primeira unidade com apenas 5 m², um colaborador e seis pratos vendidos na calçada. Antes disso, já tinha passado por diferentes ocupações e empreendimentos, da arena de futebol ao pôquer profissional, da barbearia a negócios que não deram certo.
Foi após esse ciclo que ele formatou o conceito do Amazônia na Cuia, com a ideia de unir gastronomia, identidade regional e experiência turística.
Na cultura amazônica, a cuia ocupa um papel central. Mais que um utensílio, é um símbolo de identidade e tradição, refletindo a relação da população com a floresta. Produzida a partir do fruto da cuieira (Crescentia cujete), ela atravessa gerações e está presente no cotidiano, na culinária, no artesanato e em rituais comunitários.
Amazônia na Cuia: terceira unidade, no bairro do Marco, em Belém, contou com investimentos de R$ 4,5 milhões (Leandro Fonseca/Exame)
Quando as restrições sanitárias fecharam a cidade, a operação migrou para o apartamento onde ele vivia com a esposa. Em vez de interromper a atividade, passou quase um mês produzindo dentro de casa e entregando pedidos a motoboys na portaria do prédio.
O improviso mudou o patamar do negócio: no primeiro mês após a reabertura, o faturamento chegou a R$ 50 mil, quase o dobro do período anterior.
A partir daí, o restaurante escalou rapidamente — primeiro para um espaço de 20 m², depois para uma unidade de 144 m², aquisição de imóvel vizinho e expansão até atingir 240 lugares. O faturamento mensal ultrapassou R$ 1,6 milhão.
Hoje, a rede opera três unidades, soma mais de 2.000 m² de área construída, tem 210 colaboradores e atende cerca de 30 mil pessoas por mês. Neste mês, com a COP30, a projeção é de 50 mil clientes.
A curva financeira acompanha esse salto: em 2024, o Amazônia na Cuia faturou R$ 17 milhões; em 2025, a estimativa é de R$ 40 milhões. Nos últimos quatro anos, a expansão média foi de 115% ao ano.
A média de crescimento do negócio supera as projeções para o segmento de bares e restaurantes. Para o setor, a estimativa é de alta de 6,9% em 2025, segundo o Instituto Foodservice Brasil (IFB), após uma expansão de 3,2% em 2024.
A terceira unidade, no bairro do Marco, em Belém, foi planejada para capturar o movimento da conferência. O investimento de R$ 4,5 milhões — composto por capital próprio e um empréstimo bancário, o primeiro desde a fundação do restaurante — transformou o espaço em uma operação com cerca de 130 funcionários.
Durante a COP30, Barros colocou intérpretes em todas as unidades, traduziu o cardápio para cinco idiomas e reforçou as equipes com freelancers. Ainda assim, a demanda permaneceu constante do meio-dia à meia-noite.
Restaurante em Belém: comidas são servidas em cuia, utensílio que tem um papel central na cultura amazônica (Leandro Fonseca/Exame)
Segundo o fundador, o modelo de crescimento se apoia em três pilares: autenticidade, padronização e cultura organizacional. A proposta, afirma ele, sempre foi levar elementos da cultura amazônica aos pratos.
“O restaurante se posiciona como uma experiência amazônica, com ambientação construída por turismólogos, artesãos, historiadores e arquitetos, cuias pintadas à mão e até um deck com peixes regionais vivos. A operação é padronizada e rápida, estruturada como linha de montagem para garantir agilidade. A equipe passa por treinamento formal, com manual interno, prova de conteúdos e aulas de atendimento”, diz.
Agora, o plano é transformar a vitrine criada em Belém em expansão nacional e internacional. A meta é abrir dez unidades até 2029, com São Paulo, Brasília e Manaus no radar, além de Lisboa como aposta inicial fora do país.
Barros descarta franquias e pretende crescer por meio de sociedades com gestores formados dentro da própria empresa, incluindo participação societária para parte deles.
O principal desafio será estruturar a logística necessária para levar insumos amazônicos frescos a outras regiões. Hoje, a rede consome 1,5 tonelada de pirarucu por mês, cerca de 700 quilos de filhote e seis toneladas de camarão. Tudo de produtor local.
“A partir de dezembro, pretendo viajar, conhecer melhor algumas regiões, conversar com investidores e entender quais são os locais mais adequados para uma futura expansão. Sabemos que a escolha do ponto é decisiva para o sucesso do negócio, e esse será um dos principais critérios na definição dos próximos passos”, afirma.