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62,6% dos PLs sobre pessoas trans nos últimos 10 anos são para ampliar direitos, aponta pesquisa

Desde 2015, foram aprovadas 21 propostas que aumentam garantias e 9 que restringem

O levantamento apresenta diversos aspectos da dinâmica da disputa política na última década em torno dos direitos das pessoas transgênero (Vladimir Vladimirov/Getty Images)

O levantamento apresenta diversos aspectos da dinâmica da disputa política na última década em torno dos direitos das pessoas transgênero (Vladimir Vladimirov/Getty Images)

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Publicado em 24 de junho de 2025 às 13h00.

Desde 2015, foram apresentados, ao menos, 664 projetos de lei relacionados a pessoas transgêneras nas assembléias legislativas dos 26 estados brasileiros e na Câmara Legislativa do Distrito Federal. Desse montante, 416 propostas (62,6%) buscam ampliar direitos e 248 (37,3%) restringir. Os dados são de levantamento inédito da Nexus – Pesquisa e Inteligência de Dados.

Além dos PLs pró direitos LGBTQIA+ serem mais recorrentes, 21 deles foram aprovados, número superior às 9 propostas de restrição de garantias desse grupo que se tornaram lei no mesmo período. Entre os temas que avançaram, estão garantias de uso do nome social, campanhas contra discriminação, sanções à transfobia e aprimoramento de dados sobre a população LGBTQIA+ , dentre outros (veja detalhes na tabela).

No grupo das propostas favoráveis às pessoas trans que se tornaram leis estaduais, Pernambuco é o estado que se destaca, com 4 projetos de lei, seguido pelo Acre e pelo Maranhão, ambos com 3. A maioria (16) foi proposta por deputados de partidos de esquerda, como PDT, PSB, PCdoB, PSol e PT. Outros 3 PLs são da deputada pernambucana Socorro Pimentel, do União Brasil, legenda de direita, e 2 são de parlamentares de siglas de centro (MDB e Podemos).Já as 9 propostas que resultaram em lei restritivas aos direitos dos transgêneros se concentram mais no Amazonas (3) e no Maranhão e Alagoas (ambos estados com duas cada um). A maioria (7) foi apresentada por parlamentares de partidos direita, uma de centro e outra por deputados de centro e de direita. Nesse grupo, estão medidas que restringem atividades escolares, estabelecem o sexo biológico como critério para partidas esportivas, proíbem o uso de bloqueadores hormonais e de banheiros unisex. 

2023 registra pico de propostas

O pico de PLs estaduais relacionados a transgêneros foi registrado em 2023, ano em que 218 propostas (33%) foram protocoladas. No período analisado de uma década, os projetos de lei de restrição de garantias oscilam mais. Já os textos que buscam ampliar prerrogativas apresentam crescimento até 2021 e oscilação nos anos seguintes.

Dos 344 projetos apresentados só por parlamentares de partidos de esquerda, 341 (99%) são de expansão de direitos e 3 (1%) são de restrição. Já dos 233 PLs protocolados só por parlamentares de direita, 196 são de restrição (84%) e 37 são de expansão (16%).

Embora haja essa relação entre o objetivo das propostas e o espectro político, a atuação legislativa nessa temática não é limitada pela ideologia do partido pelo qual o deputado estadual se elegeu.

Dos 416 projetos de lei favoráveis aos LGBTQIA+ , 341 (82%) têm como autores apenas parlamentares de esquerda, 30 só centro (7%) e 37 (9%) só direita, uma participação significativa do campo tradicionalmente identificado com a restrição de garantias. As propostas de deputados dos três espectros políticos somam cerca de 2%.

Já dos 248 projetos de restrição de direitos, 196 têm como autores apenas parlamentares de direita (79%), 38 de centro (15%) – uma participação maior do que no outro grupo – e 3 de esquerda (1%). As propostas de autores dos 3 espectros somam 3%. Um PL, de 2023, é fruto da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de Tratamento para Transição de Gênero em Crianças e Adolescentes no HC-São Paulo, da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).

Segurança, uso de nome social e emprego lideram propostas favoráveis

Entre as propostas favoráveis às pessoas LGBTQIA+, os temas mais recorrentes são segurança (54), uso de nome social (53) e emprego e concurso (38), especialmente reserva de vagas. O primeiro grupo inclui PLs que estabelecem medidas para proteção contra discriminação em estabelecimentos comerciais e obrigam o registro de violência contra pessoas trans, por exemplo.

Em 4º lugar nos temas, com 35 propostas, estão normas relacionadas à administração pública, como a proibição de contratação de empresa condenada por discriminação e a responsabilização da administração pública por terapias de conversão, popularmente conhecidas como “cura gay”. Os PLs relacionados à saúde somam 34, seguidos por educação (27), campanhas contra discriminação (21), sanções à discriminação (18), assistência social (14), esportes (10), sistema penitenciário (8), uso de banheiro (3) e linguagem (2). A categoria outros soma 99 textos.

Das 18 propostas que punem atos transfóbicos, 5 foram apresentadas antes de 2019, ano em que o Supremo Tribunal Federal criminalizou a LGBTfobia. Outras 13 foram apresentadas de 2019 em diante.

Escola sem partido, competições esportivas e terapia hormonal lideram PLs restritivos

Entre os projetos de lei que limitam direitos dos transgêneros, o tema mais recorrente é educação, com 69 propostas. Três delas fazem menção à “escola sem partido”, movimento defensor da restrição da atuação dos professores.

O segundo tema mais comum são esportes (38 PLs), com foco no estabelecimento do sexo biológico para participação em competições. Em terceiro lugar, com 35 ocorrências, estão os projetos da saúde, majoritariamente proibitivos da hormonioterapia. O uso de banheiro (32 PLs) é o 4º tema mais comum, seguido pelas restrições à linguagem neutra (29).

Três PLs relacionados a pessoas trans foram vetados

Apenas três projetos de lei estaduais relacionados a pessoas trans foram vetados entre 2015 e 2025. O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo) vetou o PL 2316/2020 do deputado André Quintão (PT) que punia empresas em que proprietário, dirigente, preposto ou empregado, no exercício da atividade profissional, discriminasse, coagisse ou atentasse contra direitos de alguém em razão de sua orientação sexual, identidade de gênero ou sua expressão de gênero.

No Maranhão, em sentido contrário, o governador Carlos Brandão (PSB) vetou o PL 205/2021 – contra a linguagem neutra – e o PL 558/2021, que proibia banheiros multigênero, ambos da deputada Mical Damasceno (PSD).

Além das propostas aprovadas e vetadas, no grupo que amplia garantias, 121 foram arquivados (29%), 265 estão em tramitação (64%), 6 foram retirados pelo autor(a) (1,4%), 1 foi rejeitado e outro prejudicado, somando 0,2% cada. Já  entre os PLs contrários aos direitos LGBTQIA+, 74 foram arquivados (30%), 162 estão em tramitação (65,6%) e 1 foi retirado pelo autor (0,4%).

São Paulo e Rio concentram 42% das propostas

Os estados de São Paulo e do Rio de Janeiro concentram 42% das propostas relacionadas a direitos trans apresentadas nas assembleias legislativas no período analisado. São 153 da Alesp e 126 da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). Em 3º lugar, está Pernambuco, com 39 registros, seguido por Minas Gerais (36) e Mato Grosso (27).

Na outra ponta, Tocantins e Rondônia são os estados onde o tema é menor recorrente, com apenas um registro cada. Acre, Piauí e Roraima somam 3 projetos de lei cada e Amapá contabiliza 5 propostas.

Em São Paulo, dos 153 projetos, 118 são de expansão de direitos, o equivalente a 77%. Outros 35 (23%) restringem prerrogativas. No Rio, das 126 propostas, 88 buscam ampliar os direitos LGBTQI+ (70%) e outras 38 restringir (30%).

“O levantamento apresenta diversos aspectos da dinâmica da disputa política na última década em torno dos direitos das pessoas transgênero. É notável a concentração do debate no eixo Rio-São Paulo, que tem forte influência nacional, além de maior destaque na mídia. Também chama atenção que, apesar do grande volume de PLs que restringem garantias, especialmente relacionados ao uso de banheiros, competições esportivas e Escola sem Partido, temas recorrentes no debate público, também foi registrado significativo avanço na expansão de direitos LGBTQIA+ no período analisado”, afirma o CEO da Nexus, Marcelo Tokarski.

Metodologia

O levantamento da Nexus foi feito a partir da busca dos termos “transgênero”, “transexual”, “transexuais”, “gênero” e “sexo” em todos sites das assembleias legislativas dos estados brasileiros e na Câmara Legislativa do Distrito Federal e da análise desses resultados. Os dados foram levantados entre 16/05/2025 e 04/06/2025 e incluem propostas apresentadas desde 2015.

Foram incluídas tanto propostas exclusivas sobre direitos LGBTQIA+ quanto sobre outros temas – como violência doméstica e pessoas em situação de rua – que citassem especificamente pessoas trans. Foram excluídos PLs com números distintos apresentados pelo mesmo autor(a) com a mesma ementa, a fim de evitar duplicidade.

Para classificar o espectro político dos partidos, foi considerada a legenda pela qual o deputado foi eleito no pleito anterior ao projeto de lei apresentado. No grupo de centro estão: Agir, Avante, MDB, Mobiliza, PMB, Podemos, PP, PSD e Solidariedade. Cidadania, Democracia Cristã, Novo, PL, PRD, PRTB, PSDB, Republicanos e União Brasil foram classificados como de direita. As siglas consideradas de esquerda são PCdoB, PDT, PSB, PT, PV e Rede, além do PPS (antigo Cidadania).

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