O alívio nos preços de alimentos é uma notícia positiva, especialmente para os mais vulneráveis, mas não podemos ignorar a pressão de custos essenciais (Leandro Fonseca/Exame)
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Publicado em 19 de agosto de 2025 às 07h00.
O mais recente boletim de inflação do Pacto Contra a Fome revela um cenário econômico de contrastes para o consumidor brasileiro em julho de 2025. Embora o grupo de Alimentos e Bebidas tenha registrado uma queda de -0,27% no IPCA, a segunda consecutiva, o alívio para o bolso das famílias foi parcialmente neutralizado por outros custos essenciais e obrigatórios, como a energia elétrica, que voltou a exercer o maior impacto individual sobre o índice.
A análise, que aprofunda a discussão sobre os dados de inflação, aponta que a pressão sobre o orçamento doméstico persiste. Segundo o relatório, o IPCA avançou 0,26% em julho, com altas significativas em Habitação (+0,91%), Despesas Pessoais (+0,76%) e Transportes (+0,35%). A tarifa de energia elétrica, em particular, subiu +2,97%, mantendo restrições sobre a renda disponível, especialmente para famílias de menor poder aquisitivo.
A pesquisa também destaca que o alívio da inflação de alimentos não foi igual para todos. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a variação para famílias com renda entre 1 e 5 salários mínimos, registrou uma queda mais acentuada nos alimentos e bebidas (-0,38%), em comparação com o IPCA (-0,27%). Essa diferença indica um ganho proporcionalmente maior no custo de vida das famílias mais vulneráveis.
Um dos pontos de maior atenção do boletim é o "paradoxo dos alimentos saudáveis". Com o aumento das despesas não comprimíveis, a busca dos brasileiros tende a caminhar para alimentos com baixa qualidade nutricional, contribuindo para a insegurança alimentar. Embora os preços de alimentos in natura e minimamente processados tenham caído -1,37% em julho, a variação acumulada nos últimos 12 meses foi de 7,96%. Esse índice é superior ao dos produtos ultraprocessados, que registraram inflação de 6,72% no mesmo período.
"Embora a queda nos preços dos alimentos seja uma notícia positiva, nosso boletim mostra que a realidade econômica é complexa. O alívio para as famílias de menor renda com a alimentação é crucial, mas a pressão de custos essenciais como energia e serviços ainda limita o ganho líquido no orçamento", afirma Ricardo Mota, Gerente de Inteligência Estratégica do Pacto Contra a Fome. "O cenário de inflação mais alta para alimentos saudáveis no acumulado do ano também acende um alerta sobre as barreiras que a população enfrenta para ter acesso a dietas nutritivas".
Essas tendências de curto prazo se desenrolam em um contexto histórico de conquistas. Recentemente, o Brasil alcançou o critério da Prevalência de Subalimentação (PoU) abaixo de 2,5%, saindo novamente do Mapa da Fome. No entanto, o relatório SOFI 2025 alerta que, mesmo com essa vitória, a insegurança alimentar moderada e severa ainda afeta 28,5 milhões de pessoas.
O cenário nacional, impactado pelas tarifas de 50% na exportação de uma lista de produtos brasileiros, requer atenção.
“Apesar dos sinais positivos no controle de preços de alguns alimentos, a economia brasileira pede cautela. O recente reajuste tarifário norte-americano ameaça enfraquecer setores estratégicos, com potencial de provocar uma desaceleração econômica e aumento de desemprego. O risco iminente é de que a insegurança alimentar e a fome retomem a curva de crescimento, comprometendo avanços recentes e recolocando milhões de brasileiros em situação vulnerável”, alerta Ricardo Mota.
“O alívio nos preços de alimentos é uma notícia positiva, especialmente para os mais vulneráveis, mas não podemos ignorar a pressão de custos essenciais como energia e serviços, que limitam o ganho real no orçamento. A saída do Brasil do Mapa da Fome é um marco histórico, mas o desafio continua. O nosso boletim serve como um lembrete de que a sustentabilidade dos avanços depende da nossa capacidade de enfrentar tanto os desafios de curto prazo, como a inflação, quanto as desigualdades persistentes que a insegurança alimentar nos impõe”, diz Ricardo.