Flávio Canto, judoca brasileiro e fundador do Instituto Reação: “Aprendi com a luta que o grande adversário está dentro da gente” (Sólides/Divulgação)
Repórter
Publicado em 3 de setembro de 2025 às 06h07.
Em japonês, dō significa caminho. Por isso o judô (caminho suave) e o taekwondo (o caminho dos pés e das mãos) carregam o mesmo final. Para Flávio Canto, judoca olímpico e fundador do Instituto Reação, escola social de judô para crianças e adolescentes, esse 'caminho' vai além do tatame - é também um método de gestão e de vida.
“Na luta aprendemos que o grande adversário está dentro da gente. Por isso sempre reforço que precisamos ser faixas pretas dentro e fora do tatame”, afirma Canto que foi um dos palestrantes durante o evento “Leader Shift”, realizado pela Sólides, nesta terça-feira, 3, em Belo Horizonte para mais de 1.500 líderes de diferentes empresas do Brasil.
A tensão extrema das competições de judô, para ele, funciona também como um treino poderoso para a vida. Uma das lições que ele traz para o ambiente corporativo é o de aprender a cair e a se levantar. “Foi o judô que me ensinou a cair e levantar, e isso fez diferença não apenas como atleta, mas em todas as escolhas da minha vida”, diz.
“Se você não sabe cair, não está preparado para aprender a derrubar no judô. No corporativo, se você não sabe perder, você não está preparado para vencer”, afirma o judoca.
Flávio Canto, judoca olímpico e fundador do Instituto Reação: “As perdas ensinam mais que os pódios" (Sólides/Divulgação)
A relação de Canto com o judô começou ainda na infância. Filho de um físico formado na Inglaterra, Canto nasceu em solo britânico, mas foi criado no Brasil. Durante a infância, após apanhar dos colegas da escola, decidiu apostar no esporte para se autodefender.
"Nos primeiros treinos, eu apanhava tanto no tatame quanto no ambiente escolar. A diferença é que, ali, a 'derrota' vinha acompanhada de método, disciplina e aprendizado. Cada queda era uma lição sobre como se levantar mais rápido, com mais técnica e confiança", afirma.
Com o tempo, entendeu que o judô não era apenas sobre se proteger dos outros, mas sobre se fortalecer internamente. O que começou como defesa virou experiência de vida que ele leva para líderes de empresa.
Abaixo, veja as 5 lições que Canto aprendeu no tatame e que vale para o mundo corporativo:
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O judoca Canto se formou em Direito pela PUC-Rio, mas apesar da formação acadêmica, foi no tatame que encontrou sua verdadeira vocação. Sua trajetória no esporte inclui medalhas internacionais - entre elas o bronze nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, medalhas em Jogos Pan-Americanos e vitórias em campeonatos internacionais - mas foram as derrotas que, segundo ele, que trouxeram lições importantes que ele usa até hoje.
“As perdas ensinam mais que os pódios,” afirma o judoca.
A aposentadoria do tatame chegou de forma lenta, lembra Canto. “Fui entendendo que já não tinha mais a mesma energia para competir em alto nível e, ao mesmo tempo, novas portas iam se abrindo. Foi uma transição natural, mas cheia de aprendizados,” afirma.
Em 2003, decidiu criar o Instituto Reação, ONG que promove inclusão social e educação por meio do esporte, com polos em comunidades de baixa renda do Rio de Janeiro e outras regiões do Brasil. Entre os nomes revelados pelo projeto está Rafaela Silva, campeã olímpica no Rio 2016. Canto lembra a importância de sua história como símbolo do poder transformador do esporte.
“A Rafaela é a prova viva de que, quando damos oportunidade, o talento floresce. Ela saiu da Cidade de Deus, sofreu racismo nas redes sociais após perder um campeonato, e voltou para conquistar o pódio. Para mim, é uma lição de que investir em pessoas muda destinos,” diz Canto.
Rafaela Silva, medalha de ouro em Judô em 2016 (David Ramos/Getty Images)
Depois de encerrar a carreira competitiva, além do instituto, Canto também se destacou como comentarista esportivo e apresentador de programas ligados ao esporte. Para isso, precisou desenvolver novas habilidades fora do tatame, e por isso investiu até em aulas de teatro e com fonoaudióloga.
“Depois do judô, descobri que precisava me reinventar, e por isso tive que desenvolver novas habilidades. Aprendi a me comunicar melhor, a me apresentar em público e lidar com o improviso", afirma.
Hoje, além da atuação no Instituto Reação, Canto é palestrante e conselheiro em empresas. Ele defende que os valores do judô — disciplina, resiliência e autocontrole — são competências essenciais para líderes.
“Uma organização que entende que os maiores desafios estão dentro, e não fora, ganha força. O líder que se conhece, que controla seus impulsos e que aprende com as quedas, está mais preparado para guiar pessoas, seja em qualquer mercado.”
Para ele, a filosofia do “dō” continua valendo para a sua versão de empresário e conselheiro de empresas.
“Mais do que ganhar, é sobre aprender no processo. É esse aprendizado constante que transforma atletas, líderes e organizações.”