Astério Segundo, publicitário e fundador da agência 35: "Pesquisas do Sinapro-SP e Fenapro (VanPro) mostram que 71% das agências relatam níveis moderados a muito altos de estresse nas equipes" (Astério Segundo /Divulgação)
Redação Exame
Publicado em 4 de outubro de 2025 às 15h22.
Última atualização em 4 de outubro de 2025 às 15h36.
Por Astério Segundo, publicitário e fundador da agência 35
A publicidade brasileira é tão criativa quanto cruel.
Brilhamos em Cannes, mas também estampamos manchetes sobre burnout. Construímos marcas memoráveis, mas muitas agências ainda têm dificuldade em construir times consistentes.
Não é retórica. Pesquisas do Sinapro-SP e Fenapro (VanPro) mostram que 71% das agências relatam níveis moderados a muito altos de estresse nas equipes. Em um único semestre, 26% chegaram a registrar turnover acima de 15%.
É muita gente saindo. E sempre que alguém sai, não é só uma pessoa que vai embora. Junto com ela vão o conhecimento acumulado e a memória de tudo que já foi testado.
Essa experiência é então substituída por uma longa e demorada curva de aprendizado. O resultado disso são equipes juniorizadas, perda de produtividade e trabalhos demorados e custosos, em vez de eficientes e relevantes.
Quem paga essa conta? O cliente. Sempre o cliente.
Há ainda um outro custo igualmente alto nessa equação. O custo humano.
Muitas agências se tornaram terrenos férteis para o burnout. Tanto que a ABAP já discute saúde mental como prioridade setorial. Não é à toa: excesso de demandas, prazos irreais e culturas frágeis têm afastado cada vez mais talentos de uma indústria que tem no fator humano um de seus ativos mais valiosos.
Sete anos atrás, antes de fundar a 35, passei uma temporada estudando inovação em Palo Alto, epicentro da disrupção do Vale do Silício. E percebi que as empresas independentes eram as que atraíam os melhores talentos.
Decidi então importar a ideia e criar uma agência que desse às pessoas algo que faltava no ecossistema publicitário: voz, autonomia e espaço para se desenvolver. Na construção da nossa sede, tornei essa ideia literal. O teto, a 12 metros de altura, era um recado diário de que naquele espaço todos poderiam crescer.
O resultado disso é um marco raro na indústria da comunicação: em mais de quatro anos, apenas duas pessoas deixaram a agência.
Não é por acaso. O nome disso é cultura.
Times consistentes entregam mais inteligência acumulada, mais eficiência e mais valor para seus clientes. E o valor futuro da propaganda não está só na tecnologia. Está em culturas que mantêm as pessoas e fazem do extraordinário a regra.
Em uma indústria que normaliza turnover de dois dígitos por semestre, não há desperdício maior do que ver gente talentosa contando as horas em vez de contar ideias.
O melhor ROI está em um time que, diante da possibilidade de sair, resolve ficar. Pense nisso. Cuidar das pessoas ainda é o melhor jeito de cuidar do caixa.