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Gabriel Bortoleto: a promessa brasileira para o pódio da Fórmula 1

Bortoleto carrega o peso de ser um piloto brasileiro na Fórmula 1. Mas seus feitos até agora permitem aos fãs sonhar com um novo campeão brasileiro

Gabriel Bortoleto, piloto brasileiro na Fórmula 1  (Leandro Fonseca /Exame)

Gabriel Bortoleto, piloto brasileiro na Fórmula 1 (Leandro Fonseca /Exame)

Rodrigo França
Rodrigo França

Jornalista

Publicado em 24 de outubro de 2025 às 06h00.

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O cérebro de uma criança ainda está em formação quando surgem aquelas primeiras memórias que serão carregadas pelo resto da vida. Podem aparecer com 2 anos e meio, 3 ou até 4 anos, mas o fato é que em muitos casos as imagens produzem um impacto duradouro. Foi o que aconteceu com o pequeno Gabriel Bortoleto, piloto brasileiro da Sauber na Fórmula 1. Ele se lembra de ver a Ferrari de Felipe Massa vencendo corridas — e de seu pai, Lincoln, e o irmão mais velho, Enzo, vibrando na frente da TV, na casa da família de classe média em Osasco.

A paixão pelo automobilismo, que vinha do pai, fã de Ayrton Senna, contagiou toda a casa, a ponto de Enzo Bortoleto iniciar carreira nos kartódromos profissionais. Acompanhando o irmão mais velho, Gabriel logo tomou gosto pela coisa e foi mostrando talento desde as primeiras competições.

Depois de 15 anos, o cenário daquela lembrança mudou. Hoje, Gabriel Bortoleto é quem representa o Brasil na maior categoria do automobilismo mundial, depois de um hiato de sete anos sem um piloto do país como titular na Fórmula 1 — o último havia sido justamente o piloto daquela memória, Felipe Massa, em 2017.

Gabriel Bortoleto: representando o Brasil na maior categoria do automobilismo mundial (Leandro Fonseca /Exame)

A chegada ao topo nunca é fácil, e para Bortoleto isso exigiu uma série de sacrifícios no caminho. Primeiro, o de se mudar para a Europa com apenas 12 anos de idade. Seu ótimo desempenho na base, com vitórias nos kartódromos Ayrton Senna e Granja Viana, e títulos como o Sul-Americano de Kart, credenciaram o jovem piloto para a disputa de torneios internacionais.

A decisão de morar em Lonato, na Itália, onde nomes como Lewis Hamilton e Max Verstappen se formaram, foi motivada pela chance de colocar seu nome em destaque para as equipes de fábrica do kart e, assim, abrir caminho para competir nas divisões de base.

Longe da família, Bortoleto só tinha um objetivo: vencer e, assim, manter renovado seu sonho de chegar à Fórmula 1. Em entrevista à Casual EXAME, o brasileiro revela a pressão de não ter um plano B desde seus primeiros anos de kart no exterior.

“Fui muito cedo para a Europa. O Brasil fica muito longe dos principais campeonatos. Então, se você quer ser o melhor no que você faz e lutar com os melhores, precisa mudar para lá para treinar, competir. Então acho que isso é uma força do brasileiro, mas nem todo mundo consegue. É preciso muita dedicação para se manter forte lá”, diz.

Sem plano B

No Brasil, Lincoln Oliveira continuava como empresário no ramo de telecomunicações, com o objetivo de realizar o sonho do filho — o irmão mais velho, Enzo, havia deixado as competições profissionais para que o caçula pudesse seguir carreira.

“Sempre gostei de velocidade, mas não tive condição financeira para correr”, conta Lincoln. “Eu tinha uma empresa pequena e, quando o Enzo começou a correr, a gente viu que era necessário muito dinheiro para isso. E depois a mesma coisa com o Gabriel. Tentei conseguir contrato de patrocínio, mas não consegui. Então foquei muito em fazer a empresa crescer para investir na carreira do Gabriel. E deu muito certo.”

Na Europa: é preciso muita dedicação para se manter forte lá (Leandro Fonseca /Exame)

Com isso, os resultados no kart vieram. O bom desempenho rendeu ao jovem piloto um contrato como piloto de fábrica da CRG, uma das mais importantes da Europa. Bortoleto teve conquistas importantes, como o vice-campeonato mundial do WSK Super Master e um top 5 no Mundial de Kart, que lhe abriram as portas para dar o passo seguinte em sua carreira, as categorias de base de fórmulas.

“Nunca achei que meu plano poderia falhar e que eu poderia não chegar à Fórmula 1. Por ter essa mentalidade desde pequeno, sempre tive muita força”, diz Bortoleto.

Foi nessa época que o piloto conheceu um de seus grandes amigos e mentores no paddock, Max Verstappen, com quem até hoje costuma disputar corridas no videogame. A proximidade com Verstappen não é apenas nas disputas virtuais. Bortoleto tem muitas semelhanças em estilo com o holandês, como a impressionante velocidade em classificações, a ousadia nas ultrapassagens e o uso dos simuladores para adaptação a novas situações.

Não por acaso, Bortoleto foi campeão da Fórmula 3 e da Fórmula 2 no ano de estreia, feito que apenas Charles Leclerc, Oscar Piastri e George Russell conseguiram. O bom desempenho com a Sauber, equipe que foi a última colocada no ano passado, também fez o nome do brasileiro ser apontado como futura estrela do automobilismo. Com o devido cuidado com as comparações, Bortoleto tem um estilo que lembra o de Verstappen. E o estilo de Verstappen lembra o de Ayrton Senna.

Em 2020, Bortoleto estreou na Fórmula 4 Italiana, conquistando pódios e uma vitória. Em 2021 e 2022, ele disputou a Fórmula Regional (Freca). Embora também por lá tenha conseguido vitória e pódios, a falta de títulos colocou uma pressão extra para o seu passo seguinte, a Fórmula 3, uma espécie de preliminar da F1. Naquele momento, Fernando Alonso teve um papel fundamental. Entre o fim de 2022 e o início de 2023, o bicampeão mundial de Fórmula 1 foi empresário de Bortoleto e conseguiu para ele uma vaga em uma boa equipe, a Trident, que estava bastante disputada.

Logo na estreia, Bortoleto conquistou a pole no Bahrein e venceu a corrida principal. Em seu primeiro ano na preliminar da Fórmula 1, Bortoleto conquistou o título, com duas vitórias e seis pódios, e fechou um contrato para competir na Fórmula 2 na Invicta Racing e como piloto de desenvolvimento da McLaren.

A Fórmula 2 exigiria mais um ano de pressão pela conquista de resultados. A temporada começou com dificuldades. O ponto de virada veio com a conquista de uma pole e um segundo lugar justamente em Ímola, bem no dia da homenagem ao seu grande ídolo, Ayrton Senna.

“Fiz um capacete especial do Senna nos 30 anos de legado que me trouxe sorte”, lembra o piloto. “O capacete ficou incrível dentro do carro, fiquei apaixonado pelas cores, representando meu país. Eu me sinto muito mais próximo do Brasil. Estou levando as cores do meu país para todo o mundo, literalmente, todos os continentes em que a gente compete. Para mim isso é especial.”

Acostumado com pressão

É sempre difícil carregar o peso de ser um piloto brasileiro pela comparação com campeões mundiais como Senna, Nelson Piquet e Emerson Fittipaldi. Mas as cores do Brasil no capacete de Bortoleto de fato serviram de marco para uma arrancada dele no campeonato, que terminou com a conquista do título em Abu Dhabi e com uma atuação recorde em Monza, em que saiu na 22a posição e venceu, um feito inédito na história da categoria.

Naquele mesmo fim de semana, Bortoleto já estava em conversas com a Sauber para se tornar piloto titular em 2025. Ter mostrado um desempenho espetacular na pista certamente ajudou a convencer Mattia Binotto, líder de projeto da Audi, que comprou a Sauber e renomeará a equipe a partir de 2026 como time oficial da fábrica alemã.

Anunciado como titular para esta temporada e com um chamado contrato multianual, de mais de dois anos, porém de período não divulgado, Bortoleto passou a sentir a expectativa do torcedor. Mesmo competindo pela equipe que foi a última colocada em 2024 e tendo ao lado um companheiro de equipe experiente, o alemão Nico Hülkenberg, ele sabia que esta temporada seria o seu grande ano para se estabelecer não só como o presente, mas o futuro do Brasil na Fórmula 1. Afinal, paciência com novatos não é algo comum — eles costumam ser descartados se não entregam logo resultado.

“Pressão? Eu vivi isso minha infância inteira”, diz Bortoleto. “Claro que na Fórmula 1 tem mais do que nas outras categorias, mas pressão é quando você está na Fórmula 3 ou na Fórmula 2, em que você tem um ano para entregar resultados, senão você não alcança a Fórmula 1. E passei por esses momentos de pressão de forma muito positiva, com os títulos. O próximo será quando eu estiver disputando o título mundial de Fórmula 1.”

O ano começou com dificuldades para Bortoleto, mas uma série de melhorias aerodinâmicas no carro fizeram com que a Sauber tivesse mais chances de terminar as provas no top 10. Bortoleto marcou seus primeiros pontos no GP da Áustria, com a oitava colocação. E voltou a repetir o bom desempenho na Bélgica, Hungria e Itália, sendo o único piloto do time a ficar no Q3 nas classificações. Nos treinos e nas últimas corridas, tem sido mais rápido do que Hülkenberg.

No tempo livre, o hobby favorito de Bortoleto é pilotar em competições virtuais (Leandro Fonseca /Exame)

Como garoto-propaganda de marcas importantes, como Porto, Motorola e KitKat, Bortoleto conseguiu em pouco tempo enorme reconhecimento da torcida. O status de popstar fica visível quando ele passa alguns dias no Brasil — no último período de folga, em agosto, aproveitou para fazer as fotografias deste ensaio que você tem em mãos. A expectativa agora é para o GP de São Paulo, nos dias 8 e 9 de novembro. “Estou esperando muito carinho do público e emoção da minha parte por correr no meu país pela primeira vez. Não vejo a hora de pilotar em Interlagos.”

Fã de churrasco e arroz com feijão, Bortoleto tem estilo mais reservado. Ele namora há cinco anos com Isabella Bernardini, estudante de ciência da computação na Holanda. “Ele me apoia muito nos meus estudos e eu o apoio nas corridas. Tenho muito orgulho de estarmos juntos nessa jornada. Ele é muito focado, vai seguir sempre atrás de seu sonho.”

No tempo livre, o hobby favorito de Bortoleto é pilotar em competições virtuais, muitas vezes com o colega de Fórmula 1 Max Verstappen. “No começo eu era ruim, mas a coisa foi ficando séria, e hoje posso dizer que o simulador me ajudou muito como piloto, inclusive nas pistas.” O problema é que o “tempo livre” cada vez mais estará raro na agenda. Em 2026, passará a ser piloto titular da Audi, uma equipe que fará sua estreia na Fórmula 1, e em um ano de grandes mudanças de regulamento.

O chefe de equipe, Jonathan Wheatley, já elegeu Bortoleto como o presente e o futuro do time. Com os pontos conquistados, as metas vão progredindo: um pódio (algo que a maioria dos pilotos jamais conseguiu), uma vitória e, claro, o maior de todos os sonhos, o de ser campeão mundial de Fórmula 1, algo que o Brasil não vive desde 1991, com Ayrton Senna.

Aos 20 anos, Bortoleto sabe quão difícil é escalar cada um desses novos sonhos. Sua inspiração é justamente sua origem. “Meu pai não é muito de falar sobre seu tempo de criança.  Eu sei muito pouco da infância dele, que, até onde eu sei, foi muito difícil. Ele vem de uma família extremamente humilde, foi criado praticamente sozinho, a mãe dele não estava muito presente porque tinha de trabalhar, ele não tinha pai. Então todos os sonhos que ele quis ter quando era mais novo e não pôde realizar passaram para mim. E isso acabou se tornando o que eu mais amo fazer na vida.”


Fotógrafo: LEANDRO FONSECA | Diretora de arte: CAROLINA GEHLEN | Tratamento de imagem: JULIO GOMES | Assistente de fotografia: CARLOS PEDRETTI | Editora de moda: CUCA ELLIAS | Beleza: Rodrigo Bernardo (Agência Capa) | Créditos: Acessórios Montblanc, Roupas Oficina Reserva.


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