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Paulo Sentieiro – VP de Vendas/Marketing na Dürr Brasil: reconhecimento vem da dedicação

Não inverta suas expectativas: primeiro vem o trabalho, depois o reconhecimento 

Meu setor de atuação é um nicho, com poucas dezenas de empresas formando o mercado (Global Partners)

Meu setor de atuação é um nicho, com poucas dezenas de empresas formando o mercado (Global Partners)

Publicado em 30 de agosto de 2025 às 09h30.

Minha relação com a indústria automobilística vem de família. Meu avô era dono de uma oficina mecânica em Portugal e, após sua morte, meu pai, aos 18 anos, veio para o Brasil para encontrar-se com minha mãe, com quem namorava por correspondência, e tentar a sorte. Alguns anos depois do casamento, a família se mudou para São Paulo e meu pai iniciou sua trajetória na Ford. Minha mãe e minha avó paterna preparavam refeições para alguns trabalhadores vizinhos e lavavam roupa para fora, ajudando no orçamento da casa. Trabalhavam muito, e sobrava pouco tempo para o lazer com os filhos (cinco, no total). Ainda assim, minhas lembranças vagueiam pelos passeios na fábrica da Ford, onde acredito ter aguçado meu dom profissional. Meu pai construiu uma bela carreira na empresa, onde permaneceu por mais de 30 anos.

Na adolescência, fiz um curso de Elétrica no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), que me inspirou a seguir a faculdade de Engenharia Eletrônica. O período universitário foi bastante desgastante, já que, durante o dia, eu trabalhava em São Bernardo do Campo como estagiário na Ford e, à noite, cursava a faculdade em Santos. Assim que me formei, fui efetivado como engenheiro. No entanto, sabia que, na Ford – como em qualquer grande empresa – seria apenas mais um a exercer uma engenharia saída dos livros e dos bancos universitários. Para tristeza dos meus pais, pedi demissão.

Fui então para uma empresa pequena, concorrente da Dürr na época, onde permaneci por um ano. Nesse período, viajei ao exterior pela primeira vez a trabalho e tive a oportunidade de participar de projetos internacionais. Em 1981, ingressei na Dürr e, graças ao meu interesse por tecnologia e ao meu inglês já mais aprimorado, me ofereci para desvendar os segredos de uma máquina recém-chegada e à espera de alguém para decifrá-la: o controlador lógico programável (PLC).

Desde a minha chegada, senti-me atraído pelo fato de a empresa não viver de produtos, mas de projetos ligados à tecnologia e automação, mudando constantemente o foco das atividades. Ao longo de quatro décadas, ocupei cargos na engenharia elétrica, engenharia mecânica, nas áreas de contratos, informática, comercial e vendas. Há 15 anos, exerço a função de vice-presidente.

Sair da área técnica, meu foco desde a formação, foi desafiador. Fiz treinamentos, investi em qualificações em Boston, no MIT e consultorias na Suíça – sempre com foco em liderança, vendas e comunicação.

A inteligência artificial é uma ferramenta fantástica, mas precisa ser usada com discernimento 

A Dürr começou como uma empresa familiar na Alemanha, voltada para pintura automotiva, e expandiu até chegar ao Brasil em 1964, sua primeira filial fora do país de origem. Hoje está presente em 33 países, com atuação estratégica em tecnologias para o setor da mobilidade. Há mais de 30 anos, antes mesmo da consolidação do mercado local, iniciamos nossas atividades na China – fomos pioneiros por lá. Para que uma empresa se mantenha competitiva, precisa colocar a inovação no centro de sua estratégia, condição essencial para permanecer relevante. O comportamento do mercado exige atenção redobrada, pois as transformações tecnológicas ocorrem de forma rápida e constante. É preciso inovar sempre.

A Dürr atua com equipamentos de processo, transportadores industriais, sistemas de calibragem e testes finais de linha de produção, além de robôs de pintura e selagem, que aumentam a eficiência e a sustentabilidade dos processos industriais, inclusive com soluções de recuperação energética. Nesse cenário, a Inteligência Artificial ocupa um papel central: utilizamos softwares e algoritmos para aferição de máquinas, previsão de manutenção e análise de desempenho das instalações, o que nos permite antecipar falhas e otimizar processos e recursos.

A inteligência artificial é uma ferramenta poderosa, mas deve ser usada como apoio, não como dependência; como aliada, e não como substituta da experiência. O bom senso, o olhar crítico e a escuta de profissionais experientes continuam insubstituíveis. Por isso, cautela e discernimento são fundamentais para sua aplicação. 

Para uma empresa se manter competitiva, precisa ter foco em inovação

Não há outra opção para companhias que desejam se manter relevantes. Alguns produtos podem representar um sucesso de vendas hoje, mas as transformações tecnológicas constantes podem mudar todo o cenário amanhã. O comportamento do mercado precisa de atenção constante.

É preciso olhar para frente. Soluções e produtos oferecidos podem “virar fumaça” de uma hora para outra e deixar de servir para qualquer finalidade rapidamente. Muitas empresas ficam pelo caminho e desaparecem justamente porque não focam em inovar.

Não dá para ficar parado. Novas ideias aparecem o tempo todo, seja em formatos, simplificações ou mudanças disruptivas. Quem não estiver preparado será excluído do mercado. Por isso, é fundamental nunca parar de estudar e se atualizar, além de ter a humildade de compreender que todo o aprendizado acumulado até o momento pode cair em desuso em pouquíssimo tempo, mantendo sempre a energia para recomeçar. 

Relacionar-se bem com a equipe é tão importante quanto as habilidades técnicas

Eu falei acima que a Dürr começou como uma empresa familiar, e, apesar de terem se passado muitos anos, a essência ainda persiste. Seguimos com os protocolos, métodos, pesquisas, investimentos e processos, mas, principalmente, damos muita importância aos relacionamentos.

Atualmente, muito se fala em equipe multidisciplinar e diversidade: várias especialidades atuando em conjunto, focando em um propósito comum. No entanto, para que isso flua e dê frutos, é necessário que, além das habilidades técnicas, a comunicação, a estabilidade emocional e o espírito de equipe sejam avaliados constantemente. Ninguém entrega nada sozinho. É preciso que o time seja motivado com os “3Ps”: paixão, presença e propósito. 

Primeiro você trabalha, depois vem o reconhecimento: não inverta a ordem 

É compreensível e positivo que se sonhe com cargos, benefícios e planos de carreira; mas o caminho tem uma sequência natural: trabalho, desempenho, resultados alcançados e reconhecimento. Aquele que se dedica e procura progredir não passa desapercebido. 

Ter empatia é indispensável ao tomar decisões difíceis

Em momentos delicados, é fundamental ter empatia para entender os impactos de nossos atos nas vidas de outras pessoas. Há situações em que as decisões precisam ser tomadas rapidamente. É fundamental aprender com experiências anteriores, valorizando o conhecimento acumulado. Mas nunca é demais lembrar que não é possível estar 100% correto o tempo todo. A vida pessoal e profissional sempre haverá momentos bons e ruins. Nos bons, comemore; nos ruins, aprenda. Caminhe lado a lado com seus colaboradores, pois eles também têm necessidades. Se andar à frente ou atrás, perderá a chance de crescer junto com eles.”

Direção estratégica e sentimento de propriedade são os pilares da equipe de alta performance 

Como diretor e vice-presidente, aprendi a delegar boa parte das funções relacionadas às demandas diárias para me dedicar às estratégias de médio e longo prazo. Isso só é possível porque conto com uma equipe comprometida e qualificada, com quem trabalho há muito tempo e na qual posso confiar sem precisar vigiar. Participo ativamente, mas direciono as lideranças encarregadas. Quando necessário, chamo para uma conversa a fim de alinhar o rumo; outras vezes, quando não há riscos significativos, deixo as coisas fluírem para que o profissional adquira experiência e, depois, mostro qual seria o melhor caminho.

Para manter uma equipe de alta performance, é preciso ter uma direção estratégica clara de médio e longo prazo, para que todos comprem a ideia. Esse engajamento permite a cada integrante sentir-se dono de cada tarefa a ser executada e agir como verdadeiro empreendedor de suas entregas.
Treinamentos constantes, cursos de idiomas, workshops etc. são imprescindíveis para o crescimento individual e para o aumento da autoestima. Cada projeto de sucesso precisa ser comemorado com todos, para manter a motivação coletiva em seu mais alto grau. 

A boa reputação é um bem intransferível

A boa reputação é um bem intransferível. Meu setor de atuação é um nicho, com poucas dezenas de empresas formando o mercado. Eventos como feiras, congressos etc. propiciam encontros entre os profissionais da área, por isso, cultivar uma boa reputação e transparência é fundamental.
Além de uma qualidade intransferível, a reputação é o verdadeiro legado de um profissional para elevar uma carreira. O profissional de boa reputação é o elo seguro entre o cliente e a empresa.

Muito se fala da importância de ter bom networking, mas só se destaca quem também mantém uma reputação positiva. Ser transparente, não alimentar a falsidade e transmitir valores sinceros são importantes dentro de qualquer setor. Faço negócios com clientes que conheço há várias décadas. Quando conversamos, eles não se sentem falando com a Dürr, mas diretamente com o Paulo em quem confiam. Isso é reputação.

Vale o mesmo para o mundo digital. Redes sociais são ferramentas poderosas, impossíveis de ignorar, mas usá-las com cautela é fundamental para preservar a própria imagem. Existe uma preocupação muito grande em aparecer, em mostrar-se sempre bem, mas deve-se atentar a ser verdadeiro para ter real valor. Digo sempre: seja você mesmo, lembre-se de que na vida temos momentos bons e ruins. 

Torne sua trajetória profissional um caminho de alegrias

Sou casado há 46 anos e minha esposa costuma dizer que me emprestou para a Dürr há 44. Temos dois filhos e uma nora, com quem gostamos de estar sempre que possível. Viajamos sempre que podemos e já conhecemos muitas culturas, das quais aprendemos muito. No dia a dia, porém, me considero um homem de hábitos simples.
Ao longo da trajetória, percebi na prática que a felicidade está no caminho, não no resultado final. Gosto de pesquisar e estudar coisas novas que me desafiem. A internet é uma das ferramentas que utilizo para aprimorar conhecimentos técnicos e explorar hobbies. Os livros técnicos, em sua maioria, complementam meus estudos pessoais e profissionais.