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Entenda o Novo Marco do Licenciamento Ambiental

A primeira lei nacional de licenciamento ambiental unifica 27 mil regras e promete destravar o agro—sem abrir mão de fiscalização

 (Luis Alvarez/Getty Images)

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Instituto Millenium
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Publicado em 29 de maio de 2025 às 19h38.

Por Gabriela De Nigris*

 

Depois de 20 anos de idas e vindas, na última quarta (21), o Senado aprovou o PL 2159/2021, que agora vai à Câmara, com objetivo de criar a Lei Geral do Licenciamento Ambiental do país. A medida, ovacionada pela bancada ruralista e tachada de “retrocesso” por ONGs verdes, promete destravar investimentos em infraestrutura e ampliar a competitividade do agronegócio, surgindo em um momento em que o agronegócio já representa 23,2% do PIB nacional e metade das exportações brasileiras.

O que muda na regra do jogo? A proposta surge como resposta ao cenário atual de insegurança jurídica, consolidando em um único marco mais de 27 mil regras, hoje espalhadas por normas estaduais e federais. Ademais, o texto evita sobreposições de competência e elimina entraves administrativos sem reduzir a proteção efetiva dessas áreas.

Atualmente, o processo segue - em geral - o modelo trifásico (Licença Prévia, de Instalação e de Operação) e exige estudos como o EIA/Rima para obras de maior impacto, mas sem prazos claros, nem integração entre os órgãos responsáveis. Cada estado ou município define suas próprias regras, e a tramitação é majoritariamente física, gerando sobreposição de exigências, insegurança jurídica e falta de previsibilidade para quem precisa da licença.

Na prática, isso faz com que o processo seja longo, opaco e sujeito a judicializações, já que não há um banco de dados público consolidado, nem clareza sobre como lidar com atrasos ou omissões de órgãos envolvidos. O novo marco surge para enfrentar essas falhas: unifica as normas espalhadas, mantém o modelo trifásico, mas cria procedimentos simplificados, estabelece prazos máximos (entre 3 e 10 meses), digitaliza os fluxos pelo Sinima, organiza a participação dos órgãos setoriais e regulamenta situações em que a licença pode ser dispensada — buscando tornar o licenciamento mais ágil, transparente e seguro, sem abrir mão das salvaguardas ambientais.

Segundo dados do Painel do Licenciamento Ambiental no Brasil, da empresa de consultoria WayCarbon, com base em informações do Ministério do Meio Ambiente, secretarias estaduais e Ibama, a média brasileira para obtenção de uma licença ambiental é de 208 dias. Essa é a média nacional, considerando todos os tipos de licenças, desde dispensas de licenciamento e autorizações simples, até licenças mais complexas, como LP, LI e LO. Se considerarmos apenas essas licenças, a média nacional do processo completo (LP até LO) é de 631 dias (1 ano e 9 meses). Muitos projetos ficam parados por falta de uma norma clara e geral, criando insegurança jurídica para investidores.

Do ponto de vista técnico, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) também reconhece o problema. Estudos da Embrapa indicam que, em média, a morosidade no licenciamento ambiental acarreta atrasos de 2 a 5 anos na implantação de projetos aquícolas (criação de peixes) – um “retardo produtivo considerável” com impactos diretos no crescimento do setor. Nesse período de espera, produtores ficam de mãos atadas: muitas vezes não podem operar legalmente (sob risco de multas por falta de licença) nem acessar crédito rural específico sem a documentação ambiental completa. Ou seja, a burocracia em si gera prejuízos ao impedir o início da produção e bloquear financiamentos.

Organizações ambientais, como o Observatório do Clima, criticam o projeto, apontando que ele flexibiliza o licenciamento ambiental e pode agravar a crise ambiental no Brasil. Para eles, a proposta é vista como um retrocesso, pois permite que empreendimentos obtenham licenças de forma automática, apenas com base na autodeclaração do empreendedor, sem necessidade de análises técnicas prévias.

No entanto, é importante entender como o projeto assegura o controle ambiental e a rastreabilidade, mesmo ao simplificar etapas. Especialistas apontam que é possível conciliar eficiência e proteção ambiental. Os juristas Marcelo B. Dantas e Gabriela Giacomolli, por exemplo, elencaram “dez pontos positivos” do PL que devem ser preservados para melhorar o sistema sem prejudicar a proteção ambiental. Entre esses pontos, destacam-se: a fixação de prazos máximos para órgãos ambientais se manifestarem, a melhor definição de estudos ambientais exigidos, a criação de novas modalidades de licença (como licenças únicas ou por adesão) e o aumento de penalidades para crimes ambientais. Em suma, para esses especialistas, simplificar procedimentos não significa eliminar proteção, mas sim tornar o licenciamento mais eficaz e previsível.

Além de simplificar procedimentos para atividades de baixo impacto, o PL 2159/2021 também endurece a fiscalização nos casos mais sérios, mantendo a obrigatoriedade de licenciamento completo (com EIA/RIMA) para empreendimentos de alto impacto e áreas sensíveis, como unidades de conservação e terras indígenas. O projeto prevê auditorias por amostragem, digitalização de dados para rastreabilidade e permite a suspensão ou cassação de licenças obtidas por declarações falsas, garantindo que irregularidades sejam punidas com sanções administrativas, civis e criminais. Com isso, libera-se capacidade estatal para fiscalizar onde há maior risco, enquanto o fortalecimento das bases digitais e da participação pública amplia a transparência e o controle social sobre os projetos licenciados.

O agronegócio é, indiscutivelmente, um dos pilares econômicos mais sólidos do Brasil, responsável por sustentar grande parte da balança comercial e fomentar o desenvolvimento socioeconômico. A aprovação do novo marco regulatório do licenciamento ambiental chega em momento oportuno, prometendo ser um divisor de águas para impulsionar investimentos em infraestrutura, ampliar a produtividade e fortalecer a competitividade global do setor. Mais do que nunca, é essencial enfatizar a preservação ambiental, destacando que o Brasil pode e deve ser um farol global de como sustentabilidade e produtividade agrícola podem caminhar juntas.

Convite especial

Por fim, convido você a aprofundar essa discussão no Ibmec AgroForum 2025, promovido pela Consillius Business, em agosto, em Brasília. Estarão presentes nomes como a Senadora e ex-ministra Tereza Cristina, o professor Marcos Jank, líderes da CNA, do Banco do Brasil — todos prontos a debater como certificações e novas regras de licenciamento impactam o agro no comércio global. As inscrições abrirão em breve. Nos acompanhe no Instagram e Linkedin para ficar atualizado.

 

*Gabriela De Nigris é Conselheira da Consillius Business, membro da equipe econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e Alumni The Fund for American Studies.

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