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PPPs na Educação: entre o avanço dos projetos e o desafio do seu financiamento

As PPPs em educação avançam, mas sua consolidação exige maior coordenação institucional

Somente no Estado de São Paulo, duas PPPs em educação licitadas em 2024 deverão erguer 33 escolas e gerar investimentos de R$ 2,1 bilhões (SEDUC/Divulgação)

Somente no Estado de São Paulo, duas PPPs em educação licitadas em 2024 deverão erguer 33 escolas e gerar investimentos de R$ 2,1 bilhões (SEDUC/Divulgação)

Fernando Pieroni
Fernando Pieroni

Especialista em parcerias público-privadas

Publicado em 13 de outubro de 2025 às 19h33.

Última atualização em 14 de outubro de 2025 às 13h11.

A educação pública brasileira vive um paradoxo. Há uma perspectiva muito favorável de expansão de projetos de parcerias público-privadas (PPPs) para gestão de instalações escolares, mas há ainda a necessidade de amadurecimento dos instrumentos de financiamento capazes de sustentar essa expansão. Isso porque, se por um lado estados e municípios correm para lançar editais e assinar contratos com seus parceiros privados, por outro, a capacidade de atrair investimento de longo prazo para os projetos enfrenta desafios institucionais e regulatórios.

Segundo dados da Radar PPP, existem atualmente 10 contratos de educação já assinados ou em vias de assinatura e mais de outras 100 iniciativas de novos projetos, em diversas fases, abrangendo desde o anúncio da intenção de sua estruturação até a fase licitatória. Esses projetos atendem principalmente duas importantes demandas do sistema educacional público: a criação de vagas de creches e de educação infantil e a requalificação de escolas de ensinos fundamental e médio.

Somente no Estado de São Paulo, duas PPPs em educação licitadas em 2024 deverão erguer 33 escolas e gerar investimentos de R$ 2,1 bilhões. Outro projeto em estruturação no estado, para reforma, manutenção e gestão de 143 escolas, prevê R$ 1,7 bilhão em recursos. Em paralelo, outras iniciativas estão em fase avançada de modelagem em diversas regiões do País, compondo uma esteira de propostas robusta e com potencial de expansão significativa.

Esse movimento ganha força pelo grande potencial de impacto. Ao transferir a manutenção predial e os serviços acessórios para o parceiro privado, os gestores públicos ficam liberados para concentrar esforços no aprimoramento do ensino e da aprendizagem. Essa divisão de responsabilidades possibilita que a política educacional se apoie em uma infraestrutura de qualidade, com ambientes adequados a alunos e professores, reforçando a ligação entre boas condições físicas e melhores resultados educacionais.

Além disso, a atuação estruturada do Banco Nacional do Desenvolvimento, o BNDES; do Fundo de Apoio à Estruturação de Projetos de Concessão e PPP - FEP Caixa; e de órgãos multilaterais, tem oferecido suporte técnico e financeiro para que municípios e estados desenvolvam esses projetos. Há também um aperfeiçoamento dos mecanismos de garantia de pagamento aos parceiros privados, como a incorporação de instrumentos que utilizam fundos constitucionais – Fundos de Participação dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM), por exemplo –, o que confere maior segurança aos investimentos.

Outro sinal de amadurecimento é a maior sofisticação da estrutura de capital dos projetos. Se antes o seu financiamento era basicamente ancorado em aportes de operadores e empresas de construção e crédito bancário, as novas concessões educacionais têm atraído recursos do mercado de capitais, com a participação de fundos de investimento em consórcio com os operadores. Essa diversificação amplia a capacidade de alavancar recursos, traz novas perspectivas para a análise de viabilidade dos projetos e melhora a distribuição de responsabilidades entre atores com competências complementares, como é o caso dos vencedores das mais recentes licitações, no Estado de São Paulo e em Caxias do Sul/RS.

Ainda assim, o ambiente institucional da educação encontra limitações para dar escala à tendência de expansão. Enquanto áreas como o meio ambiente contam com fontes específicas de incentivo setorial, como o Fundo Clima, gerido pelo BNDES, não existe hoje um fundo setorial robusto e operacional para apoiar projetos de infraestrutura educacional. Essa realidade coloca ainda mais relevância na atração de recursos privados para o segmento.

Cumpre destacar ainda que as debêntures incentivadas, criadas para reduzir o custo de financiamento em setores prioritários, seguem sem regulamentação pelo Ministério da Educação, o que impede que elas cumpram seu papel como vetor de expansão dos projetos educacionais. Isso porque uma lei aprovada em 2024 passou a exigir que cada ministério defina, por portaria, os critérios para elegibilidade dos projetos e, no caso da educação, essa norma ainda não foi publicada.

Aliás, as debêntures incentivadas vêm sendo ainda mais comprometidas por mudanças que minam sua atratividade, não apenas na educação, mas em todos os setores elegíveis. A recente Medida Provisória 1.303/2025, que propõe alterar a tributação e eliminar isenções fiscais, tem introduzido enorme insegurança em um mecanismo que vem funcionando para financiar projetos de longo prazo, o que pode prejudicar a tendência de mobilizar capital privado de forma consistente para os projetos de parceria entre os setores público e privado.

O país enfrenta, portanto, um problema de coordenação institucional. Estados e municípios devem seguir fomentando projetos e aprimorando contratos de parceria, e é indispensável garantir qualidade regulatória e segurança jurídica. A União, por sua vez, precisa preencher lacunas de política pública, com a regulamentação definitiva das debêntures incentivadas para a educação.

O Brasil já conta com uma quantidade significativa de projetos prontos para avançar. Mas é preciso garantir a efetividade de instrumentos que viabilizem sua execução em larga escala. Resolver essa dicotomia pode significar mais escolas e melhores condições de ensino, o que representa um importante salto de qualidade para milhões de estudantes e comunidades em todo o país.

* Artigo escrito em parceria com Frederico Estrella, economista e especialista em finanças corporativas.