Patrocínio:
Parceiro institucional:
Projeto Borracha Nativa já adquiriu mais de 75 toneladas de látex e impactou mais de 10 comunidades amazônicas (Mercur /Divulgação)
Repórter de ESG
Publicado em 6 de agosto de 2025 às 17h30.
Última atualização em 6 de agosto de 2025 às 17h56.
Somos de fato relevantes para o mundo e nas comunidades em que estamos inseridos, ou seria melhor se não existirmos? Foi essa reflexão que ecoou pelos corredores da empresa centenária gaúcha Mercur quando aconteceu a mudança de gestão para a terceira geração da família, liderada por Jorge Hoelzel Neto, em 2009.
A companhia passava por uma "virada de chave" em relação à sustentabilidade, o que transformou não apenas sua cultura interna como também sua relação com comunidades extrativistas na Amazônia.
A intenção? Gerar impacto positivo. "Na época, mudamos nomenclaturas de cargo, modelos de operação e passamos a ter uma estrutura mais participativa e colaborativa", contou Fabiane Lamaison, Facilitadora de coordenação na Mercur, em entrevista à EXAME.
A executiva é um exemplo vivo da transformação cultural: ingressou na empresa na área de marketing e cresceu rapidamente até assumir a diretoria que hoje engloba marca, produto e estratégia.
Dentro da estratégia de gerar valor ao ecossistema com o qual se relaciona, a Mercur percebeu que poderia fazer ainda mais diferença através das matérias-primas utilizadas em seus processos.
Com um leque de produtos na área de saúde e educação, a fabricante usa o látex para desenvolver alguns dos mais icônicos do seu portfólio, como a borracha de apagar e a bolsa de água quente.
Ao completar 15 anos em 2025, o projeto da borracha nativa se tornou um exemplo bem-sucedido de como gerar renda para comunidades tradicionais e proteger a Amazônia.
Por meio do extrativismo sustentável, a Mercur paga até quatro vezes mais pelo látex amazônico do que o valor de mercado e gira a economia local, além de ajudar a manter a floresta de pé.
Até então, já foram mais de dez povos impactados e 75 toneladas de látex adquiridos por meio da cadeia produtiva justa.
Após reconhecer a história de extrativistas e seu papel na conservação florestal, a primeira compra aconteceu em 2010: duas toneladas de borracha nativa dos seringueiros da Terra do Meio, no Pará.
"Apostamos em uma estratégia de longo prazo, onde o que conta é a floresta em pé e o modo de vida das populações tradicionais", destacou Fabiane.
Em 2023, o projeto ganhou nova dimensão com a expansão para Rondônia. Hoje, o extrativismo sustentável acontece em oito territórios distribuídos entre Pará e Rondônia: as Reservas Extrativistas Rio Xingu, Rio Iriri, Riozinho do Anfrísio, Terra Indígena Xipaya e as Terras Indígenas Igarapé Lourdes, Uru-Eu-Wau-Wau, Rio Branco e Sete de Setembro.
"Os extrativistas tem todo um cuidado com os ciclos da natureza. O caminho não é o mesmo todos os dias. Há um respeito por aquela árvore para que ela consiga produzir a matéria-prima e os tempos são mais orgânicos. Não é o mesmo da indústria", explica a diretora sobre o processo.
Como grande marco do projeto, a novidade é o lançamento da primeira Borracha Nativa da Amazônia feita com látex 100% extraído de árvores nativas. O produto traz um QR Code que conecta consumidores às histórias dos territórios de origem, através da rede Origens Brasil, parceira desde o início.
Para o negócio, que tem na borracha de apagar um de seus produtos icônicos -- representando 50% do braço de educação e sendo reconhecida há mais de 80 anos, a rastreabilidade total "é peça-chave" e depende de uma rede robusta de parceiros locais.
Desde 2010, organizações como o Instituto Socioambiental (ISA) e o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (IMAFLORA) fazem o trabalho de mapear e conectar as comunidades com fábrica que fica no interior do Rio Grande do Sul, no município de Santa Cruz do Sul.
Já a rede Origens Brasil garante a certificação e rastreabilidade e a QR Borrachas Quirino, em São Paulo, realiza o processo de transformação do ativo natural para uso industrial.
Um dos diferenciais do projeto é o modelo de remuneração. Mas por trás de uma cadeia justa, há um preço um pouco mais elevado na borracha escolar que ainda "enfrenta resistência" no mercado, disse Fabiane ao elencar o principal desafio: conscientizar o consumidor para que entenda o valor e escolha pagar pelo mais caro que é mais sustentável.
"Alguns produtos giram muito pouco e acabam virando mais conceito do que rentáveis economicamente. Mas há um imenso retorno social, nós fazemos porque acreditamos", destacou.
Há outros gargalos: um extrativista na floresta consegue coletar látex de 150 a 200 seringueiras por dia, enquanto em seringais de cultivo tradicionais manejam muito mais: entre 900 e 1.200 árvores.
Isto faz com que a empresa ainda dependa de lavouras comerciais de São Paulo para atender toda a demanda industrial. Por outro lado, não a impede de expandir: os processos estão sempre evoluindo e caminham para serem mais inovadores e sustentáveis.
"A extração do látex até poderia acontecer em maior escala, mas no caso da borracha de apagar, há uma necessidade de um cuidado muito específico", esclarece Fabiane.
A logística também é mais complexa: a produção dos povos tradicionais acontece em áreas remotas e distantes dos centros urbanos.
O projeto integra uma estratégia mais ampla de sustentabilidade da Mercur que olha para as pessoas, meio ambiente e planeta.
No pilar ambiental, a companhia é carbono neutro desde 2015, possui usina solar própria para geração de energia limpa nas operações, desenvolve logística reversa em parceria com cooperativas locais e mantém produtos 100%e ecológicos em seu portfólio.
"Passados 15 anos de transformação, as ações estão todas muito maduras e enraizadas no negócio. Hoje entendemos que se uma empresa não nascer assim, não há nem como ela se sustentar no futuro", refletiu a diretora.
Em 2025, a Mercur vive um novo momento de transição: a quarta geração deve assumir a gestão. O plano? continuar o legado de décadas da companhia e manter os valores que estão inerentes desde o início.
"Uma vez conseguimos expandir e crescer economicamente, também é possível ter mais projetos e ainda mais retorno social e ambiental", ressaltou Fabiane.
Para a executiva, o Projeto Borracha Nativa representa mais do que uma iniciativa de sustentabilidade e busca inspirar outras indústrias a repensarem seus modelos para que preservem as cadeias da floresta e caminhem em direção à transição para uma economia de baixo carbono.