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Pavilhão liderado pelo renomado Johan Rockström e o brasileiro Carlos Nobre alertou em manifesto que o mundo precisa reduzir as emissões pelo menos 5% ao ano (Leandro Fonseca /Exame)
Repórter de ESG
Publicado em 15 de novembro de 2025 às 08h00.
Enquanto as emissões continuam a atingir níveis recordes, o pavilhão científico da COP30 em Belém permaneceu praticamente vazio de negociadores durante a primeira semana.
Nas salas fechadas da Blue Zone, as negociações aconteciam a todo vapor, mas os diplomatas que deveriam conectar a ciência à crise climática não apareceram neste espaço pioneiro em uma COP.
O apelo veio de um grupo de cientistas na sexta-feira, 14: "negociadores, venham até nós", junto ao alerta de que o orçamento de carbono para conter o aquecimento em 1,5°C se esgota em apenas 4 anos.
"Tememos que negociadores não entendam o que a ciência diz de mais recente. Há uma aceleração do aquecimento em curso e o planeta perde sua resiliência e capacidade de amortecer os riscos", destacou Rockström, diretor do Instituto Potsdam e criador do conceito de limites planetários.
A frustração com a baixa presença diplomática foi unanimidade entre os pesquisadores, mas no geral o balanço inicial da conferência do clima foi visto como positivo, com uma agenda de negociação aprovada em termo recorde e algumas sinalizações políticas importantes para a eliminação gradual de combustíveis fósseis.
"Até agora há uma atmosfera construtiva aqui em Belém. Não caímos em nenhuma vala e não há nenhum descarrilamento súbito", disse Rockström.
Surpreendentemente, os cientistas ressaltaram que a ausência dos Estados Unidos, segundo maior emissor global, não travou as negociações como se temia.
Paulo Artaxo vê motivos para otimismo cauteloso: "Alemanha, Inglaterra já apoiam a formação de um roadmap para a descarbonização e para acabar com os combustíveis fósseis. O que não sabemos é como será a posição da Índia, China, mas o fato de alguns já estarem puxando a agenda é meio caminho andado", destacou.
[grifar]O desafio agora é se alinhar com a ciência. "A lacuna não pode continuar como está agora, acreditando que isso é algo que você pode fazer lentamente e linearmente, quando na realidade você tem que se mover muito rápido para longe do perigo", ressaltou Rockström.
"Gostaríamos muito de ver um aumento nessa colaboração e comunicação", acrescentou Ricarda Winkelmann, também do Instituto Potsdam. "Estamos em contato com as delegações, mas o que realmente queremos ver é o aumento da voz da ciência, a colocando como papel central no que for decidido".
Já Carlos Nobre, veterano de muitas COPs, trouxe algo bastante positivo em curso em Belém: o apoio massivo da mídia no apoio ao pavilhão científico. "Todos vieram o tempo todo e agora estão vendo o primeiro resumo que fizemos. Vocês estão dando uma dimensão muito grande ao que a ciência está dizendo", afirmou à EXAME.
Um novo manifesto encabeçado pelos cientistas mostrou que o mundo precisa reduzir as emissões pelo menos 5% ao ano a partir de agora. "Infelizmente, os compromissos atuais equivalem a uma redução total de 5% em 10 anos", escreveram.
Os dados deveriam mobilizar imediatamente os negociadores: aos níveis atuais de emissões, restam apenas 4 anos antes que o orçamento de carbono para 1,5°C se esgote completamente.
"É inaceitável que as emissões projetadas para 2025 sejam 1,1% maiores que 2024", afirma o documento assinado por outros brasileiros como Marina Hirota, Thelma Krug e Paulo Artaxo.
A maior parte do CO2 que empurraria o aquecimento para 1,5°C já foi emitida, principalmente pelas grandes economias do mundo. Agora, na metade da década, quando deveriam ter sido reduzidas pela metade, continuam subindo.
Este é um cronograma com implicações profundas para a justiça climática e equidade: o orçamento restante será consumido principalmente por países altamente poluentes, enquanto comunidades vulneráveis e economias frágeis sofrem as piores consequências.
"O que estamos concluindo é que a emergência climática nunca atingiu o nível como o que vimos hoje, há uma enorme preocupação. Em 2025 as emissões aumentaram, é muito grave", complementou Paulo Artaxo, pesquisador veterano da Amazônia e Membro da Academia Brasileira de Ciências.
Como prioridade máxima dos próximos dias de negociação, o documento frisou que é imprescindível que os países criem um roteiro para encaminhar ao mundo rumo à eliminação gradual dos combustíveis fósseis.
Segundo o grupo, alcançar emissões líquidas zero globalmente requer uma mudança radical de mentalidade e governança em todos os países, especialmente com a ampliação de energias renováveis e combate ao desmatamento.
Rockström destacou que quaisquer decisões sem base científica colocam o mundo em risco de impactos irreversíveis e em desalinhamento com as metas do histórico Acordo de Paris.
"Estamos vendo a ciência sendo apagada dos textos, e isso faz parte de uma estratégia mais ampla de atraso e negação", afirma o novo documento.
Na próxima semana, a iniciativa irá apresentar mais um relatório que aponta para a possibilidade do Brasil se tornar netzero até 2040.
Inicialmente, o acordo firmado na COP26 em Glasgow previa a todos os países o compromisso de mitigar as emissões em 40% até 2030 e zerar até 2050.
"Mas agora que a temperatura já está atingindo quase 1,5ºC, nós temos que acelerar", complementou Carlos Nobre.
O apelo dos cientistas ecoa pelas salas de negociação de Belém: venham até nós, ouçam a ciência, entendam a urgência. Porque, como eles mesmos dizem, [grifar]"é a única opção para evitar uma crise planetária."