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Descoberta no pré-sal brasileiro pode mudar o jogo para a BP — e atrapalhar os planos da Shell

Reserva no bloco Bumerangue fortalece posição da petroleira britânica em meio a rumores de venda e pode prolongar o auge da produção nacional até a década de 2030

Para 2026, a BP planeja perfurar um novo poço no bloco Tupinambá, também na Bacia de Santos. (./Divulgação)

Para 2026, a BP planeja perfurar um novo poço no bloco Tupinambá, também na Bacia de Santos. (./Divulgação)

Juliana Alves
Juliana Alves

Repórter de mercados

Publicado em 4 de agosto de 2025 às 14h19.

Última atualização em 4 de agosto de 2025 às 16h49.

A BP acaba de fazer sua maior descoberta de petróleo e gás dos últimos 25 anos — e ela está localizada no pré-sal brasileiro. A companhia anunciou nesta segunda-feira, 4, a identificação de uma nova reserva no bloco Bumerangue, a cerca de 400 km da costa do Rio de Janeiro, na Bacia de Santos, num movimento que pode redefinir o futuro do pré-sal brasileiro e da própria companhia.

Para o Brasil, é a chance de estender o aumento da produção no pré-sal, que teria um pico em 2031, por ao menos mais alguns anos. Para a BP, pode ser quase uma tábua de salvação: o ativo surge em um momento crucial para o futuro da petroleira britânica, que está sob pressão do mercado e de investidores ativistas, e alvo de rumores de aquisição pela rival Shell.

O poço pioneiro, batizado de 1-BP-13-SPS, foi perfurado a 2.372 metros de profundidade e atravessou uma coluna de hidrocarbonetos estimada em 500 metros. A BP ainda não divulgou o volume em barris, nem seu potencial em volume, mas a área mapeada da reserva já soma mais de 300 km². A empresa, cujas ações subiram mais de 1,7% na bolsa de Londres, divulga amanhã seus resultados trimestrais e deve dar mais pistas sobre o tamanho do achado.

Por ora, ainda é cedo para dizer qual o efeito potencial e a viabilidade econômica da descoberta. Mas ela já tem sido comemorado pelo governo. Fontes do Ministério de Minas e Energia (MME) afirmaram à EXAME que a descoberta é "muito relevante" e o ministro Alexandre Silveira já tem reuniões marcadas para esta semana para discutir o potencial de produção.

O anúncio vem em um momento de reavaliação do papel da BP no mercado global de energia. A companhia passou os últimos anos tentando equilibrar sua transição para fontes renováveis com a pressão por resultados no petróleo e gás. Nesse meio tempo, perdeu fôlego em relação a rivais como a Shell e a ExxonMobil — e passou a ser alvo de fundos ativistas, como a Elliott Investment Management, que detém mais de 5% das ações e tem pressionado por mudanças estratégicas.

Mais recentemente, o Wall Street Journal revelou que a Shell estaria em conversas avançadas para adquirir a BP, em um movimento que poderia superar os US$ 80 bilhões. A descoberta no pré-sal brasileiro adiciona um novo elemento à equação. “É um divisor de águas para a BP”, afirma o especialista em energia Adriano Pires. “A companhia estava sendo vista como uma empresa em dificuldades. Agora, pode mostrar que ainda é capaz de competir com as gigantes.”

A BP detém 100% de participação no bloco Bumerangue — algo raro no pré-sal, onde normalmente os ativos são divididos entre consórcios. O bloco foi adquirido em 2022, em uma rodada da Oferta Permanente da ANP, com termos considerados vantajosos. A companhia foi a única a fazer oferta pelo ativo, pagando R$ 8,8 milhões e um excedente de óleo a ser pago para a União de 5,9%, apenas um pouco acima do percentual mínimo de 5,66% estipulado no leilão.

Em outras palavras, caso a exploração se confirme comercialmente viável, isso pode significar margens mais altas e um retorno mais significativo para a companhia.

O que está em jogo para o Brasil

Ainda em fase inicial, a nova descoberta também traz implicações relevantes para o Brasil. A expectativa é que a produção no campo só comece por volta de 2030, dadas as exigências técnicas do pré-sal. A nova reserva pode estender o ciclo de alta da produção brasileira por mais tempo.

“A estimativa atual é que o pico da produção no pré-sal ocorra entre 2031 e 2032”, afirma Rafael Schiozer, professor de finanças da FGV. “Com a descoberta da BP, esse pico pode ser suavizado e transformado em um platô por mais alguns anos, mantendo a produção nacional em um patamar elevado por mais tempo.”

A presença de novas operadoras também é um fator estratégico. “É positivo para o país que outras empresas, além da Petrobras, explorem novas reservas”, diz Pedro Rodrigues, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). “O Estado brasileiro pode ganhar com royalties, participações especiais e excedente de óleo, que podem se transformar em riqueza para a sociedade.”

A estimativa é que o Bumerangue demande ainda novos poços exploratórios e simulações de produção, com análises geológicas mais profundas sobre permeabilidade, porosidade das rochas e pressão nos reservatórios. Um dos desafios técnicos iniciais é o alto nível de dióxido de carbono na área, o que pode tornar a produção mais cara, diz Rodrigues, do CBIE — mas que não inviabiliza, por si só, o desenvolvimento do campo.

Com a descoberta no Brasil, a BP já soma dez novas reservas em 2025, em regiões como Trinidade, Egito, Líbia, Namíbia e Angola. Parte dessas iniciativas vem sendo conduzida por meio da joint venture Azule Energy, criada em parceria com a italiana Eni. Para 2026, a companhia planeja perfurar um novo poço no bloco Tupinambá, também na Bacia de Santos, como parte de sua meta de alcançar entre 2,3 e 2,5 milhões de barris de óleo equivalente por dia até 2030.

É cedo para dizer se o Bumerangue mudará a história da BP. Mas ele já colocou a petroleira de coadjuvante a protagonista nas conversas sobre o futuro do setor.

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