Pandit, da JPMorgan Asset Management: Não acho que se trata de um momento de ‘vender América’ (Meera Pandit, estrategista global do JP Morgan/Divulgação)
Repórter de negócios e finanças
Publicado em 17 de julho de 2025 às 12h38.
Última atualização em 17 de julho de 2025 às 15h29.
As incertezas trazidas pelas políticas de Donald Trump pesaram sobre o dólar e trouxeram uma narrativa de “sell America”, com diversificação dos investimentos para além dos Estados Unidos.
Mas, para Meera Pandit, estrategista global da asset do JPMorgan, que administra US$ 3,7 trilhões, o discurso não está se traduzindo em prática pelos investidores e a bolsa americana deve continuar a ser resiliente.
“O mercado internacional está, sim, se tornando muito mais competitivo ao longo deste ano. Mas não acho que se trata de um momento de ‘vender América’. É mais um rebalanceamento para seguir encontrando oportunidades nos Estados Unidos e igualmente no exterior”, disse em entrevista ao INSIGHT.
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Segundo ela, as máximas do mercado acionário americano não surpreendem, uma vez que a economia americana segue forte, bem como os resultados das companhias. “Experimentamos todos os tipos de risco este ano e ainda assim os lucros das empresas seguem resilientes”, afirma, ressaltando que esse é um sinal de que o “excepcionalismo americano está vivo e bem”.
A executiva esteve no país pela primeira vez para participar do Avenue Connection. O evento da corretora especializada em investimentos no exterior coincide com um momento de tensões comerciais entre Brasil e Estados Unidos e de tensões crescentes entre o Donald Trump e Jerome Powell, presidente do Fed.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Como você avalia os efeitos das tarifas sobre os mercados até agora?
Meera Pandit: Os investidores esperam desde o início do ano para começar a ver algumas dessas tarifas se refletirem nos dados e até agora não viram impacto significativo na economia ou nos lucros das empresas. Então ficaram complacentes.
No primeiro trimestre, ouvimos empresas falando em aumentar preços e se perguntando sobre como gerenciar tudo isso. A temporada de balanços do segundo trimestre [nos Estados Unidos] começou, com números robustos até agora, e ainda não vimos esse impacto.
Mas parte do problema é que vai haver um efeito retardado. Temos visto muita antecipação de importações e construção de inventários. Então pode levar algum tempo até vermos os efeitos das tarifas aparecerem. Não está claro se veremos uma elevação ou inversão da inflação. Porque você vê uma alta em algumas categorias de produtos, mas os consumidores estão mais retraídos em alguns serviços.
Você diria que as Bolsas americanas batendo recordes históricos em um momento de tanta incerteza são a prova do excepcionalismo americano?
Não surpreende que estejamos vendo altas históricas da Bolsa, porque experimentamos todos os tipos de risco este ano. Tivemos guerra, tarifas, impostos, um downgrade de risco de dívida, uma ameaça existencial para a inteligência artificial, quando pensamos no Deepseek. E ainda assim os mercados permaneceram resilientes, por conta dos dados econômicos, os lucros das empresas.
Ainda que economia desacelere em relação aos últimos anos, os pontos de partida importam e eles foram fortes. Estamos provando que temos corporações excepcionais, que não só estão trazendo tecnologia e inovação, mas mostrando lucratividade. Nesse aspecto, acredito que o excepcionalismo americano ainda tem um caminho, está vivo e bem.
Analistas dizem que são os balanços do segundo trimestre que vão mostrar o real impacto das tarifas sobre as empresas americanas. Quais são as suas expectativas?
Acho que vamos começar a ver impacto de tarifas em empresas de consumo, mas, por outro lado, áreas de tecnologia tendem a ir muito bem em termos de aumento de lucros. Essas companhias têm muita receita no exterior e o dólar caindo é um fator que ajuda.
De modo geral, acho que vamos conseguir administrar as tarifas, como precisamos, e a demanda continua 'ok'. As tarifas foram anunciadas em abril e até vimos algumas companhias adiando a divulgação de resultados do primeiro trimestre. Depois elas ficaram menos pessimistas com as perspectivas. As margens de lucro nos Estados Unidos são incrivelmente altas, então há espaço para alguma erosão.
E em relação aos juros americanos? O presidente Donald Trump tem endurecido o seu discurso contra Jerome Powell e a possibilidade de demiti-lo do Fed. O que essa pressão do governo sobre o BC americano traz para os mercados?
Precisamos lembrar que o Fed é um comitê e que tem um corpo que toma decisões com um número de membros que permaneceriam. Então ainda que você tenha um chairman que seja mais dovish, não significa que os juros irão repentinamente a zero, com cortes massivos, porque ainda vai ser preciso haver um consenso dentro do comitê.
Acho que há sim um fator que cria incerteza e que vai criar alguma volatilidade em relação aos yields, mas no fundo vai ser preciso um consenso. [...] E com quais dados esse comitê trabalha? Mercado de trabalho um pouco mais saudável, a inflação não parece que vai disparar, mas certamente existe uma pressão de alta ali. Então o Fed quer esperar para ver e ajustar a rota.
Uma das narrativas que tem se consolidado neste ano é que de um excesso de investimento no mercado americano por parte de todo o mundo. Você concorda com essa visão?
Investidores estrangeiros possuem cerca de 25% dos Treasuries americanos e 18% do mercado de equity. Então, certamente, o estrangeiro tem uma grande fatia nos Estados Unidos. Mas o interessante sobre essa narrativa de "venda América" e que você ouve muito dos clientes, "ah, eu quero tirar umas fichas da mesa nos EUA, quero ser mais internacional". Mas você não os vê fazendo isso na prática.
Não estamos vendo um movimento massivo de estrangeiros vendendo ações americanas ou treasuries. E os próprios americanos estão dobrando a aposta em seus mercados, particularmente em ações. Teve muito investidor do varejo comprando na baixa em março, em abril, em junho.
Os emergentes estão ansiosos para receber investimentos que hoje estão nos Estados Unidos. Você vê chances desse fluxo ocorrer no curto prazo? As tarifas podem ajudar nisso, de alguma forma?
Acho que é sim, possível, vermos mais e mais competição internacional com os Estados Unidos. Há uma série de catalisadores para isso e acho que as tarifas podem ser um deles. A narrativa de quem pode ser impactado por tarifas pode mudar, o tempo todo. Não sabemos onde vamos parar com isso, vejo como um algo em movimento.
Mas não são apenas os Estados Unidos que tem sido resiliente às tarifas. No começo do ano, todo mundo dizia que os mercados internacionais seriam esmagados em um ambiente de tarifas. Isso não só não aconteceu, como o dólar ficou mais fraco e o retorno desses mercados também ficaram mais fortes.
Ou seja: não esperávamos um dólar mais fraco e vimos um dólar mais fraco. Não esperávamos o mercado internacional indo tão bem, e vimos algumas das melhores performances em uma década.
E qual sua visão sobre o Brasil?
O caminho para juros estáveis e potencialmente mais baixos é um bom catalisador. Certamente há benefícios na apreciação da moeda local. Mas acho que precisamos ser cuidadosos com a situação fiscal e a situação política. Mas as tarifas, até poucas semanas atrás, não foram algo que machucaram o mercado brasileiro.