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Redação Exame
Publicado em 5 de outubro de 2025 às 11h00.
A promessa da Web3, também conhecida como a nova fase da internet, vai muito além da especulação em criptomoedas: ela sinaliza a possibilidade de um novo arcabouço financeiro, construído sobre redes distribuídas capazes de oferecer eficiência, rastreabilidade e integração global. No entanto, esse movimento ocorre em paralelo a uma crescente preocupação regulatória.
Autoridades monetárias e órgãos de supervisão, no Brasil e no mundo, pressionam para que a digitalização de ativos não abra brechas para crimes financeiros, falhas de governança ou riscos sistêmicos. Surge, assim, uma encruzilhada crítica: como garantir privacidade em transações digitais, princípio essencial para proteger instituições e clientes, sem comprometer os requisitos de compliance que sustentam a confiança no sistema financeiro?
O Banco Central do Brasil, a CVM e entidades internacionais como o BIS e a IOSCO estão cada vez mais atentos à intersecção entre inovação e risco. O ponto central é claro: a digitalização não pode significar perda de capacidade de supervisão. Nesse contexto, iniciativas como o Drex mostram que a regulação não pretende impedir a inovação, mas moldá-la.
O desafio, entretanto, é equilibrar dois pólos que parecem contraditórios: a necessidade de transparência para auditorias e investigações, e a demanda por confidencialidade das instituições que competem em um mercado globalizado.
O blockchain nasceu com um ideal de transparência radical: qualquer participante de uma rede pública pode auditar todas as transações já realizadas. Esse modelo trouxe confiança e legitimidade ao ecossistema cripto. Contudo, quando migramos esse mesmo paradigma para ambientes regulados e de alta competitividade, como os mercados financeiros tradicionais, ele se torna um problema.
Um banco que tokeniza CCBs ou títulos de dívida não pode permitir que concorrentes ou terceiros visualizem informações sensíveis de seus clientes, taxas praticadas ou estratégias de liquidez. A “transparência total”, nesse caso, deixa de ser virtude e passa a ser risco.
O dilema não é exclusivo do Brasil. A União Europeia avançou com o regulamento MiCA (Markets in Crypto-Assets), estabelecendo parâmetros de atuação para emissores de stablecoins e prestadores de serviços digitais, mas ainda enfrenta o desafio de harmonizar privacidade com rastreabilidade. Nos Estados Unidos, a ausência de uma regulação federal uniforme cria um ambiente fragmentado: empresas buscam se autorregular, mas convivem com insegurança jurídica permanente.
Em contrapartida, jurisdições como Singapura e Japão caminham em direção a modelos híbridos, nos quais a inovação é estimulada, mas mecanismos de auditoria digital são obrigatórios desde o início. Essas experiências reforçam uma mensagem central: o caminho da Web3 regulada não será de liberalidade absoluta nem de vigilância total, mas sim de construção de mecanismos intermediários de confiança.
Se o dilema é inevitável, a solução passa pela tecnologia. Alguns caminhos já despontam como promissores:
- Trilhas de auditoria digitais seletivas: permitem que reguladores acessem dados quando necessário, mas não expõem todas as informações publicamente
- Frameworks de privacidade e interoperabilidade: arquiteturas que conciliam confidencialidade de transações com integração entre múltiplos sistemas financeiros
- Compliance embutido (“by design”): soluções que incorporam requisitos regulatórios no próprio código, de forma a reduzir riscos de descumprimento
- Criptografia avançada (ZKPs, MPC): técnicas que viabilizam verificação de conformidade sem revelar dados subjacentes
Essas abordagens indicam que o futuro não está em escolher entre privacidade ou regulação, mas em criar ambientes onde ambas coexistem de forma equilibrada. Para finalizar, a privacidade e regulação são duas forças complementares, e não inimigas, na construção da nova infraestrutura financeira digital.
Instituições que entenderem essa lógica sairão na frente, não apenas por atenderem às exigências legais, mas por conquistarem a confiança de clientes, parceiros e reguladores. Ao mesmo tempo, a evolução da Web3 dependerá da adoção de frameworks que permitam inovações seguras, auditáveis e escaláveis. “Privacidade e regulação não são opostos: são duas faces da mesma moeda no futuro financeiro digital.”
*André Carneiro é CEO da BBChain.
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