Atualmente, o país já é um hub regional de IA, com 33 data centers em operação — número que deve dobrar até 2030 (Jorisvo/iStockphoto)
Redator
Publicado em 21 de outubro de 2025 às 10h13.
Tensões envolvendo pesquisadores, ativistas e autoridades estão fazendo do Chile um exemplo global das diferentes forças em disputa ao redor do boom da inteligência artificial.
Em laboratórios de Santiago, cientistas treinam modelos com dados regionais. Nos arredores da capital, comunidades protestam contra data centers de empresas dos EUA como Google e Amazon. Enquanto isso, técnicos do governo de Gabriel Boric tentam costurar um cenário em que seja possível atrair investimentos estrangeiros sem comprometer recursos naturais nem gerar reações sociais negativas.
Atualmente, o país já é um hub regional de IA, com 33 data centers em operação — número que deve dobrar até 2030. No entanto, muitos chilenos estão apenas começando a entender o impacto dessas instalações.
A expectativa de empregos foi frustrada por enormes estruturas que demandam poucos trabalhadores, mas consomem grandes volumes de água. Protestos já levaram o Google a cancelar planos para um segundo data center em Cerrillos, na periferia de Santiago.
Ao saber que empresas planejavam construir 30 data centers em quatro anos, quase todos próximos à capital, o governo chileno mapeou, em 2024, áreas de menor impacto ambiental e social para redirecionar projetos, priorizando o norte do país, como Antofagasta — região desértica com alta incidência solar.
A estratégia se inspira no modelo da astronomia chilena dos anos 1990, quando o governo do país exigiu que 10% do tempo dos telescópios estrangeiros fosse destinado para cientistas locais. Hoje, segundo o New York Times, o Chile é referência mundial na área.
Com base nisso, o governo quer que empresas que instalarem centros de IA disponibilizem parte da capacidade computacional para universidades e startups chilenas. Entretanto, o plano enfrenta obstáculos: além da resistência popular, há limitações técnicas, como o risco de latência em aplicações sensíveis — especialmente se as instalações forem construídas a mais de mil quilômetros de Santiago, como em Antofagasta.
Apesar dos desafios, empresas como foodtech NotCo mostram o potencial local da nova tecnologia. Avaliada em US$ 1,5 bilhão, a startup usa algoritmos para recriar ingredientes sem insumos proibidos. Em 2018, ela firmou parcerias com o Google para acessar chips especializados para IA.
Assim, o Chile reflete um dilema global: construir modelos com identidade regional e garantir acesso à infraestrutura pode definir se o país será protagonista ou apenas espectador na nova era tecnológica, mas com o risco de que os principais prejudicados sejam justamente os cidadãos que a tecnologia deveria beneficiar.