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Até onde vai o dólar: por que a moeda cai com a expectativa de corte de juros nos EUA

A queda de juros é apenas parte da equação, segundo especialistas ouvidos pela EXAME. Entram na conta também a desvalorização do real nos últimos anos e o tarifaço de Trump

Dólar Benjamin Franklin  (Money Still Life/Getty Images)

Dólar Benjamin Franklin (Money Still Life/Getty Images)

Letícia Furlan
Letícia Furlan

Repórter de Mercados

Publicado em 16 de setembro de 2025 às 16h02.

Última atualização em 16 de setembro de 2025 às 17h25.

Com a proximidade da Super Quarta, o dólar vem experimentando repetidas quedas em relação ao real.

O mercado está ansioso por um carry trade decorrente de um provável corte de juros pelo Federal Reserve, nos Estados Unidos. Trata-se de uma estratégia comum em que investidores tomam empréstimos em países com juros mais baixos e aplicam esses recursos em países com juros mais altos.

Quando os juros nos EUA diminuem, torna-se ainda mais barato tomar dinheiro lá. Com a manutenção ou taxas mais altas em outros países, como o Brasil, que deve manter a taxa a 15% ao ano, essa diferença se torna mais favorável para o investidor estrangeiro.

“Isso leva o [investidor] gringo a injetar mais dólares no Brasil, comprando títulos públicos ou ações brasileiras. O aumento da oferta de dólares na economia brasileira faz com que o preço do dólar caia em relação ao real”, diz Otávio Oliveira da Silva, gerente de tesouraria do Banco Daycoval.

Apesar disso, a máxima do “subiu no boato, caiu no fato” vale para o dólar, até mais do que para o mercado de ações, devido à maior liquidez do mercado cambial. Isso significa que o mercado se adianta, agindo com base nas expectativas: investidores institucionais e traders antecipam a entrada de dólares no Brasil mediante a provável decisão de queda de juros pelo banco central americano.

“Eles já entram vendendo dólar, o que faz com que a moeda caia. É uma 'profecia autorrealizada': se a expectativa é amplamente acreditada, o mercado a faz acontecer”, afirma o especialista do Daycoval.

Dólar em queda: veja os setores da economia que mais se beneficiam (e os que ficam prejudicados)

Mas não se engane: caso os cortes sejam de fato anunciados pelo Fed, isso não significa que o dólar vai cair em queda livre.

“O movimento de queda do dólar tende a diminuir e a moeda deve dar uma estacionada. Pode haver uma pequena queda adicional, mas sem uma nova expectativa futura, o dólar não terá um movimento tão forte depois da decisão, porque essa já foi precificada. A queda que vemos já é uma antecipação da decisão”, explica Oliveira da Silva.

Corte de juros é só parte da equação

Mas, por mais que o alívio monetário faça peso no dólar, para Tânia Gofredo, economista-chefe da GEP Brasil, é impossível não citar a insegurança em relação ao governo de Donald Trump e o tarifaço.

“Os ativos americanos costumam ser considerados com risco zero, mas passaram a ter um risco maior em função da incerteza sobre o futuro das importações americanas”, explica.

Nicola Tingas, economista-chefe da Acrefi, vê o dólar perdendo espaço como moeda reserva global ao longo dos últimos anos. Além do tarifaço, o economista cita também a crescente dívida pública americana, que cria desconfiança e incentiva moedas alternativas.

“Um fator adicional importante, principalmente na política econômica de Trump, é baixar as taxas de juros locais para mitigar o desaquecimento da economia americana, sinalizado recentemente pela perda de tração das condições de emprego e da queda dos indicadores de confiança no desempenho da atividade econômica”, afirma Tingas que vê nessa estrutura a equação perfeita para uma queda do dólar.

Tudo depende da 'temperatura e pressão'

Como toda equação, as condições do ambiente influenciam no resultado. Um ambiente interno poderia causar uma depreciação do real frente à moeda americana, mesmo com um dólar mais enfraquecido.

Para Gofredo, o fundamento da dívida pública brasileira é o que mais pode influenciar o cenário. “Para o ano que vem, isso já oferece um certo risco, já que estaremos em ano de eleições presidenciais. Mas, no momento, tudo parece estar razoavelmente sob controle”, explica.

Já Tingas lembra que a moeda brasileira já sofreu uma forte desvalorização justamente por questões de dívida pública nos últimos anos, o que abre margem para a valorização atual, e que é reforçada pela queda dos juros americanos. "Em termos da busca por opções de alocação de recursos para diversos destinos, o Brasil oferece condições compatíveis com tamanho de seu mercado, risco aceitável e elevado retorno”, opina o economista da Acrefi.

Por fim, Oliveira da Silva acrescenta que o fim do ano é o período em que empresas multinacionais costumam enviar dividendos para seus países de origem. Esse movimento de saída de dólares do país faz naturalmente com que a moeda americana se valorize em relação ao real.

“Trata-se de um movimento natural que sempre ocorre entre novembro, dezembro e um pouco no início do ano, e acontece em todas as economias”, finaliza.

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