Freelancer
Publicado em 29 de julho de 2025 às 09h37.
Em meio aos conflitos comerciais impulsionados pelas tarifas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a Boeing parece ser uma das únicas gigantes industriais do país a sair ganhando. Enquanto a maioria dos setores enfrenta incertezas e possíveis retaliações internacionais, a fabricante de aviões tem acumulado novos pedidos ligados a acordos comerciais firmados pela Casa Branca.
Nos últimos meses, países como Indonésia, Japão, Bahrein, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Catar anunciaram a intenção de comprar centenas de jatos da Boeing. Segundo reportagem do The New York Times, esses anúncios têm servido como vitrine para Trump, que os apresenta como prova de que suas políticas econômicas estão fortalecendo a indústria americana.
“Desde o primeiro mandato, os acordos de Trump quase sempre envolvem esse tipo de compra simbólica”, disse Bruce Hirsh, especialista em comércio da consultoria Capitol Counsel. Segundo ele, os parceiros comerciais já esperam oferecer "itens de grande impacto" nos acertos com a Casa Branca.
As ações da Boeing subiram após cada novo anúncio tarifário. Essa tendência, segundo o jornal, reflete a percepção de que a empresa está ganhando com as decisões da presidência. Entretanto, especialistas em aviação passaram a tratar os contratos com uma certa cautela.
“São os famosos pedidos que parecem grandes, mas ainda estão longe de se tornarem entregas reais”, afirmou Richard Aboulafia, analista da AeroDynamic Advisory. Ele relatou que muitos desses acordos são apenas cartas de intenção, sujeitas a revisão ou cancelamento nos próximos anos.
Já Adam Pilarski, da consultoria Avitas, vê influência direta da presidência nas decisões. “Se o presidente diz: ‘Venha comigo e assine algo que crie empregos nos EUA’, você participa do jogo. É política e relações públicas misturadas com negócios”, afirmou.
Segundo resultados do segundo trimestre de 2025, divulgados nesta terça-feira, 29, a fabricante registrou um aumento na receita de 35%, fechando o período em US$ 22,75 bilhões. Desde o início do ano, as ações da Boeing acumulam uma alta superior a 30%, além de terem finalizado o maior volume de entregas em 18 meses.
Segundo o levantamento dos resultados, a empresa estimou uma redução de 50% no prejuízo em comparação com o mesmo período de 2024. “Mudanças levam tempo, mas estamos começando a ver uma diferença em nosso desempenho em todos os negócios”, disse o CEO Kelly Ortberg em nota aos funcionários.
Além dos resultados financeiros, o CEO reforçou a redução dos custos da companhia, incluindo a demissão de 10% da força de trabalho. Mudanças na liderança da divisão de defesa e a venda da unidade de navegação Jeppesen também marcam o trimestre positivo.
A reportagem ainda lembra que alguns acordos destacados por Trump ainda nem se concretizaram. O caso mais emblemático é o da Indonésia, que teria prometido comprar 50 aviões. No entanto, a estatal Garuda negou que o contrato esteja fechado.
A Boeing também enfrenta atrasos sérios em sua produção. Modelos, como o 737 Max (em novas variantes) e o 777-9, ainda aguardam certificação, enquanto o cronograma foi atrasado ainda mais diante de greves, falhas técnicas e do acidente fatal na Índia, que matou 241 passageiros.
Mesmo com encomendas registradas, companhias aéreas podem renegociar as entregas, reduzir o volume ou adiar pagamentos - uma prática considerada comum no setor, especialmente quando o cenário econômico muda. A Ryanair, por exemplo, havia sinalizado que pode postergar compras caso a Europa decidisse retaliar as tarifas americanas.
Especialistas afirmaram ao jornal que os mesmos acordos que hoje favorecem a Boeing, podem se voltar contra ela. Tarifas impostas pelo republicado sobre aliados e rivais geram tensões que ameaçam a cadeia de fornecedores da fabricante.
Além disso, autoridades europeias também consideram incentivar acordos com a Airbus como resposta à política comercial dos EUA, o que poderia neutralizar o avanço da rival americana em outros mercados.
“Se os países forem pressionados a comprar da Boeing como parte de acordos com os EUA, é natural que a Europa reaja buscando fortalecer sua própria indústria”, afirmou Courtney Miller, da Visual Approach Analytics.