Publicado em 22 de junho de 2025 às 11h38.
Última atualização em 22 de junho de 2025 às 13h54.
No sábado, 21, à noite, o presidente Donald Trump confirmou que forças americanas bombardearam os três principais centros de enriquecimento de urânio do Irã: Fordo, Natanz e Isfahan. Em discurso, Trump afirmou que os alvos foram “totalmente obliterados” e advertiu que novos ataques estão na mesa caso o regime iraniano não recue no apoio ao Hezbollah e às ofensivas contra Israel.
Apesar da escalada militar com Israel, até agora o fluxo de petróleo na região não foi interrompido, inclusive os embarques iranianos seguiram normalmente nas últimas semanas.
Mas analistas alertam que isso pode mudar a qualquer momento, especialmente se o Irã cumprir as ameaças de fechar ou interferir no Estreito de Ormuz, por onde passa cerca de 20% da oferta global de petróleo.
“Com o potencial fechamento do Estreito de Hormuz pelo Irã, o preço do petróleo poderia alcançar valores entre US$ 90 e US$ 120 por barril, segundo estimativas do setor bancário”, afirma Igor Lucena, economista e doutor em Relações Internacionais.
Para Tony Volpon, economista e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, caso o estreito seja fechado por um período prolongado, o preço do barril de petróleo poderia ultrapassar US$ 150, o que teria implicações significativas para a inflação global e para a política monetária dos bancos centrais, incluindo o Federal Reserve dos EUA.
Além da elevação no preço do petróleo, a interrupção na navegação também traria custos adicionais. “O aumento dos seguros marítimos seria um dos primeiros reflexos”, diz Lucena. “Com o risco elevado de ataques a petroleiros, os prêmios de seguros para essas embarcações seriam reajustados, impactando todo o mercado global de seguros e resseguros. Este efeito se propagaria rapidamente, afetando os custos operacionais e, consequentemente, o preço final do petróleo”.
Mesmo antes da ação americana, os preços do petróleo Brent já acumulavam alta de 11% desde o ataque israelense de 13 de junho, chegaram a tocar os US$ 79 por barril na quarta-feira passada, 22, antes de perderem força na sexta para o patamar dos US$ 77, com o sinal de Trump de que esperaria até duas semanas para decidir sobre um ataque ao Irã.
Nas últimas semanas, contudo, a volatilidade também tinha aumentado de forma abrupta, com operadores desfazendo posições em contratos futuros em ritmo recorde, segundo a Bloomberg. Desde o início do conflito, cerca de 367 milhões de barris deixaram de ser negociados nas principais bolsas.
Com os riscos geopolíticos se multiplicando, o mercado de fretes também disparou: o custo de envio de petróleo bruto do Oriente Médio à China subiu quase 90%, e os prêmios de seguro aumentaram significativamente. A demanda por petróleo fora da região, como o WTI americano ou blends africanos, vem crescendo.
A questão central para os preços, agora, é o grau e a natureza da retaliação iraniana. Se Teerã atacar instalações americanas ou aliados na região — como já fez no passado — ou tentar impedir a navegação em Ormuz, o cenário de barril a US$ 100 pode rapidamente deixar de ser especulativo.
“Isso pode se transformar num evento de disrupção real se o Irã atacar infraestrutura crítica ou interferir na navegação”, afirma Saul Kavonic, analista da MST Marquee à Bloomberg. “É o tipo de movimento que pode precipitar uma nova escalada global de preços.”
Por outro lado, há fatores que podem conter o impacto nos preços. Em 2019, quando instalações sauditas foram atacadas por drones, a oferta global caiu 7%, mas os preços recuaram poucas semanas depois, com a recomposição rápida da produção e o uso de estoques estratégicos.
“Existe uma linha tênue entre risco percebido e disrupção real. O mercado tende a subir diante da incerteza, mas exige um corte efetivo no fornecimento para sustentar um rali duradouro”, diz John Kilduff, sócio da Again Capital, à agência de notícias.
O envolvimento direto dos EUA também muda o equilíbrio estratégico. A expectativa é de que a Marinha americana intensifique sua presença para garantir a segurança no Estreito de Ormuz. Mas isso também aumenta o risco de novos confrontos com forças iranianas ou grupos aliados, como os Houthis no Iêmen, que já realizaram ataques a navios comerciais em outros momentos.
Para os mercados, a consequência imediata será um aumento do prêmio de risco geopolítico embutido no petróleo, além de pressões sobre o diesel e outros derivados. A médio prazo, o temor é que uma alta prolongada nos combustíveis possa reverter a tendência de queda da inflação e forçar uma revisão nas políticas monetárias em várias economias — inclusive nos EUA.
Em um cenário extremo, se o estreito fosse bloqueado de fato, o impacto econômico seria grande, não só para os países produtores, mas também para potências como os Estados Unidos, que poderiam ver isso como uma ameaça à sua segurança nacional, afirma Lucena.
“O desabastecimento de petróleo seria uma ameaça direta à economia americana, o que poderia gerar uma intervenção militar. No Brasil, embora o impacto seja menor, um aumento temporário no preço do barril poderia gerar receitas extraordinárias para a Petrobras, aumentando os royalties e, em consequência, as receitas do governo”, conta Lucena.
No entanto, esse efeito positivo não deve ser visto como algo sustentável a longo prazo, em caso de uma situação de crise. Segundo Sérgio Araujo, presidente executivo da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), não é previsto um impacto imediato nos preços dos combustíveis no Brasil, mas caso a tensão persista, a tendência é de aumento dos preços no mercado internacional, inclusive no Brasil.
"Poderá haver aumentos nos preços dos derivados de petróleo, principalmente nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, que são menos abastecidas por produtos da Petrobras", afirma.
Apesar do cenário preocupante, Roberto Ardenghy, presidente do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis), afirma que é "muito cedo" para afirmar que haverá um aumento significativo nos preços de diesel, gasolina e GLP no Brasil.
“O que está acontecendo hoje no Oriente Médio, em termos de guerra e problemas de abastecimento, ainda não configura uma tendência de mercado". Ele ressalta que os movimentos de alta observados no mercado podem ser apenas temporários. “Se as tensões na região diminuírem nas próximas semanas, a tendência é o petróleo voltar ao seu patamar normal".
Ardenghy enfatiza a necessidade de distinguir entre uma tendência estrutural do mercado e uma tendência meramente conjuntural, observando que, no momento, o cenário do Oriente Médio se encaixa na segunda categoria.
"É uma situação preocupante, mas não deve realmente afetar os preços dos combustíveis para o consumidor brasileiro ainda no curto prazo", afirmou o presidente do IBP.
Outro fator importante a ser observado é a resposta de outros países que dependem do Estreito de Hormuz para o transporte de petróleo. “A Arábia Saudita, por exemplo, já possui oleodutos que permitem a exportação de parte de sua produção sem passar pelo estreito. No entanto, essa infraestrutura não é capaz de substituir completamente a quantidade de petróleo escoada através do Estreito”, diz Lucena.
Além da Arábia Saudita, outros países como os Emirados Árabes Unidos e a China também são fortemente impactados pela situação no estreito. A China, em particular, é um dos maiores compradores de petróleo do Irã e também depende do estreito para garantir seu fornecimento energético.
“A estabilidade do regime iraniano é essencial para os interesses estratégicos da China na região, especialmente com os investimentos em infraestrutura vinculados à Iniciativa do Cinturão e Rota”, conta Lucena.