O streamer Gaules, fundador da G3X, participou do 6º encontro do Clube CMO, em São Paulo, e falou sobre o potencial dos games como território de marca (Eduardo Frazão)
Editora-assistente de Marketing e Projetos Especiais
Publicado em 3 de setembro de 2025 às 16h24.
Última atualização em 3 de setembro de 2025 às 16h55.
Com 142 milhões de jogadores e 98 milhões de fãs de e-sports, o Brasil já movimenta US$ 2,6 bilhões por ano nesse mercado, segundo dados da PGB Data Insights. Inserido em uma indústria global de US$ 188 bilhões, maior que cinema, televisão e música somados, o universo dos games se tornou um território estratégico para as marcas.
Como transformar essa audiência em conexão real foi o tema do 7º encontro do Clube CMO, realizado nesta terça-feira, 2, na Casa Osten, em São Paulo. A iniciativa da Exame em parceria com a agência Zmes reuniu executivos de marketing de empresas como Stellantis, Puma, Cruzeiro do Sul, Magazine Luiza, Barilla e Diageo, além de convidados como o streamer Alexandre Borba, o Gaules, fundador da G3X, e André Britto, CMO da Bauducco.
Ao abrir o debate, Gaules contou como sua relação com os jogos começou em 1999, quando uma lesão interrompeu sua tentativa de carreira no futebol. “Enquanto estava engessado, conheci o jogo Counter-Strike e percebi que podia continuar competindo no ambiente digital”, disse.
Nos anos seguintes, passou a disputar torneios internacionais, fundou uma agência de transmissão e organização de campeonatos e, em 2018, iniciou suas próprias lives. “Hoje qualquer pessoa com um computador, uma câmera e internet pode criar a sua própria emissora de TV”, afirmou. Seu canal soma mais de 720 milhões de horas assistidas, com audiência formada principalmente por jovens entre 18 e 35 anos.
“No Brasil, milhões de pessoas acompanham e-sports e mais de 140 milhões jogam algum tipo de game. Quando a marca entende esse alcance, percebe que não é um nicho”, disse Gaules
A Bauducco tem usado o universo dos games como porta de entrada para dialogar com o público jovem. Segundo Britto, 73,9% da população brasileira joga algum tipo de game e, dentro desse grupo, 80% apontam o jogo como principal forma de entretenimento. “Se eu quero penetrar entre os jovens, preciso estar onde a atenção está”, afirmou.
A estratégia da empresa tem sido atuar em torno do momento de consumo, em vez de se inserir diretamente dentro dos jogos. Em 2021, a marca identificou a popularização da palavra “biscoiteiro” nas redes sociais e passou a investir em ativações em eventos como o Brasil Game Show, onde patrocinou o palco de cosplay. Em 2024, ampliou a presença em experiências contínuas e no patrocínio de equipes de e-sports.
Esse movimento também levou ao lançamento de produtos alinhados ao comportamento desse público, como o BigCookie, criado para consumo rápido e prático. “O snack mais consumido durante os jogos é o biscoito. Criamos embalagens que facilitam a experiência, mas que também servem para qualquer consumidor que busca conveniência”, explicou Britto.
O crescimento do universo dos games levou Gaulesa estruturar sua operação como negócio. “No começo, cada streamer respondia e-mail, negociava contrato e fazia a ação. Entendi que dava para transformar em empresa”, relatou.
Em sociedade com o grupo Omelete, criou uma estrutura com áreas de marketing, produto e comercial. Hoje, a operação é tratada como uma empresa de mídia e entretenimento. “Prefiro quando a marca chega com o desejo e cocriamos o formato. Assim, garantimos que faça sentido para o anunciante e para a comunidade”, afirmou.
O modelo consolidou o canal como referência global. Segundo Gaules, apenas sete canais de streaming no mundo atingem o patamar de horas assistidas do seu. “Nos tornamos o canal mais assistido do mundo em transmissões de e-sports e mantemos esse posto ano após ano”, disse.
André Britto, CMO da Bauducco, destacou no Clube CMO como a marca tem usado o universo dos games para se aproximar do público jovem (Eduardo Frazão)
Um dos principais movimentos recentes da Bauducco foi a promoção do cookie dourado, em parceria com a PlayStation e anunciada por Gaules na Gamescom. A mecânica reproduzia a lógica de uma caça ao tesouro: ao abrir o produto, consumidores poderiam encontrar cookies premiados.
“Poderíamos ter feito o formato clássico de mandar o código fiscal, mas escolhemos criar uma narrativa de busca, que conecta mais com o público”, explicou Britto. O resultado foi rápido. Em 48 horas, havia mais de 100 vídeos orgânicos no TikTok sobre a campanha, que, segundo ele, alcançaram 75 milhões de visualizações.
"Em dois meses, as vendas cresceram 30% e o market share subiu de 42% para 48%.“O mais importante foi que a venda continuou depois da promoção, mostrando que deixamos uma semente”, disse. A participação de jovens foi o dobro da média das ações anteriores.
O executivo destacou ainda o impacto humano da ação. O primeiro ganhador foi um menino que encontrou o cookie dourado na escola. “Ele abriu a embalagem diante dos colegas e depois participou de uma live com o Gaules. Esse tipo de história mostra a força da gamificação aplicada ao consumo físico”, contou.
Para Britto, o principal indicador não está em vendas imediatas, mas na evolução da percepção da marca. “Desde que entramos nesse território, aumentamos em 40% o desejo da marca no público de 18 a 24 anos e em 11% no público de 25 a 34. E mantivemos estável entre os mais velhos, sem erosão da base”, disse.
Outro resultado foi a melhora no ranking das marcas mais amadas do Brasil. “No ano passado estávamos na posição 21. Hoje somos a 7ª marca mais amada e a 1ª em alimentos. Isso mostra que conseguimos mover uma marca de 65 anos para estar lado a lado com players como Netflix e Instagram”, afirmou. Segundo ele, esse processo exigiu paciência e consistência.
“A construção de marca não acontece de um dia para o outro. Marketing extrai valor, branding agrega valor. É preciso equilibrar os dois", disse Britto
Gaules destacou erros comuns de empresas que tentam entrar nesse mercado. “Muitas vezes a marca quer testar e faz uma ação pontual. Isso não cria vínculo. O público acompanha hábitos no dia a dia e valoriza quem está de forma recorrente”, afirmou. Ele também alertou contra o equívoco de restringir produtos para gamers a categorias de tecnologia.
“O gamer consome qualquer coisa. Água é para gamer, biscoito é para gamer. A questão é falar com pessoas, não com estereótipos.”
Além do universo gamer, Gaules se consolidou transmitindo esportes tradicionais em linguagem digital. “Fui o primeiro streamer do mundo a transmitir a NBA. Também transmitimos Fórmula 1 e campeonatos de futebol. O diferencial é que não basta narrar: é preciso estar conectado a uma comunidade”, afirmou.
Ele destacou que formatos do gaming passaram a influenciar transmissões convencionais. “Antes queriam que narradores usassem terno, como na TV. Hoje é o contrário: o esporte tradicional adota elementos do game para falar com os jovens.”
Um exemplo dessa convergência é a Kings League, torneio criado por Gerard Piqué com participação de Neymar. Gaules levou o time G3X FC para a competição, que reúne jogadores profissionais e membros da comunidade. “É quase um reality show, porque qualquer pessoa pode se inscrever e jogar. No Mundial no México, chegamos à final com mais de 400 mil pessoas assistindo simultaneamente”, disse.
Segundo ele, esse modelo combina competição, interação e transmissão em formato que atrai o público jovem. “É futebol, mas com a lógica de comunidade dos games. Isso amplia ainda mais as possibilidades para marcas.”
Segundo dados da Newzoo e da Kantar IBOPE Media, o mercado de games já se consolidou como mainstream no Brasil, com 142 milhões de jogadores, cerca de 74% da população, e 98 milhões de pessoas que acompanham ou assistem conteúdos de e-sports.
No panorama global, de acordo com a Newzoo e o estudo PGB 2024, o setor movimenta US$ 188 bilhões por ano, superando televisão, cinema e música somados. São 3,3 bilhões de jogadores em todo o mundo, ou 40% da população.
O Brasil ocupa a 10ª posição em receita, com US$ 2,6 bilhões, e 85% dos brasileiros com mais de 16 anos afirmam considerar os games como uma de suas principais formas de entretenimento.
A transmissão também é relevante. Dados da Newzoo, Statista e Streamlab, respectivamente, apontam receitas globais de US$ 1,8 bilhão e uma audiência de 532 milhões de pessoas. No Brasil, o setor gera US$ 223 milhões, com público de 25 milhões de pessoas, o terceiro maior do mundo. No consumo de conteúdo, gamers em todo o planeta assistem a mais de 8 bilhões de horas mensais em plataformas como YouTube Gaming e Twitch.
O Clube CMO é destinado a líderes de marketing das organizações. Sendo assim, podem participar CMOs, vice-presidentes e diretores que sejam insight-first, pessoas curiosas que buscam troca de conhecimento sobre o mercado publicitário. Os novos associados são selecionados pela diretoria da EXAME e da Zmes, além de um comitê executivo convidado.
Os associados participam de jantares de relacionamento, encontros de learning com especialistas nos temas abordados. Os membros têm participação ativa no conteúdo da EXAME, por meio de podcast, matérias de cobertura dos eventos e coluna do Clube CMO. A iniciativa tem patrocínio da HYPR, Spark, Uncover e Resenha Digital Clube, além de contar com apoio da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA).