Trident reforça presença na Kings League com ativações voltadas à geração Z (Divulgação)
Redação Exame
Publicado em 16 de novembro de 2025 às 20h31.
Última atualização em 16 de novembro de 2025 às 20h42.
A Kings League encerrou na última sexta-feira, 14, sua segunda temporada no Brasil com o título da Furia, equipe presidida por Neymar Jr. e Cris Guedes, após vitória diante do G3X por 3 a 1 nos shootouts. A decisão ocorreu na Trident Arena, em São Paulo, e marcou o fim de uma edição que expôs como o torneio vem sendo usado por marcas para testar formatos e estratégias voltadas à geração Z.
Lançada na Espanha em 2022 pelo ex-jogador do Barcelona Gerard Piqué, a liga nasceu como uma alternativa ao futebol tradicional, operando desde o início com uma lógica híbrida de esporte e entretenimento. Em três anos, tornou-se produto global e expandiu para sete países na temporada 2025-26, incluindo Brasil, Alemanha, Itália, países do Oriente Médio, México e Espanha.
Entre os presidentes de times e embaixadores estão atletas, ex-atletas e influenciadores como Ronaldo Fenômeno, Marcelo, Robert Lewandowski, Wesley Sneijder, Lamine Yamal, Fabrizio Romano, Whindersson Nunes, Marina Rivers, Aboflah e Plex. A combinação entre futebol, personalidades digitais e narrativa gamificada tem ampliado o apelo da liga entre um público que consome conteúdo de forma fragmentada e busca experiências rápidas e interativas.
Segundo levantamento da Deloitte, 85% dos espectadores globais têm menos de 34 anos. O dado é relevante para marcas que buscam presença entre jovens, mas enfrentam limites nos formatos tradicionais do esporte, cuja audiência envelheceu. Para especialistas ouvidos pela reportagem, a Kings League se tornou um laboratório de novas dinâmicas — e de riscos — para quem tenta acessar essa geração.
A liga opera sob princípios do sportainment, tendência que combina esporte, entretenimento e o dinamismo de redes sociais. São partidas mais curtas, regras mutáveis, estímulos visuais e narrativos constantes, uso intensivo de influenciadores e abertura total para transmissões digitais.
Os jogos têm 40 minutos divididos em dois tempos de 20, com impacto direto na retenção da audiência. O uso de cartas secretas, “gol dobrado”, “gol de ouro” e intervenções como o “dado gigante” aproximam a lógica do jogo da lógica de streaming e de games.
Para Ivan Martinho, professor de marketing esportivo da ESPM, o modelo reflete uma mudança estrutural. “Formatos que misturam esporte e entretenimento com atletas, ex-atletas e criadores têm mostrado audiência e engajamento. O movimento visto no boxe chega ao futebol atraindo os mais jovens com um formato curto e pensado para entreter o fã.”
Essa estratégia também altera a relação com o torcedor. Não há a ideia tradicional de “clube” como entidade histórica. Há times presididos por criadores de conteúdo, muitos deles referência para adolescentes e jovens adultos. A lógica de pertencimento, portanto, é construída sobre afinidade com personalidades e comunidades digitais — não sobre títulos, história ou tradição.
Thiago Freitas, COO da Roc Nation Sports no Brasil, observa que isso cria novas possibilidades. “Os perfis de torcedor e espectador mudaram ao longo do tempo, o que abre oportunidades para experiências diversificadas antes e depois dos jogos. As possibilidades são muitas”, diz.
As transmissões aceleraram o crescimento da liga no Brasil. Os jogos são exibidos pela Cazé TV, que alcançou picos de quase 800 mil espectadores simultâneos. Em janeiro, a final da Kings World Cup Nations registrou mais de 3,5 milhões de aparelhos conectados, sendo 1,2 milhão no Brasil. É audiência distribuída entre plataformas, acompanhada por reações em tempo real e produção contínua de cortes, memes, lives e vídeos verticais.
“Em um cenário onde o engajamento digital se tornou tão valioso quanto a audiência televisiva, a Kings League Brasil se posiciona como um case de marketing esportivo. A transmissão via Twitch e YouTube representa uma mudança de paradigma na forma de consumir esporte”, afirma Renê Salviano, CEO da Heatmap.
Além disso, a liga mobiliza redes sociais com mais de 15 milhões de seguidores e 890 milhões de horas de conteúdo assistidas. No TikTok, ultrapassou 85 milhões de visualizações. A dinâmica privilegia conteúdos curtos, repetidos e altamente compartilháveis, condição ideal para marcas que buscam ganho de escala no digital.
De acordo com especialistas, a maior oportunidade para marcas é também o principal ponto de atenção. A geração Z tem lealdade baixa a formatos fixos e cultiva vínculos mais fluidos. A liga entende esse comportamento e, por isso, se estrutura como um produto em constante mutação: regras, quadros e dinâmicas mudam para manter o público em alerta.
“A Kings League pode conectar marcas com a geração Z, um público de difícil acesso para formatos tradicionais do esporte. Empresas de games, fast-food, tecnologia e streaming são as que mais se beneficiam ao comprar acesso ao entretenimento digital, não apenas ao jogo", diz Thales Rangel Mafia, gerente de marketing da Multimarcas Consórcios.
Ele explica que o desafio, contudo, está na fidelização. "A atenção é voltada ao espetáculo e às personalidades, não aos clubes. Se o formato perder força ou as celebridades mudarem de foco, o engajamento se desloca. É uma audiência guiada por tendência, não por tradição. A Kings é meio, não fim.”
Para marcas, isso exige planejamento mais curto e ativação mais rápida. Não basta comprar placas de publicidade ou cotas tradicionais, é preciso participar da conversa cultural enquanto ela acontece, criando pontos de contato que façam sentido naquele ambiente digital.
O formato da liga abre espaço para marcas que buscam inserções alinhadas à cultura digital. No Brasil, participam empresas como iFood, Bis, Trident, Sadia, Adidas, Superbet, YoPRO e Mondelez, entre outras. Na Kings World Cup of Nations, entram nomes como McDonald’s, Red Bull, Spotify, Air Asia, Iren, Città di Torino e Floki.
Alexandre Vasconcellos, gerente regional da Flashscore, destaca que o movimento já provoca ajustes no mercado. “Quando algo novo desafia o status quo e atrai marcas que não participavam do esporte, o setor precisa prestar atenção. Ignorar esse processo é perder a chance de aprender sobre formatos de conteúdo e sobre o comportamento do fã.”
Mesmo no ambiente presencial, a lógica do digital prevalece. A final da primeira temporada no Allianz Parque reuniu 40 mil pessoas, traduzindo um fenômeno que nasceu online e encontrou demanda no offline. A segunda temporada seguiu a mesma trajetória: ingressos vendidos rapidamente e forte presença de criadores de conteúdo nas arquibancadas.
Bruno Brum, CMO da End to End, avalia que o impacto vai além do espetáculo esportivo. “A Kings League transforma torcedores em fãs engajados e marcas em protagonistas do evento. É um exemplo de como entretenimento esportivo pode ser reinventado com inteligência de marketing e conexão com o público.”
A liga opera como uma plataforma de experiências amplificada pelas redes sociais. Cada momento, o lançamento do dado, a ativação do gol dobrado, o anúncio das cartas, vira conteúdo replicável. Para marcas, isso significa estar presente não em um ponto, mas em uma narrativa inteira.
Com o título da Furia, o time aguarda o campeão da etapa mexicana para disputar a Kings Cup America. A liga mantém seu plano de crescimento internacional, enquanto times, patrocinadores e influenciadores ampliam presença em um ambiente que combina futebol, conteúdo, comunidade e entretenimento.
Em 2024, a organização captou US$ 65 milhões para sustentar sua expansão, que prevê novas ligas na Europa, América do Norte e Brasil. A entrada na Ásia está prevista para 2026.