Uma pessoa participa de um protesto contra o ex-presidente Álvaro Uribe nesta sexta-feira, em frente ao Complexo Judicial de Paloquemao, em Bogotá (Colômbia) (Mauricio Duenas/EFE)
Agência de Notícias
Publicado em 2 de agosto de 2025 às 18h10.
Bogotá, 2 ago (EFE).– A condenação em primeira instância a 12 anos de prisão em regime domiciliar imposta ao ex-presidente Álvaro Uribe aprofunda a divisão na Colômbia e desencadeia uma tempestade de tensões entre seus seguidores, que denunciam perseguição política, e seus detratores, que consideram a sentença um marco na luta contra a impunidade.
O chamado ‘julgamento do século’ ampliou a polarização entre esquerda e direita, que neste sábado discutem nas redes sociais se a pena imposta é justa, se a juíza Sandra Heredia agiu conforme o direito, se Uribe merece continuar em liberdade até que a sentença se torne definitiva ou se a condenação teve motivações políticas, numa polêmica que parece não ter fim.
Ao debate, que ultrapassou as fronteiras nacionais com manifestações contrárias à sentença por parte de congressistas republicanos dos Estados Unidos, somou-se o ex-presidente Iván Duque (2018–2022), que propôs uma ação legal apoiada por milhões de pessoas para que Uribe (2002–2010) possa permanecer em liberdade enquanto seu caso é encerrado.
“A presunção de inocência, a disposição em comparecer a todos os chamados da justiça, o rigor de sua defesa e a demonstração da cadeia de irregularidades processuais, somados ao pedido de exoneração do Ministério Público e seu recurso à sentença, assim como a ausência de uma única prova que valide uma condição de determinador, são suficientes para que Álvaro Uribe continue se defendendo em liberdade e demonstrando sua inocência”, declarou Duque.
Uribe, de 73 anos e fundador do partido de direita Centro Democrático, pelo qual Duque foi eleito senador e presidente, foi sentenciado ontem a doze anos de prisão, a uma multa superior a 3.400 milhões de pesos colombianos (cerca de 822 mil dólares) e à inabilitação por mais de oito anos para o exercício de funções públicas pelos crimes de fraude processual e suborno em atuação penal.
Enquanto isso, o senador de esquerda Iván Cepeda, reconhecido como vítima no julgamento, denunciou na noite de sexta-feira uma “feroz perseguição” do ex-presidente contra a Justiça.
Segundo Cepeda, o ex-presidente, que já foi vinculado a vários processos por supostos vínculos com grupos paramilitares durante o conflito armado, iniciou uma perseguição “contra o poder judiciário sempre que um juiz, um promotor, um magistrado, um advogado ou uma vítima ousa pedir que suas numerosas condutas criminosas sejam esclarecidas”.
Cepeda denunciou ainda neste sábado “o infame lobby” que, segundo ele, “os enviados” de Uribe estão fazendo nos EUA e que busca “não apenas enfraquecer o Poder Judiciário, mas gerar sanções para todos os colombianos caso não consigam recuperar sua impunidade”, algo semelhante ao que ocorreu com o processo por golpismo contra o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro.
Na discussão também interveio um grupo de 38 juristas que, em comunicado divulgado hoje, expressaram sua “profunda preocupação e perplexidade” diante da decisão de ontem de Heredia que “ordena a privação imediata da liberdade pessoal” de Uribe, “sem que a sentença esteja transitada em julgado, contrariando assim os padrões de direitos humanos estabelecidos nos tratados internacionais e na Constituição”.
“Lamentamos essa medida, que contraria os princípios fundamentais do devido processo e coloca em grave risco a legitimidade do exercício do Poder Judiciário, dever sagrado de cada juiz, e, de quebra, a majestade da Justiça”, afirmaram.
Por isso, a defensora do Povo, Iris Marín, fez neste sábado um apelo ao respeito pela independência judicial e à não estigmatização da juíza Heredia.
“Estigmatizar quem cumpre com seu dever constitucional de administrar justiça enfraquece a independência judicial e sua legitimidade institucional. As decisões judiciais podem ser debatidas, mas pela via do Estado de Direito, que é a dos meios jurídicos estabelecidos”, advertiu Marín.
Segundo a funcionária, o caso de Uribe “não é um debate político nem eleitoral” e, portanto, “não é admissível, numa democracia, atacar ou deslegitimar quem profere as decisões nem insinuar sua parcialidade”.
“A Justiça se honra com respeito às formas do processo e às autoridades”, disse a defensora do Povo, que convidou “as partes processuais, os líderes políticos e a opinião pública a confiar na Justiça, a respeitar e não estigmatizar uma juíza que fez seu trabalho com retidão e transparência”.
O presidente colombiano, Gustavo Petro, muito ativo nas redes sociais, comentou ontem brevemente a condenação de Uribe e hoje publicou no X um texto repleto de referências a cavaleiros andantes caídos e no qual, sem mencionar diretamente o ex-presidente, afirma que em seu romance, “García Márquez nos ensinou sobre os outonos do patriarca”. EFE